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Lenora de Barros: Síntese de uma produção plural

Lenora de Barros FOGO NO OLHO, exposta na Pinacoteca
Lenora de Barros "Fogo no Olho", 1994. Foto: Ciro Coelho

Corpo e experimentalismo são marcos existenciais na produção dos artistas que performam. Os 40 trabalhos que constituem a exposição Minha língua: Lenora de Barros, na Pinacoteca do Estado de São Paulo, enfatizam a combinação múltipla de linguagens ativadas pela artista ao longo de quatro décadas. De forma espiralada, cognitiva, o conjunto revela as afinidades da produção da artista desde os anos de 1970 até a videoperformance A Cara. A Língua. O Ventre. (2022), nascida durante o processo da mostra, curada por Pollyanna Quintella e comissionada pela Pinacoteca. Como raros artistas, Lenora retira a argila de seu destino utilitário e decorativo e a coloca no centro de um discurso experimental, conceitual, fazendo uma leitura da matéria onde ancora as imagens. A Cara. A Língua. O Ventre. decanta e desvia a sensualidade em várias direções. As três partes que compõem a obra são estratégias para ela experimentar movimentos sensuais da argila no seu corpo. 

Instalada no centro de grande sala, a obra instiga e envolve o espectador, mas permite que ele faça a própria “viagem”. O movimento lento das mãos amassando a argila, na tentativa de “esculpir” uma enorme língua, é sensual. A ideia é que o espectador alcance outra visibilidade, privilegiando fenômenos invisíveis aos olhos e “veja” o objeto saindo de sua boca. Para atingir o ilusionismo, Lenora conta com olhares de parceiros que acompanham a filmagem. Como ela comenta, “executar isso é bem diferente do que fazer uma performance ao vivo”. Há tempos a artista investiga a relação com a língua e com a palavra língua, ao mesmo tempo ideia de idioma, de órgão e de linguagem. Essa definição foi reiterada por ela na Flip deste ano, na mesa O Corpo da Imagem. O pioneirismo da abordagem conceitual da palavra e do corpo nas artes visuais, pela importância simbólica dos elementos escolhidos, transforma alguns de seus trabalhos em contraescrita imagética.

O abdômen também mantém a sensualidade na videoperformance e parte de uma definição do poeta concretista Décio Pignatari. “A mulher tem o relógio da história no umbigo”. Lenora comenta a proximidade do conceito com a obra Por Si, em que uma bolinha de pingue-pongue desliza na mesma área do abdômen. A cara de espanto, um dos fios condutores da obra de Lenora, aparece discreta na videoperformance. 

Os trabalhos gravitam em torno da obra central e mantêm conexões conceituais como a série Não Quero Nem Ver (2005), formada por quatro vídeos projetados em pequenos monitores: Tato do olho, Ela não quer ver, Já vi tudo, Há mulheres. Em Já vi tudo, Lenora é filmada encapuçada por malha tricotada, fechada sobre sua cabeça. Nesse trabalho ela optou por usar o tricô, “uma atividade estigmatizada, por ser uma feminina, eu mesma já fiz tricô”. Mesmo escondida sob um capuz, ela atua numa experiência que se move numa dupla essência: visual e verbal. Os mesmos dedos, anelar e indicador, que perfuram a argila na videoperformance, em Já vi tudo tentam criar orifício na malha de lã tricotada. A sonorização ecoa a linguagem poética sussurrada que chega a murmúrios. Já no vídeo Há mulheres, nascido de texto publicado de 1993 a 1996, na coluna Umas, assinada por Lenora no Jornal da Tarde, a filiação com a videoperformance se dá mais pela experiência estética. O poema Há mulheres é recitado em voz baixa, no mesmo ritmo cadenciado dos demais trabalhos desta série, em que seus jogos de linguagem estão sempre presentes.

A consciência do corpo como percepção poética chega mais forte para Lenora quando participa da exposição Mulheres radicais (2016), na Pinacoteca, com curadoria de Andrea Giunta e Cecilia Fajardo-Hill. A coletiva reunia cerca de 100 artistas com obras produzidas entre 1975 e 1985. “Todas se manifestavam a partir do corpo, corpo suporte de expressão, corpo ideal a partir do corpo”, como define a artista, que se identificou fortemente com elas.

A ludicidade envolve a série A Máscara de Mão (2017), composta por objetos nascidos quando ela frequenta, por acaso, um estúdio nos Estados Unidos. “Eu não tinha a menor intenção de trabalhar com argila, porque até aquele momento eu pensei, não tenho nada a ver com isso”. No entanto, um dia, ao pegar um bloco de barro, foi trabalhando pelo avesso, por trás. Chega aos movimentos de criar orifícios que foram repetidos e fizeram surgir A Máscara de Mão, para ser calçada como luvas, supostamente individual, mas que, ao se sociabilizar performaticamente, ganha chancela libertadora. Com esse trabalho Lenora reafirma a máxima de que qualquer objeto pode falar uma língua secreta.

O conceito que compõe o inventário de Lenora, ora real ora imaginário, traz um repertório de indagações que perpassam de uma obra a outra e coloca o olhar atento em outros registros cognitivos. A artista altera a percepção da arte com questionamentos que se comunicam por meio da centralização do corpo e do eu. A série Procuro-me (2003) surgiu naturalmente quando ela passava diante de um quiosque instalado em frente a um cabelereiro, no Shopping Iguatemi, onde as pessoas podiam ser fotografadas com cabeleiras. “Eu achei aquela situação insólita, engraçada, curiosa e resolvi fazer”. A fotoperformance foi publicada no caderno Mais!, da Folha de S.Paulo, e evoluiu para outros desdobramentos. 

Quando acontece o ataque às Torres Gêmeas, ela assiste pela TV pessoas desesperadas procurando umas às outras. Com isso, inventa diferentes autorretratos que lembram cartazes de pessoas desaparecidas, colados em lugares públicos. As fotos são diferentes entre si e não revelam a verdadeira Lenora. Essas imagens incomodam. Em 2002, alguns cartazes de Procuro-me, colocados na fachada do Centro Universitário Maria Antônia, foram vandalizados pelo grupo Art-Attack, que confessou o estrago. Agora, essa obra assume um protagonismo positivo no processo de implantação da nova montagem do acervo da Pinacoteca. Procuro-me, entre outros trabalhos, está exposta permanentemente em alguns locais do museu. 

Para além da expressividade e do desafio de interpretar a obra de Lenora de Barros, que em cada mostra provoca novas interpretações de acordo com a situação temporal, a exposição se abre para reflexões atualizadas sobre um novo começar. 

SERVIÇO

Lenora de Barros: minha língua
Edifício Pinacoteca Luz: Praça da Luz, 2, São Paulo, SP, 2º andar
8 de outubro de 2022 a 9 de abril de 2023
Visitação: quarta a segunda, das 10h às 18h.
Ingressos: R$ 20,00 (inteira), R$ 10,00 (meia-entrada), gratuitos aos sábados

“Tragédia!” desafia artistas a criarem nexos entre um terremoto, a Semana de 22 e as eleições no País

Mateus Moreira
Mateus Moreira, "Frenesi" (2022). Foto: Eduardo Ortega/Cortesia Fortes D'Aloia & Gabriel

A ideia de destruição, escombros, perdas e assombro atravessa as mais de 30 obras exibidas na exposição Tragédia!, em cartaz até 15 de outubro, no Galpão da Fortes D’Aloia & Gabriel, em São Paulo. Convidado no ano passado para conceber uma mostra que se referisse aos 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922, Raphael Fonseca preferiu não fazer uma montagem diretamente conectada ao evento, buscava algo mais sutil e com apelo histórico, elemento caro às suas investigações curatoriais.

