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Giselle Beiguelman contra a barbárie e a indiferença

Giselle Beiguelman, Monuento Nenhum. FOTO: Ana Ottoni

Coincidiu minha visita às intervenções de Giselle Beiguelman no centro da cidade à volta que fazia ao texto do historiador Jacques Le Goff, “Documento-Monumento” (História e Memória. Ed. Unicamp, 2003, p.525), motivada pelos estudos que desenvolvo sobre o Monumento às Bandeiras, de Victor Brecheret. Frente aos “dispositivos” da artista situados estrategicamente em dois emblemas do passado da cidade que insistem em não escoar para o desaparecimento puro e simples – o Solar da Marquesa e o Beco do Pinto –, nunca as reflexões de Le Goff me pareceram tão atuais. Ali ele sublinhava a necessidade de analisarmos a dimensão “monumental” que os documentos possuem, uma vez que podem (e devem) ser analisados como índice do poder que os geraram.

Junte-se à leitura de “Documento-Monumento”, aquela de um artigo de Álvaro Costa e Silva, “Próxima parada: ferro-velho”, publicado na FSP no último dia 22, em que o articulista comenta sobre os crimes cometidos contra esculturas públicas no Rio de Janeiro (sete, somente este ano). Os dois textos servem como “prólogos” às considerações abaixo.

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O que Giselle apresenta no centro da cidade não são propriamente “obras”, ou não o são no sentido tradicional que concedemos ao que se convencionou chamar de “obra de arte”. São intervenções, espécie de dispositivos especiais colocados à nossa percepção.

Chacina da Luz é um conjunto de restos de esculturas que adornavam o Lago da Cruz de Malta, no Parque da Luz, desde, pelo menos, 1870. Os pedaços de esculturas estão dispostos sobre cobertores baratos, daqueles usados por desabrigados. Cercando o quadrilátero formado pelas peças sobre os cobertores, uma faixa adesiva de segurança (dessas amarelo e preto, usadas pela polícia) enfatiza/mimetiza os dispositivos museológicos usados para evitar a proximidade do público com as obras. Já o título da intervenção – Chacina da Luz –, por sua vez, enfatiza as conexões entre o crime de depredação acontecido no Parque da Luz em 2016 e a prática de chacinas que ocorrem periodicamente em São Paulo e outras cidades brasileiras. Esses índices que associam o trabalho da artista às chacinas possuem um outro ponto: tanto a agressão às esculturas quanto os assassinatos em massa, não foram – ou não são – solucionados.

Até 2016 as esculturas às margens do lago do Parque da Luz enfatizavam o jardim como um espaço de contemplação e deleite. Se o jardim em si já é um constructo, um artifício em que a natureza se submete aos desígnios humanos, as esculturas dispostas ordenadamente à beira d’água anunciavam que ela, a arte, também era merecedora do olhar do visitante, de sua contemplação e deleite. As esculturas, portanto, formavam um monumento à perenidade do belo, uma crença que os grupos que governavam a cidade à época queriam deixar aos pósteros, uma mensagem sobre o belo e sobre si mesmos.

Destruídas as esculturas faz três anos, seus restos foram fotografados e catalogados – transformados, portanto, em documentos da barbárie que o grupo escultórico sofreu. Levados para um depósito da Prefeitura, foram devidamente guardados e esquecidos. Encontrados por Giselle, foram transferidos para o Solar e Chacina da Luz terminar (setembro próximo), o monumento/documento de Giselle será desmontado e levado de volta ao depósito, agora de novo apenas como documento da barbárie. Porém, enquanto durar, Chacina da Luz será mantido nesse “não lugar” em que é percebido como monumento à barbárie e ao descaso e como documento da barbárie e do descaso.

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Se Chacina da Luz, enfatizando a dimensão dicotômica do conceito “documento/monumento”, endereça diretamente seu sentido rumo ao drama que vivemos no atual estágio da sociedade brasileira, ainda mais ampla parece ser a potência das peças que formam a segunda intervenção da artista – Monumento Nenhum – conjunto de peças formadas por pedaços de monumentos – instaladas no Beco do Pinto, (com exceção de um deles, apresentado também no Solar).

Apesar de ser possível saber de onde vêm aqueles fragmentos de esculturas transformados em “monumentos nenhum” – um deles, um pedaço do Monumento a Duque de Caxias, de Victor Brecheret, vítima de um atentado a bomba em 1991 (alguém sabe o que deu?) – não resta dúvida de que, empoleirados em bases ou sobre um armário, parecem monumentos nenhum/documentos sobre o nada.

A dimensão alegórica dessas peças de Monumento Nenhum, por fim, me parece ainda mais proteica porque não direciona com tanta ênfase o sentido da obra para apenas uma direção. De qualquer maneira, penso que os dois trabalhos de Giselle Beiguelman são oportunidades para se aplicar e refletir sobre a concepção de “documento/monumento”, criada por Le Goff, mas, sobretudo, para se pensar sobre o grau de barbárie e indiferença em que vivemos em São Paulo e no Brasil, quando o nosso passado e nosso presente correm céleres para o ferro-velho da História.


++MAIS

Leia também texto de Leonor Amarante sobre a exposição, “Chacina da Luz” exibe a falência do espaço público”.

Segunda edição da BIENALSUR ocupa Buenos Aires

Mais de 80 bandeiras criadas por dezenas de artistas para o projeto "Draw me a flag", do francês Christian Boltansky, na alusão a um mundo sem discriminação. Aqui, bandeira de Claudia Andujar, artista brasileira, na Praça Rubem Dario

E sta Bienal nasce há três anos como a primeira Bienal na história da Argentina, cuja proposta, liderada por Aníbal Jozami, Reitor da Universidad Nacional de Tres de Febrero (UNTREF), inaugura na cidade de Buenos Aires inúmeros sites specifics, exposições e intervenções. Desde maio, outros museus e espaços públicos foram “tocados” pela iniciativa em pelo menos quatro províncias argentinas: Tierra del Fuego, Tucumán, San Juan e Rosário.

Uma das particularidades deste projeto é que sua direção e gestão estão nas mãos de acadêmicos. Se é verdade que Aníbal Jozami, presidente da BIENALSUR, é conhecido no mundo da arte como um grande colecionador (em 2014 sua coleção privada de arte ibero-americana foi exposta no Museo Lázaro Galdiano de Madrid), sua carreira como sociólogo e especialista em relações internacionais junto às universidades federais e como reitor da UNTREF, por anos, o levaram a pensar um projeto além de fronteiras. Diana Wechsler, diretora geral da bienal, é historiadora de arte, investigadora do CONICET (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas) e tem uma visão interdisciplinar sobre a arte.

As principais bienais no mundo vêm questionando há alguns anos seus formatos, funções e viabilidade. Modelos tradicionais tem se esgotado e há uma busca, nos diferentes estamentos da arte e da cultura, por encontrar soluções que permitam mais cooperação, participação e espaço para as propostas de inter e transdisciplinaridade que a arte contemporânea comporta.

A BIENALSUR, no lugar de concentrar todos os esforços em uma única cidade, uma sede, se propõe a “levar o pensamento do SUR” para diversas cidades do mundo. Assim como, trazer para o SUL o pensamento daqueles que entendem que não deveríamos seguir a cartografia oficial e sim estar atentos às questões que estão em jogo no planeta como um todo. O meio ambiente, as questões migratórias, as questões de gênero.

