Page 40 - ARTE!Brasileiros #49
P. 40

SEMINÁRIO GESTÃO CULTURAL

             Inhotim era estimular a volta de visitação e estreitar   país. O fato está relacionado a um racismo institucio-
             laços com a comunidade local. Após o ocorrido em   nal infelizmente ainda muito arraigado na sociedade
             Brumadinho, o instituto assumiu um papel de compro-  brasileira. Renata destaca que é importante que sua
             misso social importante na vida da cidade, ação que   posição neste momento sirva para criar uma interlo-
             a diretora conhece bem, pois entre 1997 e 1998 foi   cução nesse aspecto e ressalta pessoas como Rosana
             bolsista da organização Fulbright para observação de   Paulino, Renata Felinto, Janaina Barros, Amanda Car-
             programas voltados a essa esfera: “Um desafio que acho   neiro e Hélio Menezes, que não necessariamente atuam
             importante ressaltar, que é importante para Inhotim em   como gestores mas têm voz ativa no meio artístico:
             específico, mas acho que é para muitos outros espaços   “A mim me dá uma impressão de que há caminhos
             também, é o desafio da conexão com os territórios onde   que se abrem”.
             as instituições estão inseridos”, ela comenta.    Neste ponto, o curador, artista plástico e professor
             No contexto da chegada de Renata ao instituto, foi   Claudinei Roberto da Silva afirma que o que se pode
             iniciada uma nova fase do programa Nosso Inhotim,   “perceber é aquilo que é fácil de ser constatado: existe
             que cadastrou até agora apro-                                         uma competência negro-bra-
             ximadamente 1500 moradores                                            sileira que foi historicamente
             do município de Brumadinho                                            negligenciada”. Ele é formado
             para entrada gratuita na ins-                                         em Artes Plásticas pela Escola
             tituição e 50% de desconto                                            de Comunicação e Artes da Uni-
             nas atividades que ocorrem no                                         versidade de São Paulo (USP),
             espaço. Antes, os moradores                                           ex-coordenador do Núcleo de
             tinham apenas o direito à meia-                                       Educação do Museu Afro Brasil,
             -entrada. “Existe um desejo                                           além de atuar como curador
             e uma ação nossa para uma                                             independente e professor de
             reconexão ainda mais forte,                                           desenho, pintura e História da
             uma criação de vínculo ainda                                          Arte em instituições pelo país.
             mais forte com a cidade”. Ela                                         Ele ressalta que a preocupação
             ressalta que isso envolve desde                                       em incluir essa competência
             os artistas até o reforço de liga-                                    hoje existe, mas em uma pro-
             ções com as escolas da região            CLAUDINEI ROBERTO            porção que poderia ser maior.
             e um alcance aos moradores                                            Ele destaca a falta de pessoas
             de modo geral, sendo assim uma via de troca, onde a   negras em cargos de gerência em instituições pelo
             instituição abre suas portas e a cidade realiza um gesto   país e afirma: “A instituição não é decolonial porque
             de dizer aquilo que é interessante para Brumadinho:   promove simpósio de diáspora afro-atlântica, ela vai
             “Essa abertura para o território hoje ajuda a definir   ser decolonial quando tiver negros, negras e indígenas
             o que Inhotim é”.                                 em cargos de diretoria”.
             Para a diretora, uma das principais situações ao chegar   De acordo com Claudinei, não existe a possibilidade
             em Inhotim foi ver com ainda mais nitidez o fato de   de se falar de decolonialismo sem trabalhar antes a
             instituições serem feitas por pessoas. “Inhotim viveu   ideia de anticolonialismo: “Fica muito difícil tratar de
             essa tragédia muito na pele porque a pele de Inhotim   decolonialismo sem falar de hegemonia, sem falar de
             é feita dessas 600 pessoas que trabalham aqui”, diz.   hegemonia cultural e de branquitude. As pessoas pre-
             Ela conta que a ideia de que uma gestão precisa, em   cisam reconhecer o atraso delas nesse momento da
             todas suas esferas e decisões, ser humanizada foi uma   História”. Suas observações são a partir do que ele
             reflexão provocada por esse acontecimento.        enxerga em São Paulo. Ele aponta a extrema importância
                                                               de se fazer um esforço para trazer à tona uma história,
             DECOLONIZANDO A GESTÃO                            registrá-la em livros, em catálogos ou em documentos
             Dentro da esfera de gestão de instituições culturais   “extraordinariamente bem realizados”, mas que nada
             públicas e privadas no país, é importante ressaltar que   é mais fundamental do que observar se no corpo de   FOTO: ANTONIO TRIVELIN
             Renata Bittencourt é uma das únicas pessoas negras   funcionários de instituições museais a presença negra
             à frente de uma instituição de grande importância no   está contemplada.


            40




         Book_ARTEBrasileiros_49.indb   40                                                                       14/11/19   00:56
   35   36   37   38   39   40   41   42   43   44   45