É possível imaginar o quanto já foi escrito sobre o modernismo de São Paulo, desde 1922. Um número incalculável de artigos de jornais e revistas, memórias, livros, dissertações e teses, assim como exposições, catálogos, palestras e cursos. É justamente esse conjunto de reflexões que fez com que o modernismo paulistano – e seu ponto crucial, a Semana de Arte Moderna de 1922 – com o tempo se tornasse um mito, símbolo da renovação da arte e da cultura brasileiras, um processo contínuo de renovação.
Porém, se muito se escreveu sobre a importância (ou não) da Semana de Arte Moderna e sobre os efeitos do modernismo no campo da literatura do País, parece-me que menos problematizada foi a questão das artes visuais.
Não quero afirmar que, em comparação ao papel do modernismo paulista na literatura, existam menos estudos no campo das artes visuais. Pode ser até que de fato isso ocorra, mas não é este propriamente o problema. O que interessa sublinhar é: se a história do modernismo literário de São Paulo é repleta de análises que reelaboram ou colocam em perspectiva as visões mais canônicas que foram construídas sobre o fenômeno, o mesmo não ocorre com as artes visuais. A narrativa criada sobre elas encontra-se apaziguada, seus pressupostos já naturalizados. Estudamos Anita Malfatti, estudamos Candido Portinari, entre outros, mas são raros os estudos que problematizem o que se convencionou entender sobre o modernismo paulista nas artes visuais.
Mas, afinal, o que se convencionou entender como o modernismo nas artes visuais? Suprimindo alguns eventos também considerados importantes, vamos lá:
1917/1918 – Exposição de Malfatti em São Paulo e a crítica de Monteiro Lobato “contra” a artista;
1919 – A “descoberta” de Victor Brecheret por Menotti Del Picchia, Helios Seelinger e outros;
1920 – A primeira maquete do escultor para o Monumento às Bandeiras;
1922 – Entre os dias 13 e 17 de fevereiro, a Semana de Arte Moderna, contando com uma exposição no Theatro Municipal de São Paulo, “apresentando” ao público obras e de Malfatti, Brecheret e Emiliano Di Cavalcanti, entre outros. A exposição – como todo o evento – teria sido recebida com escândalo;
1924 – Manifesto Pau-Brasil;
1924 – Primeira exposição individual de Tarsila em Paris;
1928 – Lançamento do Movimento Antropofágico em São Paulo;
1929 – Primeira exposição individual de Tarsila no Brasil (Rio de Janeiro);
1932 – Criação da Sociedade Pró-Arte Moderna e do Clube dos Artistas Modernos, em São Paulo.
Seria possível continuar acrescentando datas a essa lista até desaguarmos numa espécie de apoteose, na criação dos museus de arte na cidade de São Paulo, o Masp, em 1947 e o MAM-SP, em 1948, sendo que, em seguida, poderíamos acrescentar 1951, data da inauguração da I Bienal Internacional do Museu de Arte Moderna de São Paulo[1].
Se na história da literatura modernista a supremacia do modernismo foi inúmeras vezes questionada, no caso das artes visuais ela há décadas se cristalizou como uma narrativa nascida a partir de uma inquietação apenas individual – leia-se Anita Malfatti –, até transformar-se em uma necessidade e ação coletivas – a criação dos museus de arte em São Paulo. Esse relato triunfante teve um arquiteto: o intelectual Paulo Mendes de Almeida, autor da obra De Anita ao Museu que, antes de ser lançado em forma de livro, foi publicado como uma série de artigos na imprensa paulistana, durante os anos 1950[2].
É claro que De Anita ao Museu não foi o único elemento a contribuir para a construção dessa visão – hoje naturalizada – de que, no campo das artes visuais, o modernismo teria se desenvolvido sem fissuras. Embora considere que o livro de Almeida se tornou a espinha dorsal desse processo de mitificação do modernismo, outros fatores também contribuíram para a construção do mito.