Assim, sob o guarda-chuva de temas como Sexo, Trânsitos e Migração, Arte e Espaço Público, Formas de Ver, Memórias e Esquecimentos, Arte e Ciência/Arte e Natureza, o a bienal gerencia um mix de soluções expositivas. Busca parceiros nacionais e internacionais que se interessem por albergar o projeto, mostra grandes coleções e em outros casos comissiona projetos de artistas escolhidos.

Nesta edição, além das instalações em espaços públicos, vários dos projetos desenvolvidos na parceria com museus de Buenos Aires, muitos deles clássicos e modernos, criam situações de atemporalidade muito interessantes.

Sem lugar à dúvida um dos pontos altos desta segunda edição é a presença do artista italiano, criador da Arte Póvera, Michelangelo Pistoletto que, com 86 anos, continua trabalhando ativamente e defendendo que “a arte só faz sentido quando faz pensar e quando faz refletir sobre a liberdade como responsabilidade comum”. A vinda dele para a Bienal foi mediada pelo curador brasileiro Marcelo Dantas, que já apresentou o artista em Brasília e Belo Horizonte.

Seus projetos estão organizados no Circuito Pistoletto, uma sequência de intervenções no Museo de Arte Decorativo, no Museo de Bellas Artes e no Museo Benito Quinquela Martín. Neste último junto a uma instalação no Rio de la Plata, onde um símbolo do infinito, formado por mais de 3 mil garrafas de plástico, pintadas pelos alunos das escolas do distrito de La Boca, trazem a ideia da importância de cuidar da natureza e lutar contra a degradação do ambiente. O projeto foi um processo de trabalho colaborativo com o Ministério da Educação-Gestión Cultural, alunos de escolas e a ACUMAR-Autoridad de Cuenca Matanza Riachuelo, encarregada de cuidar da limpeza e condições do Rio.

Certamente mobilizar vários setores públicos cria nestes casos a possibilidade de tornar a arte um lugar de conexão e reflexão social.

Autor de grafites espalhados pelo mundo, Nunca expõe na Galeria Kogan Amaro

Obra de Nunca que está na exposição. FOTO: Divulgação

Um dos mais celebrados nomes do grafite – ou street art – do Brasil, o paulistano Francisco Rodrigues da Silva, conhecido pelo pseudônimo Nunca, apresenta sua primeira exposição individual no país, na Galeria Kogan Amaro. Nunca, que tem obras espalhadas por paredes e muros em diversas cidades do mundo, reúne na mostra pinturas que fazem alusão à litogravura e revelam suas referências multiculturais.

Com curadoria de Ana Carolina Ralston, Meide in Brazil trata de temas caros aos brasileiros nos dias atuais, como explica o artista. “Faço da minha arte uma forma de questionar o que nós, como povo, estamos criando e cultivando culturalmente, do que é legitimamente brasileiro e do que é verdade ou mentira do ponto de vista histórico da nossa nação”, afirma Nunca em texto de apresentação da mostra.

A mostra problematiza, portanto, a desvalorização da cultura brasileira e a “ideologia de consumo”, situando como protagonistas das obras personagens excluídos pela sociedade. Entre eles, destacadamente os indígenas, que Nunca já retratou em 2008, na fachada da Tate Modern, em Londres, e, neste ano, nas paredes externas do novo Museu de Arte do Condado de Los Angeles, o LACMA, ainda em construção.

Nunca Meide in Brazil
Galeria Kogan Amaro Alameda Franca, 1054 – Jardim Paulista, São Paulo
De 29 de junho a 27 de julho

Ataque especulativo ou a gambiarra versus o tosco brasileiro

Cao Guimarães, 2019

*Por Sabrina Sedlmayer (UFMG)

Num ensaio publicado recentemente [1], o psicanalista Christian Dunker realiza uma espécie de genealogia do “tosco brasileiro” na Filosofia e nas Artes, com aguda percepção e análise do presente. Entre outras proposições, localiza as raízes do termo numa determinada elite que desdenha a arte e a educação, abomina a ambivalência, o dialogismo, a ironia, qualquer coisa que embarace a rápida apreensão da “finalidade” do objeto estético. A arte, para os toscos, deve ter utilidade, além de função pedagógica. Atrelada às dicotomias (direita x esquerda; bom x mau; comunista x capitalista…), a sensibilidade tosca exagera no uso dos clichês, das caricaturas, das imprecisões e falsas estatísticas, embalada por um discurso ressentido, prenhe de agressividade e inveja. Seriam eles descendentes da antiga aristocracia, desconfia Dunker, e voltam espectralmente à cena contemporânea num tipo de atavismo ou retorno do recalcado. Esses coronéis escravocratas do contemporâneo se amparariam no discurso realista socialista, em símbolos nacionais como a bandeira e o verde amarelo e, esquizofrenicamente, adicionariam uma pitada pornô às lufadas paranoicas, tudo misturado com um cristianismo destituído de hermenêutica. Podemos, aqui, relembrar  as falas de Damares sobre os filmes e desenhos infantis, as postagens no twitter de Bolsonaro sobre o Golden shower, o discurso errático homofóbico de Olavo Carvalho… enfim, uma enxurrada de exemplos que provavelmente, agora, à medida que escrevo este texto, outros tantos devem estar sendo publicados pelos autores que contingencialmente regem o Brasil.

Se todos os argumentos construídos e citados acima têm embasamento reflexivo e são pertinentes ao tempo presente, por que responder ao texto do Dunker em posição de discordância? Talvez porque o psicanalista erra grosseiramente ao apostar que “o método fundamental do Tosco Brasileiro” é a gambiarra, termo que originalmente refere-se à extensão irregular de uma linha de iluminação ou de uma “ligação fraudulenta”, que é de toda forma precária e feia, improvisada ou feita conforme as circunstâncias, ao estilo arquetípico “jeitinho brasileiro“. (Dunker, 2019, p.2)

Se a etimologia está, em parte,  correta, a tese é falsa. Tentarei apontar, a seguir, como nas experimentações da arte, da música e da literatura, a gambiarra é, também, um dispositivo criativo potente, com incidência na história na arte contemporânea brasileira,  extrapolando o período (ironicamente) elencado pelo autor.[2]

As características da gambiarra transcendem o território nacional brasileiro e, bem antes do impeachment do Governo da Dilma (2016), são exemplos de improvisações no campo do fazer e do pensar artístico. A gambiarra está presente em muitos gestos de criação de linguagem, verbal ou imagética, e roça certo patrimônio vivencial, certos arranjos nos quais a escassez de recursos é operacionalizada e a sobrevivência é alçada via invenção do cotidiano. A hipótese que se lança é que há potentes gestos – práticas, táticas, políticas – que se alicerçam justamente na escassez de produtos, de recursos e/ou serviços. Nesse paradoxo, na transformação do negativo em positivo, percebe-se uma potência singular na qual a falta é transformada.