Em suas pesquisas sobre fatos ocorridos naquele ano, Fonseca encontrou a menção a um terremoto na cidade de Mogi Guaçu, interior de São Paulo, que aconteceu apenas duas semanas antes do célebre encontro modernista no Theatro Municipal paulistano. O abalo sísmico lhe serviu como “ponto de partida ficcional”, como ele diz, para estabelecer nexos entre a Semana de 1922, o bicentenário da Independência, comemorado em setembro, e as eleições brasileiras, com aquilo que há de trágico e de ruptura nesses três momentos.

“Fiquei conectando os pontos e pensando nessas narrativas. Já tinha em mente, de modo mais claro, que precisaria ter, no projeto, artistas que lidam, em certa medida, com um certo fantasma, uma noção de tragédia. Mas, não me interessava fazer uma exposição literal”, diz o curador. “Então, eu não queria apenas ter obras que ilustrassem a ideia de trágico, mas que a ecoassem, por meio dos materiais, das cores etc.”

Fonseca aponta que, ao fim, muitas das obras dos 13 artistas elencados para a exposição são feitas com “restos de coisas” e, “querendo ou não, elas têm algo de escombros”. A maior parte desses artistas apresenta trabalhos feitos especialmente para a mostra, à exceção de Ivens Machado (1942-2015) e Sonia Andrade, cujo vídeo Sem Título (1977) está em exibição. Segundo ele, a seleção foi um processo “muito orgânico” e, de imediato, alguns nomes lhe vieram à cabeça, como Gilson Plano e a Mayana Redin. Também a ideia de destruição e de restos surge ao se contemplar as obras.

“Muitos desses trabalhos usam materiais encontrados no lixo, em escombros, coisas baratas que você comprar ou mesmo pegar na rua. O Anderson Borba, por exemplo, usou madeiras que vieram do incêndio do Museu da Língua Portuguesa. E tem ainda a Mayana com as grades de ferro, as roldanas de Gabriela Mureb, o cobre e o tijolo na criação da Carla Chain, ou o couro e as pedras do Gilson”, exemplifica, ponderando: “Não é uma exposição de reciclagem, mas os materiais se ligam a certa noção de descarte. O que acaba contribuindo com o campo semântico do terremoto”.

Havia, no entanto, um desafio para Tragédia! na primeira sala do Galpão: exibir os trabalhos de modo que eles não passassem despercebidos diante da arquitetura grandiosa do lugar. Para tanto, Fonseca convidou Renato Pera para criar um papel de parede na primeira e maior sala, sobre o qual alguns dos trabalhos foram dispostos. A ideia, a propósito, vem de uma busca, por parte do curador, de fugir da costumeira disposição sequencial de obras.

“O resultado é um jogo bem cenográfico. Em certa medida, não parece nada do que fiz antes, e revela um interesse que vem crescendo em mim de fazer algo meio espetacular. De pensar a exposição como algo realmente próximo de um pensamento espacial, de um espetáculo, num cenário, e não de um cubo branco ou do interior de uma casa, em que você vai decorar, colocando objetinhos aqui e ali”, afirma.

 

Dois dos artistas selecionados para a exposição participam também da oitava edição do programa de residência artística Bolsa Pampulha, com curadoria de Fonseca e Amanda Carneiro (Masp), e promovido pelo Museu de Arte da Pampulha (MAP), em Belo Horizonte (MG): os mineiros Lucas Emanuel e Mateus Moreira. Ambos pintores, eles levaram trabalhos bem distintos ao espaço expositivo do Galpão, em Tragédia!.

“Lucas é um pintor que trabalha com vídeo também. Ele vai jogando com a relação entre os dois suportes em seus trabalhos. Ele tem uma pintura que lida muito com o corpo humano, mas sempre com uma estranheza. Um tom meio fúnebre, sombrio, misterioso. No vídeo ‘Compasso’, por exemplo, aparece um colchão, ao redor estão sapatos, e tem ainda uma vela, que vai se apagando. Parece meio uma sessão espírita, há a expectativa de que algo aconteça, mas é somente a vela ali, apagando-se”, comenta Fonseca.

Para o curador, Lucas se interessa por um tipo de imagem mais crua, ao passo que Mateus é um “virtuoso”. “Se a pintura do Lucas tem uma relação muito forte com o corpo, a do Mateus busca ter cenas. São imagens muito complexas, com várias coisas acontecendo ao mesmo tempo, num caráter teatral. E, muitas vezes, nesse caráter teatral, tem algo de trágico, violento. Há elementos monstruosos e fantásticos também”, diz.

Sem Título, o díptico apresentado na exposição Tragédia! por Lucas Emanuel, traz um “duelo de imagens, no contexto político das eleições, com as pessoas de costas uma para a outra”, segundo o artista. Em uma das pinturas, o céu aparece numa maior porção da superfície; noutra, é a terra que ocupa mais espaço na tela. Simbolicamente, diz ele, há uma referência a céu e inferno, trabalhada também num uso de tom mais azul, de um lado, e terroso, do outro.

Já no vídeo Compasso, o artista mostra sapatos que vinha coletando na rua ao longo do tempo, “como rastros de uma tragédia, objetos meio mórbidos, mas, ao mesmo tempo, objetos de fetiche”, diz. “A resposta ao argumento da mostra surge no sentido de um enclausuramento, num espaço que poderia ser um velório, mas também uma festa ou um ambiente íntimo. Há a ideia de um fato que parece ter acontecido ou que vai acontecer. No áudio, há também um vazamento de som, de pessoas falando, com uma certa estética de encarceramento. Mas há uma figura ausente, num jogo com a noção de uma perda.”

Já Mateus afirma que, diante do argumento proposto por Fonseca, ele logo associou Tragédia! à ideia de desordem, caos e violência. “Pensando nisso, todos esses conceitos se uniram na pintura em uma atmosfera densa, turva e claustrofóbica. Os vestígios desses acontecimentos, dessa tragédia, emaranhavam-se e se tornavam corpos nebulosos que só eram iluminados pelo fogo, que tanto traz esse estigma da devastação, mas também da renovação”, afirma o artista.

Mateus conta ainda que cada obra criada foi motivada pela “premissa da ruína” que, para ele, tornou-se a “característica cotidiana cada vez mais presente na civilização”. O artista considera que os trabalhos realizados para a exposição são um marco em sua trajetória. “Mas, talvez isso não seria possível se o tema não tivesse se encaixado tanto com os anseios que motivam minha produção. Ao investigar a memória e a imaginação, dentro do contexto atual da minha vida, tem sido quase impossível desvincular do trabalho os sintomas da vivência distópica do mundo contemporâneo”, argumenta.

Além de Machado e Sonia, Raphael Fonseca buscou, para a mostra, obras de jovens artistas contemporâneos, já com carreira consolidada, como Adriana Varejão. Desde o começo, o curador e Adriana tinham em mente fazer algo a partir das experiências dela com as texturas craqueladas. “Ela, então, teve ideia de propor um trabalho em torno do Zé Celso e do Teatro Oficina. Sabendo da relação com o terremoto e o fantasma da Semana de Arte Moderna, do argumento da mostra, Adriana achou interessante estabelecer um arco, uma ligação entre as duas coisas”, explica Fonseca.

Adriana aponta que o craquelado de sua obra, intitulada Homenagem a Zé Celso, “lembra um pouco as placas tectônicas, que são a origem dos abalos sísmicos”, numa alusão ao tal terremoto de 1922. “O trabalho mais ou menos comenta essa lógica, essa mecânica, essa questão da movimentação das placas. Ao mesmo tempo, quando o Raphael fala em tragédia, com um ponto de exclamação, tem um duplo sentido. Porque se refere à Semana de 22, que representaria toda a questão do modernismo, a tentativa de trazer para os trópicos as atualizações modernas, de vanguardas que estavam acontecendo na Europa”, comenta a artista.