Assim, interessaria atentar para certos momentos daquela história ideal em que ela se chocou com situações concretas que – caso tivessem sido levadas em conta –, teriam retirado qualquer possibilidade de pensarmos que as artes visuais, de Anita aos museus, desenvolveram-se em São Paulo sem rachaduras, em um processo coeso, bem articulado e jamais interrompido.
Talvez o fato que mais comprometa essa visão tão idealizada encontre-se ainda perdido em alguma publicação obscura ou em um livro de memórias mal divulgado, ou mesmo num diário esquecido em uma gaveta qualquer. Porém, é quase inacreditável que um dos principais testemunhos de cisões dentro do modernismo de São Paulo encontra-se documentado em uma das mais importantes publicações do período, a Revista de Antropofagia, lançada em São Paulo em 1928 e que circulou até meados do ano seguinte.
De fato, ninguém parece ter dado a devida atenção para o que demonstra aquela publicação em relação às artes visuais em São Paulo.
Foi nas páginas da Revista de Antropofagia em que saiu publicado um artigo dividido em cinco partes de autoria do intelectual Oswaldo Costa.
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Hoje um nome praticamente esquecido no debate cultural, Oswaldo Costa foi um dos profissionais importantes da crítica cultural e da crítica de arte da segunda metade da década de 1920, em São Paulo.
Nascido no Pará em 1900, foi para o Rio de Janeiro no início dos anos 1920 para estudar advocacia e, no final da década, encontrava-se em São Paulo trabalhando no Correio Paulistano e, mais tarde, também na Revista de Antropofagia. No jornal, em alguns de seus textos, assinava com o pseudônimo Antônio Raposo (que também usava na Revista), curiosamente um nome que fazia referência a Antônio Raposo Tavares, um bandeirante ativo no Brasil entre os séculos 16 e 17.
Foi no Correio que Costa publicou artigos sobre alguns modernistas, entre eles Gregori Warchavchik[3] e Tarsila do Amaral. Sobre essa última, Costa, ao que se sabe, publicaria dois textos: o primeiro, no dia 21 de setembro de 1929, o autor não assina o artigo; no dia seguinte, no entanto, usando os mesmos argumentos e assinando como Antônio Raposo, o crítico situa Tarsila como o nome mais significativo da pintura brasileira da época, e Cartão-postal, como sua principal obra[4].
Alguns de seus textos publicados na Revista de Antropofagia, deixam claro que, para os antropófagos, o modernismo de 1922 havia soçobrado num mar de compadrismo e de falta de criatividade. E isso, não apenas no terreno da literatura, mas igualmente – ou sobretudo – no âmbito das artes visuais.
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Antes de trazer alguns dados para a questão, importa não esquecer que Oswaldo Costa não passou despercebido, nem pela crítica e pesquisadora Aracy Amaral e nem pelo intelectual e poeta Augusto de Campos. A autora, no livro que publicou sobre Tarsila do Amaral[5], atenta para o posicionamento crítico de Oswaldo Costa em relação a Tarsila, visíveis nos dois artigos citados. Porém, Amaral não deixa pistas para que o leitor se familiarize com a escrita de Costa, descobrindo que, para ele, a pintura moderna no Brasil teria começado com Tarsila (e não com Anita, ou Di ou Lasar Segall ou qualquer outro artista ligado à Semana de 1922).
Augusto de Campos, na introdução da edição facsimilar da Revista de Antropofagia[6], salienta a importância do intelectual no âmbito do Movimento Antropofágico. Embora, de maneira discutível, trate Costa como um “doublé de Oswald (até no nome)”. De qualquer maneira, o poeta o considera o único intelectual que, na Revista, se “identificava plenamente com as ideias revolucionárias do Manifesto” concebido por Oswald de Andrade, e publicado no primeiro número da Revista.