Dividirei, assim, a minha leitura sobre o assunto em quatro tópicos: arqueologia, arte, música e literatura, como forma de explanar como a expressão pode ser pensada tanto em termos conceituais, ao ser capaz de operacionalizar um curioso encontro interdisciplinar que vai muito além das noções de uso, de obediência tecnológica e das soluções improvisadas do cotidiano e,  distintamente o que reforça Dunker, a gambiarra não se assemelharia à corrupção recalcada que retorna, com força, no discurso do tosco brasileiro.

Cao Guimarães, 2019. FOTO: Divulgação

1. Algaravias

Segundo o Dicionário Houaiss da língua portuguesa (2009), a etimologia de “gambiarra” possui uma origem “obscura e duvidosa”, e poderá ter relação com “gâmbias”, pernas espertas, prontas para correr, tal como as de um camelô, que oferece produtos ilegalmente e que deve fechar a mesa de exposição dos produtos ofertados, geralmente na rua, e sair correndo quando surge a fiscalização ou a polícia. De acordo com outros autores, o vocábulo tupi-guarani gambiarã designa acampamento provisório em território desconhecido e teria a ver com “gambiarra”.

Utiliza-se o termo corriqueiramente no Brasil com o significado de “dar um jeito”, ou seja, consertar, reparar, adequar, remendar, adaptar, encaixar e, principalmente, improvisar. Práticas várias que servem para solucionar um problema numa determinada emergência. Por RTU, sigla muitas vezes utilizada jocosamente, entende-se “recurso técnico de urgência” e é um dos sinônimos da gambiarra. O termo é tão popular e utilizado cotidianamente que possui apelidos variados: gambis, gambota, gambi… E, com a mesma lufada de humor, diz-se que o inventor da gambiarra é o Jean Baptiste Gambierre, o equivalente na língua inglesa a MacGyver e o Macgyverism, percebendo, nessa troça, como o procedimento surge emparelhado ao truque, ao jeito, à curiosidade e à esperteza.

Para Rodrigo Boufleur (2013), além de ser o ato de improvisar soluções materiais com propósitos utilitários, ocorre uma gambiarra quando uma mercadoria passa a ser utilizada por aquele que a consome subvertendo o design industrial original do produto. O arquiteto argumenta que a gambiarra é sempre derivada de artefatos industrializados, precisamente quando há transferência do “domínio de projeto” para o “domínio de uso” e modificações na forma, função, materiais e significados são operacionalizados. Em sua chave interpretativa, seria uma intervenção espontânea no design ou desenho industrial. A gambiarra, para ele, não seria criadora de nada, partiria de objetos existentes e improvisaria soluções à maneira de um reajuste utilitário, conseguindo, muitas vezes, quebrar o desígnio do objeto, desmontar seu aspecto designante, deixando exposta a falibilidade do design.

Como uma prática que vai no sentido contrário da intenção produtiva, o termo se expandiu, desapegou das ações cotidianas e avançou em outros domínios: artistas, críticos e intelectuais tomam-no muitas vezes em um sentido diverso e até mesmo contraditório da definição de Boufleur. Ações artísticas resistentes à lógica da produtividade e com iluminada criatividade plasmam formatos e questionam a utilidade da obra de arte.

A aposta contida neste texto é que há gesto de invenção em qualquer confim: nas artes, na música, na literatura e nos anônimos inventores da vida cotidiana. Se a poesia moderna de Baudelaire é indissociável da eletricidade, segundo a visão de Walter Benjamin, não é gratuito que a palavra gambiarra tenha surgido concomitantemente à iluminação elétrica, como também não é fortuito que a favela apareça concomitantemente à urbanização das cidades. O “gato” surge exatamente no momento em que a eletricidade vira mecanismo de exceção econômica e social. Disso Carolina Maria de Jesus, em Quarto de despejo, o diário de uma favelada, já disse com mais contundência:

23 de maio de 1955: Levantei de manhã triste porque estava chovendo. (…) o barraco está numa desordem horrível. É que eu não tenho sabão para lavar louças. Digo louça por hábito. Mas é as latas. (JESUS, 2014, P.42)
9 de agosto de 1955:  Deixei o leito furiosa. Com vontade de quebrar e destruir tudo. Porque eu tinha só feijão e sal. E amanhã é domingo
… Fui na sapataria retirar papeis. Um sapateiro perguntou-me se o meu livro é comunista. Respondi que é realista. Ele disse-me que não é aconselhável escrever a realidade (JESUS, 2014, p. 108).

“Filtros”, 1999, Marepe. FOTO: Divulgação

2. Nomadismos

Se “gambiarra” alude a práticas de improviso diante da falta de técnica e/ou capital econômico, no início do século XXI, principalmente em suas primeiras décadas, a expressão se tornou frequente no campo da literatura e das artes. Parte da crítica, como Lisette Lagnado ([S.d.]), defende que “gambiarra” não deve estar calcada na noção de precariedade ou de acaso, mas associada ao exercício do pensamento, à interrogação a respeito de formas de sobrevivência. Na esteira de Cildo Meireles, a crítica categoriza que se deveria entender por gambiarra algo ligado ao território; um tipo de discurso com acento político, além do estético; algo que não persegue a “pouquidão”, mas sim a “oposição”. Em outros termos, o contexto seria determinante, mas “gambiarra”, como operador conceitual, envolveria transgressão, fraude, tunga, aquilo que tentei recuperar com a etimologia da palavra: saber usar as gâmbias, as pernas para correr, certa astúcia para empreender uma espécie de jogo ambíguo, que não descambasse tão facilmente para o exotismo, nem tampouco o localismo. Percebe-se na fala de Lagnado a preocupação com a estetização (fácil) do precário.

Outra leitura importante, ligada aos Estudos Culturais, é a de Moacir dos Anjos (2007).  Dois pontos cruciais são sublinhados por esse autor: primeiro, que “gambiarra” designaria tanto o ato de construção quanto os aparatos criados, tanto a operação quanto o resultado, tanto o produto quanto seus meios; segundo, a Antropofagia e a tradição experimental da arte nacional seriam vetores importantes para recuperar e entender, dentro dessa discussão, o contemporâneo, as gerações de artistas que se constituem a partir das décadas de 1990 e 2000.

Um acento brasileiro foi recuperado nesses gestos e uma espécie de política (no sentido de procedimento) foi localizada em trabalhos de determinados artistas contemporâneos – Rivane Neuenschwander, Cabelo, Jarbas Lopes, Efrain de Almeida, Alexandre da Cunha, Marepe, Cao Guimarães, O Grivo – que experimentam e arejam a expressão almejando novo arranjo conceitual, que não é oriundo de um saber espontâneo, mas que exige pensamento, criação e reflexão.

