Page 22 - ARTE!Brasileiros #58
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ARTIGO DEMOCRACIA E REPARAÇÃO


                                   Sem título, Rubem
                                      Valentim, 1970





                  contexto da história da produção
                  de arte afrodescendente equivale
                  também à virada decolonial. Isso
                  mesmo Aracy Amaral ressaltando
                  a violência a que os negros foram
                  submetidos no século 19 e
                  recordando a relação entre as
                  políticas de branqueamento, o
                  apagamento e esquecimento.
                  Após apresentar em uma
                  sequência rápida os nomes de
                  artistas como Antônio Bandeira,
                  Rubem Valentim, Almir Mavignier,
                  Edival Ramosa, Genilson Soares,
                  Maria Lidia Magliani, Octávio
                  Araújo, entre outros, Amaral
                  escreve: “Na apreciação da obra
                  desses artistas, bem como de
                  seus percursos, pode-se afirmar
                  que, salvo exceções, não existe
                  na arte brasileira contemporânea
                  uma arte negra, com uma
                  preocupação de afirmação como
                  tal, pois tendências as mais
                  diversas se assinalam nestes
                  artistas de cor ou naqueles
                  que nem sequer essa
                  característica fora definidora
                  em suas carreiras.” (1988, 248).
                    Até aqui, portanto, estamos
                  muito longe do que logo
                  aconteceria com o boom da arte
                  negra no início do século
                  seguinte. A autora acha inclusive
                  questionável fazer uma
                 “exposição da produção plástica   de vista, o projeto eugenista de   As exceções, por isso mesmo
                  de artistas pela exclusiva razão   branqueamento teria triunfado e   do maior interesse, são artistas
                  da cor de sua pele ser mais     não haveria lugar para se pensar   que deixam em suas criações        FOTO: SERGIO GUERINI / CORTESIA ALMEIDA & DALE GALERIA DE ARTE
                  morena”. Estar-se-ia apenas     uma arte negra no Brasil. Mas      transpirar a ancestralidade do
                  apontando para algo esquecido,   Aracy Amaral acrescenta algo em   rito afro-brasileiro, em afir-
                  ou seja, a origem desses artistas,   seu raciocínio que deixa antever   mação de busca de identidade,
                  já que “o avançado [...] estágio de   uma virada, ainda que siga não   como no caso de Rubem
                  branqueamento faz com que no    distinguindo artistas              Valentim, ou no barroquismo
                  Brasil nem atentemos para a sua   afrodescendentes daqueles que    generoso em sua construção
                  origem”. (1988, 272) Desse ponto   se inspiram na cultura afro:    acumulativa de um Emanoel


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