Embora Campos saliente que, para os antropófagos, o modernismo de São Paulo teria sido “uma fase de transição, uma simples operação de reconhecimento e mais nada”, o autor não aprofunda o clima de cisão que existia nos textos de Oswaldo Costa que, a certa altura, chega a perguntar: “em sete anos que resultou para nós da Semana de Arte Moderna?”[7]
Creio que aqui caberia a pergunta: por que Aracy Amaral e Augusto de Campos, intelectuais tão argutos, não aprofundaram os elementos de cisão em relação ao modernismo de 22, explicitado no texto de Costa? Se Amaral nada pronuncia a esse respeito, o máximo a que Campos se permite é a seguinte consideração:
Se não se preocupam exclusivamente com literatura, não deixam os “antropófagos” de fazer a crítica interna do modernismo e o corpo de delito de todos quantos, seguidores de primeira hora do movimento, derivaram para uma atitude moderada ou reacionária. Disso se encarrega sistematicamente Oswaldo Costa…[8]
A crítica que Oswaldo Costa fazia ao Modernismo não era “interna”. Ao opinar sobre o modernismo supostamente acanhado de Mario de Andrade e outros, Costa se colocava fora daquele movimento, entendendo a si e aos demais “antropófagos” como a superação do Modernismo de 22, e não a sua continuidade.
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Mas essa maneira de pensar o modernismo paulista como uma árvore que, após a Semana de Arte Moderna, teria dado muitos e diversos frutos, como se sabe, não se encontra apenas em Augusto de Campos. Outros autores e autoras persistiram e persistem nessa compreensão grandiosa do modernismo de São Paulo e sua influência hegemônica sobre a arte e a cultura do país.
Ao ler o recém-lançado diário de Oswald de Andrade – Diário confessional[9] – fica nítido como, mesmo para o principal nome do Movimento Antropofágico era difícil pensar 1928, data do Manifesto Antropófago, como uma cisão fundamental com o Modernismo de 1922.
Em determinado trecho de suas anotações sobre os 30 anos da Semana de Arte Moderna, até então inéditas, ele parece que vai se posicionar como um partidário da ruptura do Movimento Antropófago com o Modernismo: “[…] Já em 28, dava-se o estouro e a compromissão [sic] política em que se forjaria o Brasil novo. Foi aí o divisor das águas brotadas em 22. A Antropofagia, pela sua revista, congregou os que iriam comigo, mais tarde, para o marxismo e para a cadeia.”[10] Mas para ele, a divisão também não significava rompimento. Tanto é verdade que, mais adiante, ele continua sua reflexão sobre o Movimento Antropofágico como “divisor das águas brotadas em 22”:
[…] O divisor de águas de 28 provocara uma manifestação de conteúdo que separava os modernistas em quatro grupo, obrigando-os a exibir, afinal, uma identificação política.
Em 22, houvera uma unidade proclamada pela liderança de São Paulo […] mas, com as transformações do mundo na década de 20, urgente fora que cada um vestisse a sua camisa ideológica.[11]
Embora esse trecho possa fazer supor que Oswald entendeu que, em 1928, essa divisão de águas poderia significar um rompimento efetivo com o passado modernista, pouco mais tarde ele se exprime, sem cerimônia, sobre a “maturidade da Semana”, demonstrando, então, que para ele não teria havido ruptura entre 1922 e 1928 (para permanecermos nessas datas simbólicas):
A maturidade da Semana já produziu três figuras de excepcional segurança e relevo: uma desconhecida, a do jovem crítico paulista Mário da Silva Brito […] As duas outras são as do romancista Gustavo Corção e do poeta Cassiano Ricardo. São três derivados da Semana e neles se estabelece o triunfo de nossas inquietações e pesquisas de 22[12].
Outro dado a enfatizar é que nesse balanço, Andrade demonstrará mais preocupação ainda com a literatura e a poesia do Brasil, pouco se dedicando às artes visuais. De qualquer maneira, ele reconhece a importância de artistas do Modernismo “histórico”, como Di Cavalcanti e Victor Brecheret[13].