Lagnado adverte como há traço do parangolé, de Hélio Oiticica, no elenco de obras desses artistas junto ao questionamento acerca da rede de subsistência dos brasileiros. Percebe-se, na citação, como a gambiarra tem que “administrar três objetos num território para apenas dois”, frase de Cildo Meireles e citada por Lagnado. Já Cao Guimarães convida-nos ao alargamento conceitual do termo “gambiarra” ao aproximá-lo, ontologicamente, das noções de sobrevivência e de formas de vida. Numa entrevista sobre o tema, esclarece:

O meu conceito de gambiarra é algo em constante ampliação e mutação. Ele deixa de ser apenas um objeto ou engenhoca perceptível na realidade e se amplia em outras formas e manifestações como gestos, ações, costumes, pensamentos, culminando na própria ideia de existência. A existência enquanto uma grande gambiarra, onde não cabe a bula, o manual de instrução, o mapa ou o guia. A gambiarra enquanto “phania” ou expressão, uma manifestação do estar no mundo. A gambiarra é quase sempre um “original” e não uma cópia, uma reprodução. E por isso é uma entidade viva, em constante mutação. Registrá-la é torná-la reproduzível, multiplicá-la modificando sua função fundamental (GUIMARÃES, 2009).[3]

O artista pontua como a gambiarra não necessariamente deve ser relacionada somente às soluções improvisadas do cotidiano, e pode ser entendida como uma reserva infinita de manifestações que estão soltas, desencadernadas, nômades, na existência. Seu livro intitulado Gambiarra, com dezenas de fotos que encontrou e que reconheceu como gambiarras, nos remete ao object trouvé e a outras intervenções das Vanguardas. Ready-made, collage, bricolage dialogam, assim, com essa cena que não estabelece fronteiras entre a arte e a vida, entremeada por uma perspectiva político-estética.

Sobre esse ponto, vale lembrar que para Lévi-Strauss (1989) o bricolage é uma forma “primitiva”, um movimento incidental, uma execução sem normas e técnicas, sem os meios científicos tradicionais, sempre acionado como o que se tem: “Isto pode servir”, “isto pode dar certo”, “isto irá quebrar o galho”, ou seja, é a instrumentalidade que move o gesto do bricoleur.

Levando em consideração o que foi desenvolvido até o momento, talvez possamos acrescentar que a gambiarra responde a essas falhas de forma diversa às empregadas pelo colecionador e pelo fetichista. Com meios artesanais, conserta, remenda, cria. Seu lado prático, de jogada, de arranjo, não transforma mercadorias em lixo. À pergunta realizada por Agamben (2007) “O que a mercadoria propõe à obra de arte?”, o fio argumentativo seguido por ele (como o gesto revolucionário de Baudelaire, de levar às últimas consequências a fetichização da mercadoria e a mercadorização absoluta da obra de arte e provocar a experiência do choc, do estranhamento) receberia aqui, no terreno dessa discussão, a formulação de uma possibilidade de vida permeada pela falta (ou pelo nome da fome, na vida da Carolina de Jesus).

Obra da série “Notícias da América”, 2012, de Paulo Nazareth. FOTO: Divulgação.

3. Câmara de ecos

Por “gambioluteria”, o pesquisador Giuliano Lamberti Obici (2014) entende a união entre determinada música experimental com o modus operandi da gambiarra. Para demonstrar tal tese, realiza uma potente arqueologia do termo e recupera um número vasto de movimentos que também lidaram/lidam de forma diferenciada com os instrumentos/objetos, a saber: circuit bending, hardware hacking, cracked media, sound art/media art, arte povera, ready-made, object trouvé, Merz, dadá, recicling, cyberpunk, pós-punk, e ainda perspectivas mais teóricas, como software studies e media archaeology, para citar alguns. Para ele, a gambiarra não é um fenômeno exclusivamente brasileiro, e deve-se relativizar a leitura que a encarcera somente como um traço da identidade local. Sua análise joga luz em um repertório de compositores, músicos, grupos e artistas existentes que compartilham práticas sonoras afinadas com o procedimento da gambiarra, ou seja, compartilham uma maneira peculiar de lidar com os materiais, seja através de práticas de luteria, a criação de novos instrumentos ou de novos designs musicais: Walter Smetak, Marco Antônio Guimarães (UAKTI), Wilson Sukorski, Marco Scarassatti, Tato Taborda, Chelpa Ferro, Paulo Nenflidio, n-1, Panetone, Tony da Gatorra, e O Grivo.

Obici dá exemplo de Cuba, para demonstrar a não exclusividade brasileira dos imprevistos diante da pobreza e da miséria, e como a palavra rikimbili possui vários significados lá. Entre eles, refere-se a uma bicicleta feita com motor artesanal de bomba d’água, criada pelos moradores da ilha durante o longo embargo imposto ao país, que Ernesto Oroza denomina como “arquitetura da necessidade” e “tecnologia desobediente”.

No México também a palavra rasquache, derivada do nahuatl, foi transformada em movimento estético. O uso pejorativo, pobre, vulgar e inferior passou a ser relacionado a espontaneidade e irreverência.

“Chove, chuva”, Rivane Neunschwander

4. Em ponto ou uma linha, terá vida

“Em Londres é assim: os aquecedores devolvem calor a troco das moedas que recebem. Em pleno inverno alguns exilados latino-americanos britavam de frio, sem nenhuma moeda para fazer a calefação do seu quarto.
Estavam com os olhos grudados no aquecedor, sem piscar. Pareciam devotos perante o totem, em atitude de adoração; mas eram uns pobres náufragos meditando sobre a maneira de acabar com o Império Britânico. Se pusessem moedas de lata ou de papelão, o aquecedor funcionaria, mas o arrecadador encontraria as provas da infâmia.
O que fazer? Se perguntavam os exilados. O frio os fazia tremer como se estivessem com malária. E nisso, um deles lançou um grito selvagem, que sacudiu os alicerces da civilização ocidental. E assim nasceu a moeda de gelo, inventada por um pobre homem gelado.
Imediatamente puseram mãos à obra. Fizeram moldes de cera, que reproduziam perfeitamente as moedas britânicas; depois encheram os moldes de água e os meteram no congelador.
As moedas de gelo não deixavam pistas porque o calor as evaporava.
E assim aquele apartamento de Londres converteu-se numa praia do mar de Caribe.” (Galeano, 2011, p.181)

O título desse conto, do jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano, se intitula “O crime perfeito”. Como se constata pela leitura, há fraude e contravenção nos atos dos exilados latino-americanos; mas como não considerar também o gesto da invenção? Tal improvisação, uma gambiarra, tanto no método quanto no resultado, parecem redimensionar a contingência. Como em Odradek,  a enigmática parábola de Kafka, Galeano mostra a exclusão dos pobres exilados gelados. Em Kafka, não sabemos se o personagem é humano ou um carretel de linhas emboladas. O narrador kafkiano também inicia (como eu, como Dunker) a história pela etimologia do nome Odradek e a medida em que começa a descrevê-lo, no entanto, a máscara cai e percebemos que esse resto, farrapo, coisa, troço, treco, traquitana é capaz de suscitar medo porque talvez sobreviva muito mais tempo do que o humano “pai de família” que  narra e se preocupa, prioritariamente, com o bem-estar da existência dos seus descendentes.