Por outro lado, continua Adriana, a tragédia também evoca o teatro grego. Uma tragédia que Zé Celso usa, segundo ela, de uma maneira especial: “Fazendo uma paródia, ao mesmo tempo criando algo muito original. Então, eu pego esse discurso e me aproprio, vou para outro lado. Penso em São Paulo, em tragédia, por livre associação também pode-se pensar no Zé Celso e seu Oficina. O Zé Celso criou esse termo, o Sampã [que está escrito em seu quadro] para o espetáculo Macumba Antropófaga, evocando o mito grego de Pã, brincando com a questão de gênero da cidade. São vários caminhos ficcionais que respondem à provocação que Raphael trouxe”, conclui Adriana.

SERVIÇO

Tragédia!
Até 15 de outubro
Galpão da Fortes D’Aloia & Gabriel: Rua James Holland 71 – Barra Funda, São Paulo (SP)
Visitação: Terça a sexta-feira, das 10h às 19h; sábado, das 10h às 18h

Bienal do Mercosul fala de trauma, sonho e fuga

Pedro Reyes,
Pedro Reyes, "Hypnopedia", presente no Instituto Ling, na 13ª Bienal do Mercosul. Foto: Thiele Elissa

A 13ª Bienal do Mercosul reflete o tema Trauma, Sonho e Fuga, gatilho narrativo da primeira edição presencial em quatro anos. A curadoria é assinada por Marcello Dantas, junto com os curadores adjuntos, Carollina Lauriano, Laura Cattani, Munir Klamt e Tarsila Riso. A presidência é de Carmen Ferrão, aliada à proposta curatorial de fazer uma exposição inclusiva e disruptiva. A empresária, animada com o resultado da mostra, aposta em um público de 800 mil visitantes.

Uma das dimensões utópicas de qualquer curador é colocar em cena todos os seus delírios. Marcello Dantas, criador interdisciplinar, acostumado a pilotar grandes projetos internacionais, avalia que foi um esforço enorme comissionar mais de 60 obras, entre as 100 apresentadas por artistas de 23 países. “O conceito era trabalhar com projetos inclusivos, participativos em face do tempo que acabamos de viver com a pandemia.” Ele fala da ideia de viver junto de novo e de sentir o batimento disso, o que produziria um sentimento de união comum a todas às pessoas, independentemente das origens étnicas, de gênero, cultura. “Enfim, que a gente voltasse a pensar em uma coisa do indizível, aquilo que não dizemos e que fica preso dentro da gente.”

Esta edição teve que superar a perda da Usina do Gasômetro, em decorrência de um processo burocrático que impediu que a reforma do prédio fosse concluída a tempo. Em compensação a Bienal ganhou espaço no Instituto Caldeira, local multiuso, que fica na antiga fábrica da Renner, completamente reformada, somando uma área útil de 22 mil metros quadrados.

Com o enigmático título Transe, a exposição experimental high-tech toma parte desse mais novo espaço da cidade, introduz o visitante à artemídia atual, com obras realizadas com complexas ferramentas virtuais, linguagem tecnológica, liberdade experimental e muita ludicidade. A curadoria é de dois jovens artistas, Laura Cattani e Munir Klamt. Pela primeira vez a Bienal cria um edital de chamada aberta, reúne quase 900 projetos, dos quais somente 19 são escolhidos pelo curador geral e seus adjuntos, sem que nenhum deles soubesse o nome do autor. O que os trabalhos vencedores têm em comum é o idioma tecnológico, atual ou ancestral, como define a curadora Laura Cattani.

 

Os artistas projetam seus trabalhos, mas, para garantir a execução e o funcionamento deles, a Bienal fez parceria com a Tecnopuc, da PUC gaúcha, onde algumas das peças foram executadas.

Nesta exposição, as perguntas se multiplicam diante de uma tecnologia ainda pouco conhecida do grande público. Surpresas, algumas pessoas tentam adivinhar do que se trata a “engenhoca” montada pelos artistas mais jovens dessa mostra, Luis Enrique Zela-Koort e Genietta Varsi, que formam a dupla Esfincter. A instalação tem como título Órgano primo: Condensador de Cuerpos e é inspirada nas cosmovisões pré-modernas, propõe novos futuros ao público a partir de um esfíncter robótico composto por uma caldeira, bomba de água, um resfriador e um gerador de faíscas. Trocando em miúdos a instalação reporta-se a um esfíncter digestivo, que coleta um composto orgânico e destila a putrefação. O projeto alude à experiência científica de Stanley Miller e Harold Urey sobre a hipótese de que a matéria precursora da vida poderia ter se formado espontaneamente.

Entre as obras deste segmento, que trazem complexidade conceitual destaca-se Insurreição Micorrízica, da dupla Cesar & Lois (Cesar Baio e Lucy HG Solomon), que estabelece um canal de comunicação com o público propondo uma reflexão sobre o Antropoceno, nova época geológica caracterizada pelo impacto do homem na Terra. Cattani explica que a instalação é composta por um ambiente controlado no qual a inteligência artificial, micélios vivos (cogumelos) e redes digitais reagem às mensagens enviadas pelos participantes “Além de receber as respostas em seu smartphone, eles podem visualizar nas telas dispostas ao redor da obra dados sobre as atividades dos micélios e intervir nas características do ambiente, que vão oscilando conforme essa comunicação se estabelece.”

Há trabalhos com abordagem lúdico experimental como a instalação de Leandra Espírito Santo sobre a relação entre o corpo e máquina, fragmentação do corpo em ambientes virtuais. Moldes de partes desmembradas de diferentes corpos deslizam sobre  trilhos mecânicos. Por meio da visão monocular de uma câmera, por breves instantes, as partes amputadas de corpos diferentes se juntam e transformam-se num corpo perfeito. Cattani vê nesse trabalho uma alusão à ideia do projeto Vitruviano, de Leonardo Da Vinci que apresenta o corpo humano ideal.

Distante do Instituto Caldeira, bem no centro da cidade, o Santander Cultural exemplifica a ideia de batimento contido no conceito da bienal, com a instalação de Rafael Lozano-Hemmer. Mais uma vez, o artista mexicano-canadense desafia pontos de tensão entre a arquitetura e o espaço. A instalação Pulse Topology toma todo o andar térreo do Santander e capta, a partir de sensores, o pulsar dos visitantes, que o visualiza na sequência repetitiva de três mil luzes que brilham individualmente. O resultado é uma chuva de brilho, experiências cinética e visual contagiantes.

A 13ª edição ocorre num momento de transformação urbana da orla do rio Guaíba, com a recuperação do Cais do Porto, agora com bares, restaurantes e espaços de convivência. Os antigos armazéns ainda permanecem lá, mas só o de número 6, com entrada pelo Cais Embarcadero, acolhe obras da Bienal, sendo algumas mais superficiais e outras mais densas.

No momento político em que vivemos, Ar, instalação de José Bento, provoca empatia imediata com o público, por seu conteúdo crítico. O artista cria uma floresta com 36 peças de madeira, esculpidas em forma de cilindros de oxigênio hospitalares, semelhantes aos que faltaram durante o pior momento da Covid-19, provocando a morte de centenas de pessoas. As peças foram trabalhadas com espécies diferentes de madeiras que representam quatro biomas brasileiros: o amazônico, o atlântico, o cerrado e a caatinga.

Drogas e suas consequências sempre provocaram o imaginário dos artistas, em todas as épocas. Sob o título Placebo, Raphael Escobar inventa um cenário de produção caseira de drogas. Em cima de uma mesa de aço, o jovem artista espalha 20 mil comprimidos prensados nas cores rosa e lilás, que rebatem também um laranja, confeccionados à base de café e açúcar. Ao fundo, um vídeo exibe a produção de drogas legais e ilegais, enquanto as legendas explicam as etapas da produção do café. Tudo parece nonsense, mas a intenção do artista é justamente confundir o espectador sobre os limites entre as duas substâncias.