Em determinado parágrafo, inclusive, Oswald demonstra uma inequívoca satisfação em reconhecer como o Modernismo se institucionalizava junto às elites paulista e carioca, recebendo a adesão do próprio presidente da República:
Hoje, quando a gente mais civilizada do Brasil, Ciccillo e Yolanda Matarazzo, em São Paulo, Niomar e Paulo Bittencourt, no Rio, dirigem a avançada triunfal do modernismo, quando a visão do sr. Getúlio Vargas oficializa a Semana, obrigando conhecidos paquidermes a pronunciar publicamente confusas besteiras adesistas, bem como a Academia Brasileira a dobrar o joelho reumático diante de nós, quando é levado ao governo de Minas Juscelino Kubitschek, o homem que muitos anos atrás chamou Oscar Niemeyer e Guignard para darem continuidade estética à grande Minas dos Inconfidentes e do Aleijadinho, difícil é ser passadista.[14]
Interessante como, nessa visão triunfalista de Oswald sobre o fenômeno artístico e cultural do País, de 1917 a 1952, ele está mais próximo de Paulo Mendes de Almeida, do que seu parceiro antropófago, Oswaldo Costa.
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Interessa saber e refletir sobre como Oswaldo Costa se referia, tanto à produção de Victor Brecheret quanto àquela de Anita Malfatti.
Em Moquem II – Hors d’oeuvre, atentando para a crescente decadência do Modernismo, Costa explicita seu ponto de vista sobre a carreira de Brecheret:
… Por isso é que o Brecheret de Eva, capaz de nos dar uma obra interessante – apenas interessante, na minha opinião, porque eu não creio no sr. Brecheret – foi trocado pelo Brecheret insuportavelmente medíocre dos pastiches de Mestrovic, arte falsa, decadente, sem nenhuma expressão, superficial, chata e burguesa[15]
Por esse comentário que desqualificava a trajetória do escultor após seu primeiro estágio europeu, percebe-se que o crítico possuía alguma intimidade com a produção do escultor, e que estava atento à adesão do então jovem artista às formulações de Ivan Mestrovic, escultor croata com importante presença no restante da Europa, engajado na constituição de um corpus escultórico ao mesmo tempo distanciado dos cânones da escultura verista – tão forte na Itália do início do século passado –, e comprometido com uma linguagem moderadamente sintética, com uma adesão comedida à modernidade do período.
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Na edição de 24 de abril da Revista, continuando o artigo, Oswaldo Costa desbanca Mário de Andrade como intelectual e crítico (a única produção de Andrade que Costa parecia respeitar era Macunaíma). Ele volta a desbancar Brecheret e, com a intenção de continuar o ataque a Mário de Andrade, envolve um trabalho de Anita Malfatti, mais especificamente uma pintura que a artista havia produzido em Paris e que contara com o apoio de Mário de Andrade para que o Estado de São Paulo o comprasse: a Ressureição de Lázaro: “Ora, quem se baba diante dos pastiches cretinos de Brecheret – arte de Saint Sulpice, como disse muito bem Fosca. Quem destaca na exposição de Anita, o que nela havia de ruim, o Lázaro”.[16]
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Em março de 1929, Helios (pseudônimo de um dos modernistas de 1922, Menotti Del Picchia), publica no Correio Paulistano, na seção “Crônica Social”, o artigo “Crise no Modernismo”[17]. O poeta inicia o texto afirmando que o “modernismo estético” de São Paulo vivia uma crise da qual, talvez, não conseguisse escapar. Irônico, afirma que, talvez a Antropofagia “do Oswald d´Andrade” tivesse despertado nos “artistas de vanguarda”[18], uma gula que faria com que se comessem uns aos outros.
Menotti se explica:
O fato é que Brecheret – o formidável escultor de Eva, que com Anita Malfatti representou na arte plástica, o grito de renovação – começa a ser considerado passadista… Para mim, o criador ciclópico de tantas coisas admiráveis, apesar de se ter metido por um beco de arte perigoso, intelectualizado e amaneirado, continua a ser um dos maiores artistas nascidos no Brasil[19]
Sobre Anita Malfatti, Helios afirma:
Anita vai pela mesma rampa, no conceito dos que precipitam a arte pela ladeira abismal de todos os “ismos” … Anita também, como Brecheret, precisa fazer u´a marcha-a-ré e voltar àquelas expressões sadias e fortes da arte pessoal e admirável que já soube documentar com belíssimas telas. Mas Anita é ainda, como Brecheret, santo do meu mais alto culto. Grande talento, grande sensibilidade, grande cultura[20].