Elvira Vigna, no incrível livro publicado em 2018, Kafkianas, relê vários contos do Kafka, reinventa-os, interpreta-os e,  como espécie de tradutora, verte de um lugar para outro (ou melhor, para outros), deslizando sentidos, amputando passagens inteiras das conhecidas narrativas. Especificamente em Die Sorge des Hausvaters, ela lê Odradek como sendo filho desse pai que o trata como “coiso, troço, lixinho”. No desenho que antecede a sua versão do conto de Kafka, vemos que Odradek está trancado em seu quarto, escondido, sofrendo. Só no final descobrimos que poderia também ser chamado de Vicente: “Alguns Odradeks ficam famosos. Van Gogh. Tratado como lixo, nunca morreu”.  (Vigna, 2018, p.56)

Poderíamos recuperar outros Odradeks que tiveram uma vida-gambiarra, obra-gambiarra, estúdio-gambiarra, materiais-gambiarra, além do próprio Kafka e do Vincent. Bispo do Rosário é um deles. Também Reverón e toda a sua casa em Macuto personificam a gambiarra. Fez toda sua obra com o pouco que tinha em mãos: papelão, resto de parafusos, fio,  arame,  mola, panela de lata, algodão, óculos, tampas de garrafas, papel de cigarro brilhante, farrapos, pedaços de perucas, tecidos, cascas, folhas secas, um pedaço de madeira, páginas em branco, tinta, óleo, giz, cascas de coco, sementes, terra novamente e areia; fios, fósforos, molas…, como enumera Balza (1983, p.41)

Tal artista, que hoje personifica o imaginário nacional da Venezuela, vem de chofre contra a tese de Dunker de que o método do tosco se opera pela gambiarra. Talvez o psicanalista ficou “destinado a ver o iluminado, não a luz”, como diz o famoso verso do Goethe. Porque a luz, aquela do gato ou de outras criações do improviso, tem potente luminosidade. E é um instigante modus operandi que faz com que este presente não se quede tão escuro.

Arthur Bispo do Rosário. FOTO: Divulgação

Bibliografia

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ANJOS, Moacir dos. Contraditório. In: Panorama da Arte Brasileira 2007. Curadoria de Moacir dos Anjos. São Paulo: Museu de Arte Moderna de São Paulo, 2007.

BALZA, José. “Análogo Simultâneo (sobre los objetos de Armando Reverón)”.Análogo Simultáneo. Caracas: Galeria de Arte Nacional, 1983.

BOUFLEUR, Rodrigo Naumann. Fundamentos da gambiarra: a improvisação utilitária contemporânea e seu contexto socieconômico. 2013. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. Inédita.

DUNKER, Christian. Ensaio sobre o tosco brasileiro na Filosofia e nas Artes. ArteBrasileiros, maio de 2019.

GALEANO, Eduardo. O livro dos abraços. Trad. Eric Nepomuceno. Porto Alegre: L&PM, 2011.

GUIMARÃES, Cao. Gambiarras. 2009. Série fotográfica (work in progress). 127 fotografias. Dimensões variadas.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro;  MELLO FRANCO, Francisco Manoel de. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo, diário de uma favelada. 10. ed. São Paulo: Ática. 2014.

KAFKA, Franz. “A preocupação do Pai de Família”. Um médico rural. Tradução de Modesto Carone. São Paulo: 1990.

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OBICI, Giuliano Lamberti. Gambiarra e experimentalismo sonoro. 2014. Tese (Doutorado em Música) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.

OROZA, Ernesto. Desobediencia tecnológica de la revolución al revolico. [S.d.]. Disponível em: <http://www.ernestooroza.com/desobediencia-tecnologica-de-la-revolucion-al revolico>. Acesso em: 14 fev. 2018.

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[1] https://artebrasileiros.com.br/opiniao/carteiro-do-inconsciente/ensaio-sobre-o-tosco-brasileiro-na-filosofia-e-nas-artes/

[2] “É possível que daqui a dez ou quinze anos os historiadores da arte venham a caracterizar este período, entre 2016 a 2022, como o apogeu do Tosco Brasileiro.” (Dunker, 2019, p.1).

[3] No curso de Doutorado que ministro neste semestre na UFMG, “Exemplos do precário, formas do provisório: literatura e cultura no Brasil”, este excerto da entrevista de Cao Guimarães esteve presente em quase todos os trabalhos apresentados, numa turma com mais de vinte alunos. Tal ritornello talvez tenha a ver muito mais com a identificação da gambiarra como estratégia da sobrevivência de qualquer um sujeito do que comodidade dos envolvidos com a matéria em questão.

Instituto José Resende abre as portas no interior de SP

Escultura de José Resende. FOTO: Cesar Fernandes

Dedicado a expor a obra do artista e escultor José Resende, foi inaugurado na pequena cidade de São José do Barreiro – situada entre São Paulo e Rio de Janeiro – o Instituto José Resende. Com amplos espaços em meio à paisagem rural, o IJR apresenta na mostra inaugural, curada por Ronaldo Brito, um recorte de obras produzidas desde os anos 1960 até os dias de hoje.

“O Instituto se destina a cumprir duas tarefas básicas: expor as esculturas do artista de maneira íntegra, atendendo à sua lógica poética intrínseca, e atuar como polo emissor da obra no mundo”, diz o texto de apresentação do instituto – que possui 1.200 m2 divididos em uma área interna e outra externa. A ideia é que diferentes curadores sejam convidados para montar novas exposições a cada quatro ou cinco meses.

A vasta produção de Resende, criada com uma diversidade de materiais como aço, palha, pedras, tubos de cobre, vergalhões, lâminas de chumbo, couro, vidro e parafina, “agora dispõe de uma área inédita, generosa, para liberar suas manobras desenvoltas”, segundo texto do instituto. O espaço, que não contou com patrocínio público ou de empresas privadas para ser criado, é o resultado de um projeto concebido por Resende e pelo marchand Paulo Fernandes, que há décadas representa o artista.

Resende, que estudou gravura e formou-se em arquitetura, é conhecido por ter criado, ao lado de outros artistas, o Grupo Rex, em 1966, e por ter participado da fundação do Centro de Experimentação Artística Escola Brasil, em 1970. A partir daí o artista participou de diversas exposições – individuais e coletivas – ao longo das décadas e se tornou um dos grandes nomes da escultura contemporânea brasileira.

O espaço cultural abre aos sábados e domingos e recebe visitas em dias de semana com hora marcada. Veja as informações detalhadas no site www.ijr.art.br

Instituto José Resende
Rodovia dos Tropeiros km 260, no 171, São José do Barreiro, SP
Exposição de abertura: de 19 de maio a 18 de agosto

The challenge of the possible makes 13ª Havana Biennial breathes

David Magna, T3c36, 2019. acrílico colorido.
David Magna, T3c36, 2019. acrílico colorido

“FISH DOES NOT SURVIVE IN CLEAN WATERS”.  Mao Tse Tung’s maxim resembles the turbulent sailing of the Havana Biennial over 30 years, with financial and bureaucratic difficulties but not enough to wreck it.  The theme of the 13th edition, The Challenge of the Possible synthesizes the struggle that touches the imaginary and tries to face the impossible.  The event continues in the search of greater correspondences between the creation and the practices of life, or to converging points.  With a year of delay due to Hurricane Irma, the show coincides with the celebrations of the 500th anniversary of the founding of Havana and the almost 30th Biennial.  What is the transcendence of the island’s greatest cultural event?  There have been many overlapping mediations at the Havana Biennial since its founding in 1984: local architecture, historical burden, local financial crisis and that of the participating countries, mixed ideological frictions, criticism inside and outside Cuba, the fate of voracious gallerists and collectors  who come to the Island looking for quality art at prices well below the international market.  If compared to the previous editions the 13th Biennial is not among the best. 