Política e ativismo atravessam também essa edição. Marilá Dardot, com Zero Tolerance Silver Clouds, instalação confeccionada com elos de corrente preenchida com balões de  fibra de poliéster metalizada que flutuam no espaço, conecta as políticas migratórias estadunidenses à obra Silver Clouds (1966), de Andy Warhol. A artista reporta-se à lei de imigração Tolerância Zero, que em 2018 separou duas mil crianças de suas famílias mantendo-as presas em um cercado de arame num centro de detenção no Texas. Os cobertores prateados usados pelos menores foram confeccionados com o mesmo material empregado por Wahrol em sua obra.

Alguns artistas despertam a atenção do público, mesmo com um trabalho intimista. Marina Abramović apresenta o vídeo Seven Deaths of Maria Callas (2021). A performer cria experiência cinematográfica imersiva impulsionada pela cantora lírica Maria Calas (1923-1977). Para cada uma das sete mortes, Abramović interpreta um solo original de Maria Callas recompondo os finais trágicos das árias. Em vez de estrangulada por Otelo, a Desdemona de Abramovic é esganada por uma serpente. Já o suicídio ritualizado de Madame Butterfly é substituído pela artista se desfazendo do traje de proteção, em meio a uma paisagem de devastação química.

Há motivações que enriquecem o discurso, como prova o artista inglês Tino Sehgal, que já em agosto engajou-se virtualmente à 13ª Bienal, participando do terceiro encontro do seminário Zonas de Contato. A obra, This Element, é uma somatória de suas vivências e, para realizá-la, incorporou samples de música pop e tons vibracionais que, segundo o artista, relacionam-se com as frequências dos chacras. Ainda utiliza fragmentos da banda alemã Kraftwerk e da rapper estadunidense Missy Elliot. Sehgal acredita que o ato de cantar não conecta apenas o corpo e a mente, “muito mais do que isso, mostra conexão com nós mesmos e com os que nos cercam.” A cada duas horas, o “palco” do This Element reúne pessoas para fazerem algo de forma coletiva.

O impacto do imaginário, por meio da ativação do onírico, dos sonhos e delírios estimulou o artista catalão Pedro Reyes a criar Hypnopedia, uma espécie de enciclopédia dos sonhos. O arquivo digital é uma rede semântica de autores, nesse caso o público foi convidado para produzir pequenos registros de memórias oníricas, agora exibidos numa sala zen no Instituto Ling, com os espectadores deitados.

Os dez locais que abrigam a 13ª Bienal espalhada pela cidade, mais do que pontos expositivos, são plataformas onde as pessoas se abastecem no reencontro com a arte e com amigos.

SERVIÇO

13ª Bienal do Mercosul
15 de setembro a 20 de novembro de 2022
Visita nos múltiplos espaços mediante agendamento (clique aqui)

“Outros Navios” traz panorama da obra do fotógrafo Eustáquio Neves

Obra da série
Obra da série "Outros Navios", de Eustáquio Neves. Crédito: Divulgação

No dia 7 de setembro de 1822, o grito do Ipiranga marcava a Independência do Brasil. Porém, apenas 66 anos depois, em 1888, passaram a ser ouvidos os “gritos de liberdade das mais de 4,86 milhões de pessoas que foram escravizadas no País”. Em 2022, um racismo estrutural ainda permeia as relações. É isso que nos explica o texto que abre Outros Navios, exposição individual do fotógrafo Eustáquio Neves no Sesc Ipiranga, em São Paulo. Atravessando quase 40 anos de produção do artista mineiro, descendente de pessoas negras escravizadas, a mostra traz uma história de diásporas e resistências.

“É um trabalho que capta e manipula imagens ligadas às relações étnico-raciais promovidas no passado e no presente, como a violência contra os corpos, a intolerância contra os ritos e a privação de direitos da população negra”, destaca o curador da mostra, Eder Chiodetto.

Fotógrafo e videoartista autodidata, Eustáquio Neves desenvolve seus trabalhos por meio de experimentações na fotografia analógica, utilizando conhecimentos adquiridos na sua formação como técnico em Química Industrial. “A gente pode perceber muito claramente que ele foi construíndo a imagem em camadas, nas quais se interpõem, além da fotografia,  pintura, abrasões, documentos, cartas de alforria [etc.]. Eu costumo ver o trabalho do Eustáquio como uma construção dessas camadas, como se fosse uma forma de desvelar as verdades históricas que foram construídas. Como se ela pudesse revelar os labirintos da história, onde a gente pudesse ouvir também os discursos dissidentes”, diz o curador.

Assim, caminhando pela exposição, nos deparamos com séries como Máscara de Punição – que traz combinados o rosto da mãe do artista e a imagem de uma máscara de tortura que era comumente usada em pessoas escravizadas – e Arturos – que retrata a comemoração da Festa de Nossa Senhora do Rosário, santa protetora de irmandades negras no Brasil colonial.

“As minhas histórias são muito autobiográficas, falo muito de mim, falo muito das minhas origens como uma pessoa negra. Eu basicamente conto uma história através de imagens”, conta Eustáquio Neves a Artérias, série documental do Sesc TV, dirigida por Helena Bagnoli. No episódio sobre o fotógrafo, ele compartilha sua história, a trajetória de seus trabalhos e as motivações que os criam (clique aqui para assistir). “Quem me despertou para o que eu faço foi Arthur Bispo do Rosário. Quando vi uma exposição dele [Registros da Minha Passagem Sobre a Terra, no Museu de Arte da Pampulha em 1989], senti que eu podia fazer o que eu quisesse com a fotografia. Aí que eu entro nessa coisa da fotografia, falei: ‘olha, a fotografia não precisa ser só isso que eu aprendi até hoje, a fotografia pode ser outras coisas'”, completa.

A arte!brasileiros visitou a exposição e conversou com o curador. Confira:

Outros Navios: Fotografias de Eustáquio Neves permeia diversos espaços do Sesc Ipiranga. Com obras na entrada e num painel da área externa, concentra-se principalmente em três salas, que formam núcleos da exposição. A sala 1 reúne um conjunto de trabalhos  que alude às violências e silenciamentos perpetrados contra pessoas escravizadas. A segunda, como nos explica o curador, talvez se proponha como espaço de cura. Nela localizam-se séries que tematizam a resistência por meio de saberes ancestrais e rituais afro-brasileiros, imagens da família de Eustáquio e, ao centro, uma exibição dos processos utilizados pelo fotógrafo em suas criações. Por fim, a sala 3 exibe uma videoinstalação, criada a partir do material bruto de três vídeos do artista: Post No Bill (Nigéria, 2009 – 2022), Bariga (Nigéria, 2009 – 2022) e Crispim: Encomendador de Almas, (Brasil, 2006 – 2022). “É uma sala mais enérgica”, explica Chiodetto, propondo que a visita seja encerrada nesse ambiente que propulsiona a reflexão e move o espectador.

SERVIÇO

Outros navios: fotografias de Eustáquio Neves
6 de setembro até 26 de fevereiro de 2023
Sesc Ipiranga: Rua Bom Pastor, 822, Ipiranga, São Paulo
Visitação de terça a sexta, das 9h às 21h30; sábado, das 10h às 21h30; domingo e feriado, das 10h às 18h
Entrada gratuita

ASSISTA TAMBÉM à série documental Artérias, que capta a essência de artistas visuais de diversas gerações e regiões do Brasil

Com registros de 1890 a 1930, exposição no IMS Paulista revela contradições de reformas urbanas

Restos de observatório e de igreja, fruto da demolição da demolição do Morro do Castelo, Rio de Janeiro, RJ (1922), em
Restos de observatório e de igreja, fruto da demolição da demolição do Morro do Castelo, Rio de Janeiro, RJ (1922), mostra "Moderna pelo avesso". Foto: Augusto Malta/Acervo Instituto Moreira Salles/Coleção Gilberto Ferrez

As fotografias do surgimento das cidades, no final do século 19 e início do século 20, foram associadas a uma ideia de progresso e de modernidade. Imagens que apresentavam destruições de casebres, alargamento de ruas, a transformação de vilas em projetos urbanísticos. Essa ideia, provavelmente, surgiu porque quase todas as produções tinham um caráter patrimonialista, ou seja, fotógrafos que eram contratados por prefeituras ou empresas de engenharia para registrar a força e a pujança. Imagens ligadas à belle époque e à modernização.

