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ARTISTA LIA D CASTRO
As pinturas, os desenhos e
as fotografias de Lia D Castro
são a síntese de um processo
decolonial em que ela equaciona,
com seus retratados, sexo,
leituras, conversas e reflexões
sobre transfobia e racismo
por eduardo simões
ARTES PRÁTICAS
arte para lia d castro é prática e técnica, ela ressalta,
a todo momento, em sua conversa com a arte!brasi-
leiros. Em suas criações, trabalha com óleo sobre tela,
xilogravura, carvão vegetal, giz pastel seco, caneta e
até esparadrapo. Arte, para Lia, também é processo.
Na exposição A cumplicidade refletida, que a Galeria
Jaqueline Martins apresentou até 18 de março – e que
em breve segue para a sua filial em Bruxelas (Bélgica) – a
artista mostrou pinturas e fotografias feitas ao longo de
sete anos, em programas de sexo pago, com homens
cisgêneros, heterossexuais, pretos e brancos, com
idades de 18 a 25 anos.
Nesses encontros, a artista discutia transfobia e
racismo, a partir da leitura de autores como Angela Davis,
Chinua Achebe, Achille Mbembe, Toni Morrison e Lélia
Gonzalez, entre outros. Transexual, negra, Lia lançou
mão da prostituição como “ferramenta de diálogo”.
“Como mulher transexual, seria muito difícil fazer
um chamamento para entrevistas com esses homens.
Acabei utilizando aquilo que nos é dado de forma com-
pulsória, que é a prostituição”, conta. “Então, de início,
eles chegaram até mim pelo viés da prostituição. Paga-
ram-me o primeiro, o segundo e o terceiro encontros.
A partir do quarto, falei que, ao invés de me pagarem
em dinheiro, eles poderiam me pagar com informação,
para a gente construir uma narrativa decolonial em
que eu questiono como são as relações racistas para
esses jovens”. FOTOS: JOSÉ PELEGRINI
A artista conta que, dos quase 700 homens que
passaram por sua casa, ao longo desses anos, chegou
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