The same happens to the last biennials of São Paulo, Venice and Documenta of Kassel.  In Havana, the curatorship is signed by seven Cuban curators led by critic and intellectual Nelson Herrera Ysla, in addition to the 21 invited foreigners.

Manaf Halbouni, Uprooted
Manaf Halbouni, Uprooted, 2014. Carroceria de automóvel, livros e outros objetos

The moment is for reflection, transition, discomfort and change, with some curators taking up positions in other cultural institutions or simply setting out on a solo career.  Biennials make history by unraveling previous accomplishments and meanings.  But what singularities can still provoke surprises amid the excessive accumulation of biennials, fairs, festivals, residences?  The works distributed throughout Havana, in addition to Matanzas, Sancti Spiritus, Cienfuegos and Camagüey are flattened by the international moment.

At the Bienal’s headquarters, Alexia Miranda’s Collective Fabric performance polarizes the attention and occupies the lobby of the Wifredo Lam Center. With the idea of ​​responding to the present, with possible notions of future, alert to the urgency of social transformations.  Collectively tran- scribed circles, in various patterns and rhythms, are tools in an attempt to restore moments of peace in violent El Salvador.  The gentrification of the great metropolis arrived in Dresden, a German city where Manaf Halbouni, a Syrian artist, lives 34 years. As his dream of living in a house never materialized, he turns the car into a residence-studio, “where I solve everything”, exhibited at the Havana Biennial as art.

The country is also on the agenda of Lais Myrrha with Cronografia dos Desmanches, a work in progress that has been developing since 2012. “The work comes when I see the boom in real estate speculation as I walk through the streets and find five houses destroyed  once “.  They are images of demolitions, abandoned sites, busts, ports, some unidentified. “

The Biennial of Havana bets on the young artists.  In this context is Ruy Cézar Campos, from Ceará who works different temporalities in three videos: Circunvizinhas, The Arrival of Monet and Tangled Terminals.  All members of the series Rede Vem do Mar, one year research between Brazil, Angola and Colombia.  “I try to establish a phenomenological link between the infra-structure of submarine cables and the platforms for landing them.  Fortaleza is the most important city in the South Atlantic network with which it is connected, Sangano, in Angola and Barranquila, in Colombia”.  Operating between technology and aesthetics, the artist expresses himself between performance, documentary and fiction, with social political bias.

Haver, Sem Horizonte
Haver, Sem Horizonte, 2019. Chapas de alumínio

In Matanzas, the new territory of the Biennial, Marilá Dardot asserts the utopia of the dilution of art in daily life.  “My job is a segment of the residency that I did in Mexico in 2015, at the time of the episode of the missing students.  He picked newspaper headlines and daily intervened with writings executed with water on a concrete wall.  As he wrote them, they went out. “  In Matanzas, he opted for the performance Volver, in which he repeatedly writes with water the phrase “La esperanza” I return to a wall in the street.  Marilá’s work has changed in recent years, “from an optimistic vision linked to literature, poetry, fiction and nature, to a more pessimistic view of Brazilian political facts.  “There was a political awakening in my generation, as well as in myself.”  Finally, three Cuban artists with established careers and identifiable poetics, gathered in the Interior Museums show, at the National Museum of Fine Arts.  Kcho (Alexys Leyva Machado), Carlos Garaicoa and Los Carpinteros.  Kcho’s international flight begins with Regata, a 1993 installment, made at age 23, a year before joining the collection of the Reina Sofia Museum in Madrid, MoMa and the cast of the Barbara Gladstone gallery in New York.  Barco, symbol of the collective imagination of Cubans, appears in gestures, sculptures or installations with objects that are nourished by various poetics.  As the geographer Milton Santos said, street art, naturally urban and public, carries a heavy political burden for occupying spaces outside the institutionalized fields of art and for touching the social realities closely.  Score, installation of Carlos Garaicoa, developed for ten years, synthesizes this thought.  The work has the participation of 70 musicians of street, of Madrid and Bilbao.  It is an orchestra with 35 videos of street musicians performing different pieces.  The final score, by Cuban musician Esteban Puela, fuses the varied sonorities and is transmitted to the large digital screen that assumes the direction of the orchestra.  Los Carpinteros, in one of his last acts as a duo, places in the Alacenas, in 2016, criticism about the devastation of the storms that invade the Caribbean.  The sounds emitted by the hurricanes are recorded, reproduced and placed in old kitchen cabinets that emit the terrifying noise of the phenomenon.

These artists form a logical and consensual core, but it is worth remembering that there are at least two dozen others, equally professionally respected, gravitating towards international shows.

Visual arts get inside FLIP

Laura Vinci
Laura Vinci, No Ar, exposta no Mube em 2017, será adaptada para a Flip deste ano - foto Nelson Kon/ Divulgação

THE TRADITIONAL International Paraty Literary Festival in the state of Rio de Janeiro, which this year takes place between July 10 and 14, has never stopped reinventing itself and exploring novelties to compose its structures.  This will be the 17th edition of the event and curated by the journalist and editor Fernanda Diamant, one of the creators of the magazine Quatro Cinco Um, specialized in literature.  The honoree of the time is Rio de Janeiro writer and journalist Euclides da Cunha (1866-1909), author of the acclaimed book Os Sertões, considered by many a work that initiates literary journalism in the country, long before the term exists.

Among the transitions and news, Flip’s organization, which has Mauro Munhoz’s general direction, has announced a desire to encourage the development of activities related to the visual arts in the itinerary of the event, in addition to what happens spontaneously through the city.  This is how the Terra Nova project was presented, a visual arts module that intends to carry out interventions that integrate Paraty in a way: “From the beginning, Flip has the intersection between the arts in their DNA.  Year after year, we were building an approximation between different artistic experiences, including the visual arts.  Now we feel the need to make this relationship manifest in a more visible way.  Terra Nova is an artistic device to illuminate issues that permeate the territory of the city, its residents and its visitors.  One of Flip’s missions is to investigate how art can help to qualify people’s look at human relations produced in public spaces, and Newfoundland will propose mechanisms of perception of this territory and its complexities through art”, Mauro said to ARTE!Brasileiros.

The project was launched in early June during an event at Casa do Parque, in São Paulo, where the patron program specially developed for this initiative was presented.  The patronage plan is aimed at individuals and is the main and exclusive way to make this idea viable.  Those who wish to contribute to the project will have some benefits such as tickets, preferential access to Flip’s main programming that takes place in the Matriz Auditorium, invitations to other events held by the organization of the fair and exclusive works of Laura Vinci, artist confirmed to participate in the first  intervention of Terra Nova.

Invited by the curator, Vinci will present its On Air installation, last presented in 2017, at MuBE, in São Paulo, and has already passed through several places, including some countries in Europe.  Other interventions are still being discussed for budgetary feasibility issues, and even so the presentation of the employers’ program was crucial to that everything began to be established.  The choice of No Air to integrate the debut of the project was discussed between the artist and the curator: “It’s a job that has this characteristic to adapt a lot, it reinvents itself in place.  It is a work that is mist, it is just steam.  So it sticks easy to the spatial situation.  It has works that require specific spatiality and the No Air does not, it only needs water”, says the artist.  The fluidity of the vapor in Laura’s work allows the public to discover different forms in the variations that the smoke creates in the space, besides the characteristic of the work itself transforming the place where it is.

