Instituição precisa de soluções para continuar em pleno funcionamento. Na foto, a escultura "Inmensa", de Cildo Meireles. (foto: Tibério França)

Em um ano para lá de difícil na cena das artes visuais, marcado por censuras e protestos idiotizantes, 2017 terminou com uma péssima notícia: a queda do mecenas Bernardo Paz, gerando incerteza no futuro de Inhotim.

A notícia não merece ser considerada de fato uma surpresa na história da arte brasileira, já que todas as iniciativas importantes que tiveram origem na iniciativa privada não se sustentaram de forma pacífica após a morte, queda ou falência de seu criador.

Foi assim com o Museu de Arte de São Paulo, Masp, criado por Assis Chateaubriand, e o Museu de Arte Moderna de São Paula e a Bienal de São Paulo, ambos surgidos por desejo de Ciccillo Matarazzo, para citar dois casos paulistanos. Todas essas instituições atravessaram e atravessam períodos de turbulência financeira ou ética, sem uma estrutura que lhes assegure vida permanente.

Na raiz dessas crises encontra-se a mesma dificuldade agora enfrentada por Inhotim: retrato de seu criador, Bernardo Paz, como será possível garantir continuidade a um projeto tão pessoal?

Instalação Narcissus garden, Yayoi Kusama
Instalação Narcissus garden, Yayoi Kusama, 1966. (foto: Inhotim.org.br)

O comprometimento do empresário com o local parecia inequívoco. Inhotim foi inaugurado em 2004, de forma estrondosa, com aviões fretados para levar os 700 convidados ao espaço onde guias, vestidos como se estivem no Jurassic Park, serviam espumante fartamente. Nesse primeiro momento, o parque foi alvo de críticas por expor artistas vistos em qualquer coleção internacional e sem relação com o local. Aos poucos, Paz foi alterando o sentido do local, focando a produção brasileira, reforçando os laços entre arte e natureza, convidando artistas para criarem obras em diálogo com a exuberância do contexto.

A inauguração do pavilhão de Claudia Andujar, há dois anos, pode ser vista como o ápice desse processo. Não há artista que melhor exprima a relação entre meio ambiente e arte que ela e seu pavilhão, não só merecido como necessário, frente ao massacre que os índios seguem sofrendo no Brasil.

Contudo, assim como os mecenas que saíram de cena e deixaram as instituições a deriva, a ausência de Paz será sentido a curto prazo. Afinal, residente do parque, figura permanente no almoço do restaurante Tambaqui, ele garantia um padrão de qualidade que dificilmente será mantido.

Inhotim já é uma Oscip, organização civil de interesse público, mas sem um patrono a altura de Paz, dificilmente o desenvolvimento do parque será garantido. A fragilidade dos Museus de Arte Moderna, tanto carioca quanto paulista, a trajetória irregular do Masp e as crises constantes da Bienal apontam que deixar o melhor espaço de arte contemporânea do Brasil nas mãos da iniciativa privada é temerário.

Na cidade de São Paulo, é inegável, a instituição com trajetória mais sólida e consistência é a Pinacoteca do Estado, apesar de sua recente semi-privatização, sendo transformada em OS (organização social). A Pinacoteca, em seus mais de cem anos, teve diretores importantes como Aracy Amaral, Fabio Magalhães, Emanoel Araújo, Marcelo Araújo e Ivo Mesquita, tendo uma política de aquisição de acervos e exposições sem paradigmas. A Pinacoteca sediu um debate importante sobre arte construtiva quando Amaral era diretora, se abriu às performances na gestão de Magalhães, conquistou público massivo com Emanoel por ocasião da mostra de Rodin e assim sucessivamente. Agora, com o alemão Jochen Volz a frente, ela inaugura uma nova fase mais internacional, o que era necessário.

A Galeria Lygia Pape
A Galeria Lygia Pape, instalada em Inhotim. (foto: Inhotim.org.br)

No entanto, é inegável que o que Inhotim se tornou a grande referência da arte brasileira no país, com artistas que não são vistos de maneira adequada no resto do circuito, como Cildo Meireles, Hélio Oiticica, Lygia Pape, Miguel Rio Branco, Tunga, Adriana Varejão e Andujar, para citar aqueles com pavilhões permanentes.

E essa permanência não merece estar fincada na visão patrimonialista da elite brasileira, que sempre mistura privado e público com fins escusos.

Até agora, a direção de Inhotim vem buscando manter os patrocínios já logrados anteriormente, mas instituições de arte como Inhotim, para sobreviver dignamente precisam do apoio de políticas governamentais consistentes.

Nesse sentido, parece estarrecedor que o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) não tenha tido algum tipo de atuação visível para viabilizar a manutenção de Inhotim. Tanto ele como o governo de Minas Gerais precisam entrar nesse debate de forma decisiva, ou a abertura do local, com os guias vestidos como em um parque pré-histórica, terá sido apenas o prenúncio de um fim desastroso.

 


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