Mas, as cidades são formadas por pessoas, que nem sempre foram integradas a este projeto imagético de um imaginário urbano, pelo contrário, muito pelo contrário, muitas vezes imagens do cotidiano foram esquecidas.

No ano em que comemoramos o centenário da Semana de Arte Moderna, o Instituto Moreira Salles (IMS Paulista) investiga a relação entre fotografia, cinema silencioso e cultura urbana, por meio da exposição Moderna pelo avesso: fotografia e cidade, Brasil, 1890-1930, com curadoria de Heloisa Espada e assistência de Beatriz Matuck.

“Queria apresentar as contradições que afloram quando pensamos em projetos de urbanização, trazer imagens pouco conhecidas, e fazer a ligação também com o cinema não sonoro”, explica Heloisa.

A pesquisa de Moderna pelo avesso levou dois anos para ser concluída, as cidades apresentadas são o Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Recife, Belém e Belo Horizonte. Ao invés das imagens muitas vezes vistas de forma esparsa ou em contextos isolados, a exposição nos apresenta um ensaio visual, um conjunto crítico do que aconteceu naqueles anos, um processo político de apagamento da nossa história.

“São reformas urbanas como o ‘bota-abaixo’, que, entre 1903 e 1908, expulsou a população de baixa renda e arrasou o patrimônio colonial do centro do Rio de Janeiro, e a inauguração da Cidade de Minas [depois chamada de Belo Horizonte], planejada do zero, em 1897. Elas forjavam a roupagem moderna da jovem República. No entanto, uma Abolição mais do que tardia, proclamada apenas um ano antes do golpe que instituiu a República, fazia com que o moderno não fosse apenas sinônimo de atualidade e progresso, mas também de violência, apagamento e eugenia”, afirma Heloisa.

Para fugir do estereótipo imagético, várias revistas ilustradas – em que a imagens eram divulgadas naqueles anos – foram folheadas, arquivos de museus pesquisados e acervos pessoais encontrados. Trezentos e onze imagens apresentadas em diversos formatos, como cartões-postais, álbuns, estereoscopias e projeções em lanterna mágica e filmes. Os materiais exibidos em Moderna pelo avesso provêm do acervo do IMS e de outras 28 coleções, entre privadas e institucionais, como Fundação Joaquim Nabuco, Fundação Biblioteca Nacional, Museu Paraense Emílio Goeldi e Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo.

E assim, ao mesmo tempo em que vemos a urbanização, em Moderna pelo avesso também temos acesso a filmes que mostram o mundo do trabalho infantil no curta Cerâmica Horizontina, de 1920, filmado por Igino Bonfioli, ou ainda o espetáculo da ressaca nas praias no Rio de Janeiro, fotografada por Augusto Malta, aonde os cariocas iam para se fotografar, muito antes do modismo do Instagram. Assim como muitas fotos de álbuns de família que deveriam contar a história do cotidiano, e não as imagens oficiais.

De forma provocatória, a exposição Moderna pelo avesso termina com pedaços do filme Limite, de Mario Peixoto, rodado em 1930 e apresentado em 1931, com fotografia de Edgard Brasil, com closes e enquadramentos inovadores para época.

SERVIÇO

Moderna pelo avesso: fotografia e cidade, Brasil, 1890-1930
Instituto Moreira Salles – Paulista: Avenida Paulista, 2424, São Paulo (SP)
Até 26 de fevereiro de 2023
Visitação: terça a domingo e feriados, das 10h às 20h
Entrada gratuita

 

Artista pernambucano José Barbosa abre individual em São Paulo

José Barbosa, A PEQUENA JANGADA NO HORIZONTE, exposta na mostra LUZ PRÓPRIA na Arte 57
José Barbosa, "A pequena jangada no horizonte", 2018. Foto: Divulgação

Entre gravuras, acrílicos sobre tela e papel, esculturas e talhas em madeira, Luz própria, individual de José Barbosa na Arte 57, reúne 34 obras do artista pernambucano em São Paulo. Dentre as selecionadas, estão 28 até então desconhecidas do público. Para o galerista Renato Magalhães Gouvea, a exposição “mostra a capacidade do artista em unir diferentes referências, gêneros e temas, não se prendendo a uma única técnica em suas obras”.

José Barbosa da Silva, hoje com 74 anos, nasceu em Olinda, Pernambuco. Filho de marceneiro e restaurador, começou a entalhar arcas para antiquário na marcenaria de seu pai. Em 1963, com o incentivo do pintor Adão Pinheiro, iniciou carreira artística. Nessa mesma época, passou a integrar e organizar o Movimento de Arte Ribeira, que contou com a participação de João Câmara, Vicente do Rego Monteiro e Guita Charifker. Dois anos depois, organizou o 1º Salão de Arte Popular em Natal, junto a Janete Costa. Em 1972, partiu para a Europa, onde viveu entre Alemanha e França até 1978. “Esta exposição reafirma o fato de Barbosa, ser mais reconhecido fora do Brasil, após realizar cerca de 20 exposições internacionais, no período em que morou fora, entre 1972 e 1998”, afirma Gouvea.

 

“Vendo os trabalhos de José Barbosa, em suas variadas e múltiplas técnicas de elaboração, duas coisas logo sobressaem: quer trabalho em pintura, desenho, gravura, quer talha ou escultura, a unidade temática é flagrante, a ‘atmosfera’ magicamente carregada é quase uma constante, o que leva a observar que sua obra é de uma integridade total, ou seja, José Barbosa é sempre fiel a sua subjetividade interior, fruto também do mundo objetivo que o marcou vivencialmente – a representatividade desse mundo está ligada teluricamente à paisagem real e mitológica da sua sempre presente Olinda”.  O trecho, escrito por Montez Magno em 1981, reaparece no catálogo da mostra atual, evidenciando o eixo que conecta a multiplicidade do artista olindense.

A abertura de Luz própria acontece neste sábado (24), entre 11h e 18h. Na ocasião, a galeria participa do Arte-Circuito Jardim Europa, iniciativa que traz uma programação de visita a seis importantes galerias do bairro (Arte 57, DAN Galeria Contemporânea, Luciana Brito Galeria, Galeria Lume, Galeria Marilia Razuk e Galeria Nara Roesler), disponibilizando ao público serviço gratuito de vans por todo o circuito, ininterruptamente, além de mapas para orientar e facilitar o deslocamento.

SERVIÇO

Luz própria – Individual de José Barbosa
Arte 57: Av. 9 de Julho, 5144 – São Paulo (SP)
Em cartaz de 24 de setembro a 21 de outubro
Visitação de segunda a sexta, das 10h às 18h
Entrada gratuita

Reina Sofía abriga produção gráfica que expressa a resistência popular à opressão na América Latina

Julio Le Parc,
Julio Le Parc, "La tortura en Argentina" (1972). Foto: Joaquín Cortés/Román Lores. Archivo fotográfico del Museo Reina Sofia
Mapa "Aqui viven genocidas", do Grupo de Arte Callejero, presente na mostra "Giro gráfico", no Reina Sofía. Reprodução
Mapa “Aqui viven genocidas”, do Grupo de Arte Callejero, presente na mostra “Giro gráfico”, no Reina Sofía. Reprodução

Em parceria com a Red Conceptualismos del Sur (RedCSur) – grupo com integrantes vindos, em sua maioria de países latino-americanos, e dedicado à pesquisa e crítica de práticas artísticas, arquivísticas, curatoriais e de movimentos sociais –, o Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, de Madri (Espanha), apresenta, até o dia 10 de outubro, a exposição Giro gráfico. Como en el muro la hiedra, que se debruça sobre a resistência popular à opressão na América Latina, da década de 60 aos dias de hoje, expressa por meio de suportes gráficos diversos. Fora do campo da arte, esta produção presente nas ruas das cidades ecoa temas urgentes, como os direitos indígenas, o resgate da memória das vítimas de ditaduras, os movimentos negros, feministas e LGBTQ+, entre outros.