About the interdisciplinarity that permeates Flip and the proposal to insert the arts more punctually, Laura has no doubt that the country is experiencing a time when collaboration between the areas is something necessary: ​​”This is a very important thing for us  , expand that and fortify those relationships”, she says.  For her, there are some areas that link more punctually and strongly with literature, such as cinema.  “In the visual arts this is not so clear, but I think we can start to find these encounters”, Laura commenta, citing as an example of this confluence her work, Machine of the World, which focuses on a poem by Carlos Drummond de Andrade.

VISUAL ARTS AT THE MATRIZ AUDITORIUM

In Flip’s most disputed schedule, which takes place in an auditorium set up inside Paraty’s main church, the visual arts will also be present in various formats.  On Thursday, July 11, photographer Maureen Bissiliat will be interviewed by Miguel de Castillo and Rita Palmeira at table 6, titled Serra Grande.  The English photographer based in Brazil dedicated herself to the encounter between the word, the image and the geography along its trajectory, known especially for its work with the Xingu peoples.  At table 12, Mata de Corda, the artist Grada Kilomba is questioned by Kalaf Epalanga and Lilia Schwarcz on the questions that surround her book Memórias da Plantação, to be released during the event by the publisher Cobogó.  In it, the artist discusses themes such as race, class, gender and post-colonialism, already present in her work.  Then, at table 13, Ailton Krenak and José Celso Martinez Correa talk about the valorization of culture, fertile lands for art and diversity, mediated by Camila Mota.  The activities take place on July 12, and the next day, tables with Ismail Xavier, Miguel Gomes, Grace Passô, Marina Pessoa and José Miguel Wisnik will also bring the visual arts to the fair in their discussions around cinema, drama,  art and literature.

Whether in the recovery of “a religious memory and the mystical force of Afro-Bahian culture” made by Heraclitus, in the reconstruction of history and in reflection on it “from the record of what is necessary to keep within history and not forget” made by Pagatini or Centurión’s awareness of AIDS in a “personal chronicle of his way to death” Solo sector is bringing countries closer to the continent through common issues.

In the Masters sector, former Repertório, the new curator, Tiago Mesquita, did not seek a thematic or historical axis. The art critic says that the curatorial experience of an event like SP-Arte is still very new for him: “It’s very unusual in relation to other works that I’ve curated”.

Tiago chose to bring to the Masters works produced between the 50s and 80s, because they are works that “we can look at with a certain temporal distance” to understand them and also to understand the production of their respective authors. Carlos Fajardo (Marcelo Guarnieri), Ridyas (Central) and a project by Rubens Gerchman (Surface), among others.

The biggest surprise is perhaps in the Performance sector. Marcos Gallon, who also organizes the VERBO art performance show, chose not to allocate a space only for the works that will be presented. The performances took place in spaces destined to them scattered among the exhibitors. Gallon’s idea is to encourage the galleries to also take their performance artists, so the genre is incorporated as another possible medium of art, not marginalized in a closed corner. Also, according to Gallon, the vast majority of art galleries in the state of São Paulo represent artists who work with performance.

Gallon is also driven by the idea of encouraging collectors to buy performances, make them look at it as something that can be sold through the galleries: “So it’s brought to the trade show’s axis.” For this, SP-Arte will buy one of the works presented and donate to the collection of the São Paulo Pinacoteca. The work will be chosen by the staff of the institution, led by Jochen Volz. The artists Cadu (Vermelho), Cristiano Lenhardt (Fortes D’Aloia & Gabriel), Jorge Soledar (Portas Vilaseca), Maria Noujaim (Jaqueline Martins Gallery) and Jaime Lauriano (Galeria Leme/AD) will be in the sector.

Aproximações: Brief introduction to the Brazilian art of the XX century

Coleção Orandi Momesso
Na parede, Flavio De Carvalho, Viaduto Santa Ifigênia À Noite, 1934, Óleo Sobre Tela Da Coleção Orandi Momesso. Flavio De Carvalho, Retrato Do Pintor Jean Lurçat, 1952, Nanquim Sobre Papel. Na Página Ao Lado, Victor Brecheret, Soror Dolorosa, Escultura De 1920

monteiro Lobato declares his love for Rio de Janeiro by stating that the city, during the creation of the world, was the storehouse of God in an article published in a book (“Luvas!” in Onda Verde, 1920). In the first six days he took all the beauties from his store and deposited them in the various places: fatigued, on the seventh day he rested, leaving the storehouse in the greatest mess with scattered beauties and mixed with all that is the corner of the city.

This was the sensation I had when I visited the rooms with works by the Marcos Amaro Foundation at the Fábrica de Arte Marcos Amaro (FAMA), housed in an old textile factory built in 1903 in Itu, São Paulo: generous spaces with works – some truly exceptional – arranged in a a kind of warehouse requesting a greater order of visibility for the exhibited works or that explains, for example, the reasons why a sculpture attributed to Aleijadinho is in the middle of others produced in the last decades. However, despite this impression of being in an undecided place between being a storage place or an exhibition space, the sensation was of fascination with that concept of art and culture factory still in the process of formulation.

How will the factory behave after the adaptations coming soon? How many workshops will it host, how many auditoriums will it have, what will its final appearance look like? And what about the collection, will that impression of blurring between storage and exhibition rooms continue? An important clue to the development of the collection seems to be evident when one visits the exhibition annexed to the rooms of the collection described here. This is the exhibition “Aproximações – A Brief Introduction to Brazilian Art of the Twentieth Century. With curatorship by Aracy Amaral, the exhibition presents a selection of works from the end of the 19th century until the middle of the last century. Starting with the first version of O descanso da Modelo, 1885, by Almeida Jr., belonging to the Marcos Amaro Foundation. In addition to this painting, other exhibits also belong to the same institution: two Eliseu Visconti, three Portinari and one more work by each of the following artists: Pedro Americo, Castagneto, Lasar Segall, Antonio Gomide, Victor Brecheret, Cicero Dias, Ismael Nery, Di Cavalcanti, Flávio de Carvalho, Guignard and Arcangelo Ianelli.

In spite of the established vision of what would be the “art in Brazil” of that period, there seems to be no doubt that “Aproximações” (that was extended until September 1st) behaves as a link between the aforementioned sculpture attributed to Aleijadinho – half lost in the other exhibition – the great segment of contemporary local art – the fort of the collection. This linkage that the Amaral show explicitly signals to a becoming of the Collection of the Marcos Amaro Foundation, transforming it into a Brazilian art museum, from the passage from the eighteenth to the nineteenth century until the present time.

Even though this narrative about what may have been art in Brazil in recent centuries has been reviewed in recent years, there seems to be no doubt about how important a collection of this size in a city like Itu will be, so that new research can be developed in the sense of – who knows – to reconsider this vision about the Brazilian artistic phenomenon that has become hegemonic. After all, good works are not lacking in the collection. If in its contemporary segment – under the responsibility of Ricardo Resende – stand out works of Tunga, Fábio Miguez and Beto Shwafaty, among others, the modern segment is not behind. After all, there are some works that will certainly remain as paradigms of the art produced in Brazil, whatever the focus given, such as Almeida Jr., Segall and Guignard paintings present.