Como visto, o autor reforça a impressão de que a pintura de Malfatti havia regredido em qualidade, mas não deixa de registar que ela, como Brecheret, estava em alta conta em seu altar.
Essas declarações sobre os dois artistas – diga-se de passagem – retratam bem o quanto Menotti Del Picchia se esforçava, em seus artigos e crônicas, em atenuar as críticas que poderia ter em relação à produção de um artista ou literato, buscando um equilíbrio entre o apreciar e o não apreciar, entre o respeito à individualidade do autor (ou autora) e a adesão a determinadas escolas etc.[21].
O artigo segue salientando que o verdamarelismo[22] também tinha sido atacado, assim como o “macunaísmo”, ou seja, Mário de Andrade.
Caminhando para o final do artigo, Helios chama a atenção para um fato para ele fundamental: enquanto se desencadeava a crise a que aludira no início, “o passadismo entra na idade do ouro”. Diante de tal perigo, ele termina o texto, de forma conciliadora, exortando os modernistas a reverem suas posições:
Diante de tão grave crise, proponho um armistício geral na ala da frente: uma reação solidária, fraterna, formando uma fronte única. Sus! Na estacada, os verdamarelos, antropófagos, macunaimos, livre atiradores, frondistas de todas as cores, rebeldes de todos os credos!
Sus! Agi antes que nas nossas praças articulem algum outro monstro de bronze e nossas galerias se inflamem com algum outro cromo, parecido com o cartaz das pastilhas do dr. Richard […][23]
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Alguns dias depois, Helios publicaria o artigo Carta aos antropófagos, em que, não sem ironia, descreve o almoço que os responsáveis pela Revista fizeram em homenagem ao palhaço Piolim.[24] O autor chama a atenção para o caráter previsível da refeição. Ele parecia esperar um encontro mais original, tratando-se de um evento formulado por antropófagos!
Ali, Helios atenta também para algo que vem reforçar a dimensão de ruptura entre os antropófagos e os líderes de outras vertentes atuantes em São Paulo. Nota a ausência, no almoço, do “grupo Macunaíma” – leia-se Mário de Andrade e seguidores. Para o cronista, Piolim parecia estar acima de qualquer rixa entre grupos. Ele também chama a atenção para a ausência dos verdamarelos Plínio Salgado, Cassiano Ricardo, Candido Motta Filho e Alfredo Ellis Jr[25]. Ao se perguntar o porquê da ausência desses seus companheiros, menciona Oswaldo Costa pela primeira e única vez:
Por quê? Já foram acaso comidos pelos antropófagos? O Bopp terá devorado Plínio? O Oswald d’Andrade teria moqueado Cassiano? E o Motta magruço, nervoso, osso e músculo quem teria ousado papá-lo? E o Ellis […] estaria, como Jonas, debatendo-se no ventre do Oswaldo Costa?
Mistérios… O fato é que as tribos andam em guerra[26]
Menotti termina o artigo pesaroso com a situação de esfriamento entre os grupos, dirigindo-se aos antropófagos também de maneira conciliatória:
Eu sou pela paz. À margem, quieto, anotando, arrasto a tristeza de um pai velhusco que vê a família desunida…
Meus caros Cunhambebes: eu vos saúdo do fundo do coração e apresto meu cachimbo para sempre trocarmos as baforadas do fumo da amizade.
Vosso sempre para novos ágapes.
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Apesar das propostas de armistício de Menotti Del Picchia, as cisões entre os antropófagos de São Paulo e seus ex-companheiros tenderão a se agravar ainda mais. Daquele final de década em diante, cada um daqueles grupos (e, de certo modo, cada um dos indivíduos que os formavam) começará a caminhar separadamente, solitários, ou em grupos mais reduzidos, em direções opostas.
Assim, o mito de um modernismo triunfante, como já mencionado, apenas seria constituído com a criação dos Museu de Arte de São Paulo e do Museu de Arte Moderna de São Paulo, que transformaram a Semana de Arte Moderna de 1922, em berço esplêndido da arte moderna não apenas de São Paulo, mas de todo Brasil.