Em comum, essas práticas têm a precariedade dos materiais e o grande potencial de distribuição e disseminação de ideias, seja em cartazes, faixas, bandeiras, camisetas, bordados e mapas, ou ainda nas intervenções em espaços públicos, como performances com pinturas. Em novembro, a mostra concebida pela RedCSur segue para o Museo Universitario Arte Contemporáneo (Muac), na Cidade do México, onde ficará em cartaz até julho de 2023. Em entrevista à arte!brasileiros, André Mesquita, um dos coordenadores de Giro gráfico, ressalta que o objetivo da RedCSur foi fazer do museu “uma caixa de ressonância”, a partir da qual as obras devem “reverberar para fora dele”.

“Nosso desejo é instigar as pessoas, fazer com que elas se inspirem com os trabalhos e que também produzam suas ações, seus cartazes, repensando a gráfica política”, diz Mesquita, que é curador e coordenador da equipe de mediação e programas públicos do Masp e faz parte da RedCur desde 2009. Ele também é curador, ao lado da historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz, do núcleo Rebeliões e revolta, da exposição Histórias Brasileiras, em cartaz no museu paulistano. Segundo ele, há um diálogo entre a mostra em Madri e seu núcleo, seja nos cartazes apresentados, nos bordados do coletivo Linhas do Horizonte, também presente no Reina Sofía, ou na produção de serigrafistas queer, que apresentam trabalhos sobre Marielle Franco, vereadora carioca assassinada em 2018.

As obras exibidas em Giro gráfico estão divididas de acordo com as respectivas pesquisas de materiais e foram agrupadas sob os seguintes conceitos criados pela RedCSur: Gráficas intempestivas, Arseñal, Cuerpos gráficos, La demora, Persistencias de la memoria, En secreto, Pasafronteras, Territorios insumisos e Contracartografías. Nesse último, Mesquita também participou do levantamento das obras, no caso, mapas produzidos por coletivos de artistas e movimentos sociais.

“São mapas de denúncia, que evidenciam a exploração de recursos naturais, por exemplo, mas que também contam uma história de potencialização de comunidades e de movimentos. Como o Grupo de Arte Callejero, criado em meados dos anos 1990 na Argentina, e ligado ao movimento de direitos humanos do país, formado por familiares de pessoas desaparecidas na ditadura militar”, conta o curador.

Esses mapas, diz Mesquita, foram produzidos no início dos anos 2000 e, neles, os manifestantes apontavam quem eram e quais os endereços de alguns dos torturadores da ditadura argentina, que haviam mudado seus nomes logo após a queda do regime. Colados nas ruas onde eles moravam, esses cartazes acabaram levando o governo do país a identificar, julgar e condenar aquelas pessoas, que foram presas.

Na exposição, Mesquita trabalhou com duas outras integrantes da RedSCur vindas do Brasil, ambas nas equipes de pesquisa, que tinham um total de 30 participantes: a também brasileira Clara Albinati, professora da PucMinas, pesquisadora e cineasta independente; e María Angélica Melendi, argentina radicada no País desde 1975, autora de Estratégias da Arte em uma Era de Catástrofes (editora Cobogó), título lançado em 2017, e professora aposentada do Departamento de Artes Plásticas da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, onde coordena, desde 2002, o grupo de estudos em arte contemporânea que deu nome a seu livro.

Segundo Mesquita, Clara e María Angélica levaram a Giro gráfico contribuições importantes da produção brasileira. Desde 2016 na RedCur, Clara colaborou, a partir de Minas Gerais, com, entre outros, uma seleção de bordados dos coletivos Linhas do Horizonte e Pontos de Luta, camisetas de protesto do Coletivo Alvorada e ainda a bandeira Canalha, do Coletivo Vão, usada nas manifestações de 2016 contra o impeachment da então presidenta Dilma Roussef. A obra é uma atualização do trabalho Viva Maria, exposto por Waldemar Cordeiro na Bienal de Artes da Bahia de 1966, em plena ditadura militar. Também uma bandeira, com a palavra “canalha” costurada em feltro, ela foi retirada da mostra, por ordens do então governador do estado Antônio Carlos Magalhães.

Já María Angélica levou ao Reina Sofía a serigrafia Ocupa Tudo!, de Melissa Rocha, também de Minas, e criações do grupo Cólera Alegria, de São Paulo, que em 2020, no auge da pandemia, participou de manifestações artísticas com críticas ao governo Bolsonaro, por meio de cartazes e bandeiras, entre outros, que circularam tanto nas ruas como nas redes sociais, sob a hashtag #coleraalegria.

Giro gráfico é a segunda mostra do Reina Sofía feita em colaboração com a RedCSur. A primeira, intitulada Perder la forma humana. Una imagen sísmica de los años ochenta en América Latina, foi apresentada entre outubro de 2012 e março de 2013, com desdobramentos em programas educativos e projetos editoriais, e itinerâncias em Lima e Buenos Aires. Mesquita, que está desde 2009 na RedCur, e também foi um dos coordenadores da primeira exposição, conta que há uma conexão entre ambas:

“Era um desejo nosso tentar estender a cronologia de Perder la fora humana, trabalhando com movimentos sociais e projetos no presente. E isso foi um grande desafio, porque passamos a nos organizar em 2016, chamamos pesquisadores não participantes da Red, como Josh McPhee e Jesús Barraza, dois artistas e ativistas dos EUA. O plano era inaugurar em 2019, depois passou para 2020, mas aí veio a pandemia e somente neste ano a mostra foi aberta”, explica.

Para Mesquita, um dos trabalhos exemplares dessa extensão cronológica que se deu Perder la forma humana para Giro gráfico é o projeto Zapantera Negra, do grupo de pesquisas Pasafronteras, e desenvolvido pelo coletivo EDELO (En Donde Era la ONU), formado pelos artistas Caleb Duarte e Mia Eve Rollow. Como o nome sugere, o trabalho propõe conectar o imaginário visual dos Panteras Negras – movimento que combatia a violência policial contra os negros durante a década de 1960, no contexto do movimento dos direitos civis nos EUA – com o Exército Zapatista de Libertação Nacional, criado em 1994, e sua mobilização de camponeses indígenas pela reforma agrária, em Chiapas, no México.

“O Emory Douglas, que foi ministro da cultura dos Panteras Negras, participou em 2014 de uma residência numa comunidade de Chiapas, com artistas e bordadeiras zapatistas, a convite do coletivo. Juntos a eles, Douglas produziu trabalhos, entre bordados, faixas, pôsteres etc., que mesclam imagens dos dois movimentos, além de fotografias históricas. Trazer esses artistas dos anos 1960 para o presente, criar esses vínculos inter-geracionais numa temporalidade mesclada, é algo importante para o diálogo do passado com a atualidade que propomos nesta exposição”, conclui.

SERVIÇO

Giro gráfico. Como en el muro la hiedra
Concepção: Red Conceptualismos del Sur (RedCSur)
Até 10 de outubro (a partir de novembro, no Museo Universitario Arte Contemporáneo – Muac, na Cidade do México)
Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, Calle de Santa Isabel, 52, Madri (Espanha)
Visitação: segundas, das 10h às 21h; terça, fechado; quarta a sábado, das 10h às 20h; domingo, das 10h às 14h30

Com curadoria de Moacir dos Anjos, mostra “Necrobrasiliana” chega a Recife nesta quinta (15)

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Gê Viana, "Levantamento do mastro. Festa do Divino Espírito Santo", da série "Atualizações Traumáticas de Debret" (2020). Foto: Gê Viana

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epois de uma temporada no Museu Paranaense (MUPA), entre junho e agosto, em Curitiba, a exposição Necrobrasiliana chega nesta quinta-feira (15/9) a Recife (PE), na Galeria Vicente do Rego Monteiro, da Fundação Joaquim Nabuco. Sob a curadoria de Moacir dos Anjos, pesquisador da Funaj e curador da 29ª Bienal de São Paulo (2010), a mostra apresenta 26 obras, de 12 artistas contemporâneos, que revisitam a memória colonial do Brasil.