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After the visit, I was thinking: despite all the problems inherent in an undertaking still in the process of settlement, which gift to Itu is the presence of FAMA! Which gift for the country, in these dark times, is the presence of Marcos Amaro, acting with all the enthusiasm of his youth for the sake of art and culture. He and his collection of public vocation – within a factory that has everything to become a powerhouse of art and knowledge – give rise to the hope that not everything is lost, or being lost, in Brazil.

The inclusive policy by Sesc-SP also holds true for art

Carlito Carvalhosa, Já Estava Assim Quando Cheguei, 2019
Carlito Carvalhosa, Já Estava Assim Quando Cheguei, 2019 - foto Ricardo Ferreira

The opening of SESC new buildings, such as the newly opened space in Guarulhos, not only increases the network of people served, offering the local population a wide range of assistance, sports and cultural services, as it makes possible something unfortunately still scarce in the country: existence of a generous and ample space that gives shelter to the artistic production, so that it is realized in direct contact with a more diversified public and often distant of the traditional circuit of museums, galleries and fairs.

Just enter the new building, which on its first weekend received 24 thousand visitors, makes people realize the importance of art in the overall context of the project. They punctuate the space, subtly or with an undisguised impact, works made especially for the place or selected by hand in the technical reserve of the institution. Signed by a very varied range of artists, the works are authored and diverse, ranging from anonymous craftsmen, such as the authors of ex-votos who compose a panel installed in the lobby, to important names of the contemporary scene. Altogether more than 15 authors, some with several creations (like Leonilson and Sidney Amaral), sign the works.

On the façade of Sesc, still outside, a large sculpture of Sérvulo Esmeraldo welcomes visitors. It is a piece of great simplicity that contrasts with its colossal dimensions, more than ten meters high: two squares, one white and one blue, which partially touch and activate the space around them, like drawings that are strive to acquire a three-dimensional force.

Adriana Varejão, obras da série Tintas De Polvo
Adriana Varejão, obras da série Tintas De Polvo

At the entrance, establishing a fine tuning with the aerated architecture by Renato and Lilian Dal Pian, was installed a monumental sculpture in plaster by Carlito Carvalhosa. With a shape similar to that of the hill of Sugar Loaf in Rio, and hung in the emptiness upside down, with the help of an iron structure and thick tie rods that connect it to the walls of the building, the piece attracts the perplexed glances, who wonder about the permanent and at the same time unstable and precarious character of a heavy and inverted mountain that floats in the air.

Although probably the most striking of the new building, Carvalhosa’s piece, Já estava assim quando cheguei, is not the only great work especially designed for space. In the same hall, occupying a long wall on the second floor of the building, is the panel created by Adriana Varejão. Composed of seven large circles with geometric and organic shapes, mural painting is part of a project already developed by the artist, which investigates the wide range of skin colors of Brazilians, the problematic issue of self-identification in a society marked by a strong , even if disguised, racism.

It is interesting to note that the choices of permanent works for the new space are not intended to reinvent poetics. On the contrary, the proposal enhances the reach of works of art – in large part by the prominence and generosity of space granted to them – without sacrificing their connection with the particular poetics of each of the authors. The grandeur and specificities of a cultural center of wide circulation do not lead to a dropping of the researches of the invited artists. On the contrary, it opens up to them a possibility of making feasible something that, in practice, is almost impossible in our dense and fragmented urban centers. This is the case, for example, of the giant painting Paisagem Desaguando, created by Janaina Tschäpe for the gymnasium and establishing an interesting visual parallel with the contiguous nucleus of the pools. Or the work of Eduardo Frota, composed of two enormous pieces that belong to his already known series of reels, located in the garden. The difference is that in this case it was decided to change the already traditional wood profiles by the steel, more resistant material for a long-term exposure.

It is curious to note how the artist achieves, despite the massive character of iron, a paradoxical aspect of lightness. In addition to the precision with which it is built, with a perfect fit of hundreds of overlapping steel slides, the sculpture is hollow inside, making it possible to see the sky through it and giving some transparency to the brutality of the metal.

Xilo: Body and Landscape

Fabricio Lopes, Estuário, 2008-2009.
Fabricio Lopes, Estuário, 2008-2009.

With works by 33 artists from different generations, the exhibition reveals how the art of recording on wood is part of an already consolidated tradition to reinvent itself, by talking with other forms of artistic expression and proposing a very attentive look at reality and production contemporary art.

Ana Calzavara, série Sobrevoo, 2014
Ana Calzavara, série Sobrevoo, 2014

The choice of Claudio Mubarac as curator gives the group an unusual density in collective exhibitions, especially when marked by a great diversity like this. Artist and teacher, he closely follows this production, functioning as a kind of link between the generation that began to implement the teaching of woodcut in the art schools of the country in the 1950s and 1960s and the engravers who, from the years 1990, continued this work with a strong community character, creating collective workshops and exchanging technical, formal and conceptual data on their productions.

Artists who managed, through exchange and dialogue, to overcome the barriers in the national market to art on paper and, in particular, woodcutting, a technique marked by a strong popular bias.

The reference to nature and the human figure – quite present in the works -, rather than a reference to the academic genres of portraits and landscapes, seeks to emphasize the active and intense relationship established by these new generations with the contemporary scene, defining their own identity for this urban wandering. “These people grew up in a very different political climate, formed in a democratic environment. Walking around the city is a way of giving corporeity to themselves. Do not separate more urban and rural, nature and culture”, summarizes Mubarac.

Detalhe da obra Tropa, 2017, de Luisa Almeida
Detalhe da obra Tropa, 2017, de Luisa Almeida

It is interesting to note how, from this common temporal floor, there is a great spreading of poetics, diverse ways of exploring the relationship with wood (often using the veins as a compositional element) and the creation of rich dialogues with other techniques. The presence of color is striking, as well as the use of large formats. This is the case, for example, of the work of Fabricio Lopez, the first to idealize this panoramic exhibition and who invited Mubarac to take over the curatorship. Lopez displays a wide panel, a landscape that seems invented, with marine and mountainous references, in a seductive game of colors and shapes. The color is also the protagonist of the playful mural A Banda Amarela chega na Etiópia Sagrada, by Eduardo Ver and scores the whole exhibition.

It is Ana Calzavara who seems to approach the woodcut of the painting more intensely, as if it were merging the two languages, abolishing their differences in a series of yellowish landscapes that succeed and complement each other as comics. Sculpture and photography are also part of this process, with dense works such as the overlapping scenes of the rough city with its greyish and massive buildings, made by Fernando Vilela. Or the army created by Luisa Almeida of women combatants, armed, who organize themselves in the form of totems, ready for the fight. The imagery references found in the works are the most varied. There is an evident dialogue with the artistic tradition and the classic references like Expressionism. The option to display the engraved without framing reinforces this popular, marginal (in the sense of marginalized), fluid, and extremely communicative character of woodcut. And it refers to its use as a revolutionary weapon of communication through lick-licks.

Virtuosísticas (such as Francisco Maringelli and Ernesto Bonato), experimental (Otavio Zani) or collective works (Xiloceasa), the dozens of works assembled until September at Sesc Guarulhos attest to the vigor of contemporary production and the infinite possibilities of simple technique, which explains Mubarac, requires “only a piece of wood and something cutting”, but that is in permanent reinvention.