No elenco de artistas convidados estão Ana Lira, Dalton Paula, Denilson Baniwa, Gê Viana, Jaime Lauriano, Rosana Paulino, Rosângela Rennó, Sidney Amaral, Thiago Martins de Melo, Tiago Sant’Anna, Yhuri Cruz e Zózimo Bulbul. De acordo com o Moacir dos Anjos, a exposição é um desdobramento das pesquisas que ele desenvolve desde 2008, acerca da relação entre arte e política, em particular no Brasil contemporâneo.

Também segundo o curador, essas investigações resultaram em alguns projetos de exposição, que permitiram a ele se “aproximar da produção de vários artistas que lidam com as violências que formaram e ainda constituem” o Brasil. “Comecei a perceber a recorrência de trabalhos de artistas, principalmente afrodescendentes e indígenas, mas não apenas, que estavam fazendo, em suas obras, embates críticos com essas imagens que supostamente retratavam o Brasil entre os séculos 16 e 19. A partir daí, comecei a pesquisar mais ativamente esta produção”, explica.

Moacir dos Anjos conta ainda que a mostra foi concebida já em 2019, pela Fundaj. No ano seguinte, a Fundação e o MUPA fizeram um acordo de cooperação técnica e cultural, que teve como primeiro fruto a exposição Educação pela Pedra, realizada 2021, no museu paranaense. Por causa das agendas das instituições, ambas decidiram que Necrobrasiliana seria primeiro exibida em Curitiba e, depois, no Recife. A montagem que chega agora à capital pernambucana é exatamente a mesma.

Com os anos de pandemia e o agravamento da crise política que o Brasil atravessa, a exposição se tornou ainda mais relevante, de acordo com o curador. “As questões que ela apresenta, e o racismo, em particular, tornaram-se mais urgentes. A coincidência com as comemorações dos 200 anos da Independência também deram maior pertinência, pois muitas das obras se referem, de modo crítico, a imagens feitas naquele tempo, que ainda hoje informam a memória que temos do Brasil dos tempos de colônia e império”, avalia.

O título, conta o curador, é uma alusão ao conceito de necropolítica – políticas de morte, para o controle das populações –, elaborado pelo filósofo, teórico político, historiador e professor universitário camaronês Achille Mbembe. E se refere, também, à brasiliana, nome dado à produção de viajantes europeus ao País, durante o período colonial, por artistas, escritores, cartógrafos e cientistas, como Albert Eckout, Frans Post, Jean-Baptiste Debret, Johan Moritz Rugendas e Nicolas-Antoine Taunay.

“É também o título de um trabalho de Thiago Martins de Melo, que conheci numa exposição do artista em São Paulo, no início de 2019. Duas pinturas dessa exposição estão presentes em Necrobrasiliana, mas não aquela de título idêntico”, diz.

Moacir dos Anjos argumenta que os trabalhos expostos revelam duas estratégias artísticas principais, em curso, que se debruçam sobre a reavaliação da representação colonial no Brasil. Por um lado, diz ele, há obras que focam na exposição de danos impostos às populações racializadas, ao longo da história do País, a exemplo das criações de Thiago Martins de Melo, Jaime Lauriano ou Rosana Paulino. Outros, apontam para uma “dimensão de cura e redesenho” do que poderia ser o Brasil no futuro, a saber, os trabalhos de Gê Viana, Ana Lira e Yhuri Cruz e Dalton Paula.

“Em alguns, essas duas operações se embaralham um pouco. Como está no título do ensaio publicado no catálogo, são estratégias artísticas que querem ‘defender os mortos e animar os vivos’, pondera. “Ou seja, defender os mortos de suas dores, mas, também, simultaneamente, animar os vivos a fazerem valer, no tempo de agora, os desejos frustrados ou sufocados de tantos no passado. Insistir nessa relação de ‘intimidade’ entre a experiência dos que vivem agora com as vidas dos que há muito morreram me parece, de fato, fundamental.”

SERVIÇO
Necrobrasiliana 
Até 29 de janeiro de 2023
Galeria Vicente do Rego Monteiro, Fundação Joaquim Nabuco: R. Henrique Dias, 609 – Recife (PE)
Visitação de terça a sexta, das 14h às 19h; sábado, domingo e feriados, das 13h às 17h

Com os pés no chão e os olhos na realidade

Iatã Cannabrava, Caracas (2006), na exposição "Uma outra cidade, um outro tempo", em cartaz no Museu da Cidade de São Paulo

Não é de hoje que o fotógrafo Iatã Cannabrava tem seu olhar voltado para a periferia. Um olhar de olho no olho, de vivência, de trocas. Um olhar que vai se desenvolvendo ao conversar com os moradores, ao tomar uma cerveja com eles num boteco, ao frequentar suas casas. De 1997 a 2007, o fotógrafo visitou lugares afastados do centro de São Paulo e das grandes cidades da América Latina, para o que ele chama de seu “mais longo projeto fotográfico”. O objetivo era documentar o dia a dia das comunidades a partir das pessoas, “distante da tradicional denúncia de miséria e pobreza vista pelas teleobjetivas dos fotógrafos, de cima para baixo e, invariavelmente, em preto em branco”, reflete Iatã. “Sempre me senti mais à vontade ali, nas comunidades, sentando no balcão do primeiro boteco ao entrar em cada uma delas”, afirma.

Em geral, estes ensaios são quase sempre realizados em preto e branco, mas foi na cor que Iatã Cannabrava descobriu a linguagem das periferias. “Só fotografava em preto e branco, mas quando fiz o ensaio Casas Paulistas, em 2000, eu descobri a cor.” Neste livro, um ensaio sobre as várias formas de morar em São Paulo, já encontramos o germe do ensaio das periferias.

A denominação de seu “mais longo projeto fotográfico” tem sua razão de ser: Iatã pensou em voltar para os mesmos lugares, de tempos em tempos, para fotografar o desenvolvimento – ou não – das periferias visitadas. Não deu. Em 2008, ele foi diagnosticado com o Mal de Parkinson. A doença lhe deu outra perspectiva de vida: “A doença limitou minhas atividades, mas não me impediu de realizar meus projetos”, argumenta, no entanto.

O fotógrafo então mergulhou em seus arquivos, continuou, de alguma forma, a conversar com as pessoas que havia encontrado em suas viagens, manteve viva sua memória: “Se você nunca foi a uma dessas periferias fisicamente é difícil conhecer de fato”, explica. “Adorava passear pelo escuro das ruas, ou acompanhar as festas, ver todo mundo dançando, sentia-me vivo e seguro”, conclui.

Agora, sua memória e sua vivência podem ser vistas na exposição Uma outra cidade, um outro tempo, no Museu da Cidade de São Paulo, com curadoria do crítico e pesquisador Rubens Fernandes Junior.

A mostra traz cerca de 80 fotografias, registradas em sistema analógico, usando negativos de médio formato, em diversos bairros periféricos. As imagens vão do Capão Redondo a Itaquera, na cidade de São Paulo, além de Belém, Caracas, Lima, La Paz, Buenos Aires e Montevidéu. Para o curador Rubens Fernandes, o ensaio continua atual:

“Os territórios permanecem como centros de resistência cultural e política. O tempo é perceptível nas fotografias do ensaio Uma outra cidade por meio de pequenos detalhes: mobiliário, roupas, gestos, anúncios, automóveis, entre outros índices que qualificam e especificam o passado”, argumenta. “A fotografia é uma das manifestações visuais mais contundentes, justamente porque sua origem está intimamente associada com a ideia de que ‘fotografia é o registro inequívoco do mundo visível (da realidade)’.”

Para Iatã, agora é o momento certo de apresentar estas imagens. A cidade ganhou outro tempo, uma nova dinâmica. Ele percebe o tempo de forma diferente atualmente. Um tempo mais vagaroso: “Antes da minha doença, tratava-se do eu, agora, trata-se do outro, de outro tempo, é importante falar com o outro, saber do outro. Sou muito grato a todos que abriram suas casas, comunidades, vidas, para que possamos nos ver melhor, e a todos que, depois que acabou o projeto, continuaram a meu lado”.

Muito preocupado em suas reflexões com o ato criativo, com o caos e com a ordem, Iatã Cannabrava afirma: “Para mim, a periferia é mais próxima da alma deste país do que nossas avenidas ordenadas”.

SERVIÇO

Iatã Canabrava, Uma outra cidade, um outro tempo
Casa da Imagem – Museu da Cidade de São Paulo Rua Roberto Simonsen, 136B – Sé – São Paulo (SP)
Até 23 de outubro
Terça a domingo, das 9 às 17h
Entrada gratuita

O que visitar no Rio de Janeiro na semana da ArtRio 2022?

Dora Smék. "simétricos psicofísicos: alegoria #1", 2022, exposto na ArtRio pela Central Galeria. Foto: Ana Pigosso

Entre os dias 14 e 18 de setembro, o Rio de Janeiro recebe a ArtRio. A feira chega à sua 12ª edição reunindo 60 galerias e 15 instituições ligadas a arte na Marina da Glória. Neste ano, a programação está dividida em dois espaços: o pavilhão TERRA (central), que abrigará a mostra PANORAMA, da qual participam galerias com atuação estabelecida no mercado de arte moderna e contemporânea; e o Pavilhão MAR. Este, os expositores dividem-se em quatro programas: VISTA é dedicado às galerias com até 10 anos de existência; SOLO foca em projetos expositivos originais dedicados a um único artista; EXPANSÃO reúne instituições e espaços que utilizam a arte como inclusão social e o já tradicional MIRA, com curadoria de Victor Gorgulho e Henrique Rondinelli, convida o público a explorar narrativas visuais de artistas consagrados e novos nomes que usam a videoarte como plataforma

Pensando em quem vai ao Rio de Janeiro acompanhar a feira, montamos um roteiro de visitações com as principais mostras em cartaz na capital fluminense durante a semana do evento.

UÝRA, “Espíritos de Tudo Que Vive”, 2019, exposta na mostra dos Premiados PIPA 2022. Foto: Selma Maia
Paço Imperial

A poucos minutos da ArtRio, no centro da cidade, o Paço Imperial recebe as exposições dos vencedores do Prêmio PIPA 2022 e das aquisições recentes da instituição. O Terreiro do prédio colonial carioca recebe trabalhos do Coletivo Coletores, de Josi, UÝRA e Vitória Cribb, totalizando 30 obras. “O conjunto mostra um ecossistema artístico bastante complexo, misturando poéticas que remetem a práticas mais artesanais, até o envolvimento radical com a tecnologia”, explica o curador Luiz Camillo Osório. Trabalhos de artistas contemporâneos brasileiros que fazem parte da história do Prêmio, como Eduardo Berliner, Leticia Ramos, Romy Pocztaruk, Ilê SartuziDenilson Baniwa e Isael Maxakali podem ser conferidos na mostra que reúne obras comissionadas e adquiridas pelo Instituto PIPA nos últimos anos.

Silvana Mendes, detalhe de obra da série Afetocolagens. Foto: Divulgação
Museu de Arte do Rio

Quem visita a Praça Mauá pode conferir as exposições do Museu de Arte do Rio e do Museu do Amanhã. No MAR, acaba de entrar em cartaz Um defeito de cor, exposição baseada no livro homônimo, da escritora mineira Ana Maria Gonçalves, que busca fazer uma revisão historiográfica da escravidão abordando lutas, contextos sociais e culturais do século 19. Ao todo, são 400 obras, entre desenhos, pinturas, vídeos, esculturas e instalações, de mais de 100 artistas, em sua maioria negros e negras.

Gira, individual de Jarbas Lopes, entra em seu último mês em cartaz (até 16 de outubro). Com curadoria de Amanda Bonan e Marcelo Campos, a mostra reúne cerca de 100 obras que fazem parte da produção do artista, além de trabalhos inéditos e projetos que só existiam no papel. Lopes também apresenta fotografias, desenhos, livros, maquetes e instalações. Com entrada gratuita, a exposição Ramificar, do artista plástico RAMO Negro fica no espaço ao lado da biblioteca. Em 30 obras que misturam elementos da rua, do afrofuturismo e da espiritualidade católica, aa exposição aborda temas como a masculinidade tóxica, o “vilanismo” do homem negro, o afeto e a esperança, colocando foco sobre a temática do racismo e da violência contra corpos negros e periféricos.

Museu do Amanhã

No outro lado da Praça Mauá, o Museu do Amanhã apresenta Amazônia, individual de Sebastião Salgado. Composta por quase 200 painéis fotográficos, a exposição é resultado de sete anos de experiências e expedições do fotógrafo na Amazônia brasileira e revela a floresta, rios e montanhas, assim como a vida em várias comunidades indígenas – estão retratados os povos Awá-Guajá, Zo’é, Suruwahá, Yawanawá, Marubo, Asháninka, Korubo, Yanomami e Macuxi. Leia nossa entrevista com Sebastião Salgado para saber mais.

Arjan Martins, “Só vou ao Leblon a negócios”, 2016, exposta em “Atos de revolta”. Foto: Fabio Souza / MAM Rio
MAM Rio

No dia 17 de setembro, último dia de feira, o Museu de Arte Moderna do Rio inaugura a exposição Atos de revolta: outros imaginários sobre independência, desenvolvida em colaboração com o Museu da Inconfidência. Com curadoria de Beatriz Lemos, Keyna Eleison, Pablo Lafuente e Thiago de Paula Souza, a mostra parte do bicentenário da independência do Brasil para propor uma releitura desse processo histórico desde a arte, reunindo obras e objetos do período colonial, em diálogo com a produção de artistas contemporâneos, de gerações e geografias diversas; e foca em uma série de levantes populares e motins que antecederam esse momento ou que ocorreram nas décadas subsequentes.

Quem visita a instituição também tem a oportunidade de ver Nakoada: estratégias para a arte moderna. Em cartaz até novembro, a mostra busca trabalhar perspectivas de futuro a partir de um diálogo entre o centenário da Semana de Arte Moderna — reunindo um vasto acervo de obras modernistas —, criações indígenas abrigadas pelo Museu do Índio e trabalhos de artistas contemporâneos; e o faz guiado por uma ética baniwa de permanência e retomada.

Galeria Nara Roesler

Em Ipanema, é possível visitar de Xavier Veilhan, expoente da arte francesa. Com obras em coleções prestigiosas como a do Centre Georges Pompidou, em Paris, e representante de seu país na Bienal de Veneza em 2017, o artista mostra esculturas em vários materiais e formatos – três delas interativas –, e um grande móbile, de 4,5 metros, que exploram seu interesse em criar espaços e contextos que alteram a experiência do espaço e a percepção do tempo.

Carpintaria

FALA COISA, no Jardim Botânico, estabelece um diálogo entre trabalhos inéditos de Barrão, representado pela Fortes D’Aloia & Gabriel e Josh Callaghan, representado pela Night Gallery, de Los Angeles. Com curadoria de Raul Mourão, a mostra suscita pontos de contato entre cada um dos artistas, cujas assemblages têm em comum um modo de crescimento vegetal, como se objetos banais ou de uso industrial pudessem brotar e crescer a partir da aglutinação de fragmentos heterogêneos. Nessa interação, as identidades ou usos pré-atribuídos de cada coisa dão lugar a um regime relacional de comunicação semelhante a uma dramaturgia objetual, ressaltando os componentes teatrais e cenográficos da obra dos dois artistas.