Page 70 - ARTE!Brasileiros #58
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CRÍTICA RAIO-QUE-O-PARTA

                  VISUALIDADE EXUBERANTE


                  EM TOM CRÍTICO





                           Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil, no
                           Sesc 24 de Maio, apresenta quase 650 obras de 200
                           artistas e coloca Semana de 22 no debate decolonial


                           por fabio Cypriano


















                  um Dos mÉritos em torno Das     de reparação, ao trazer para o   comparece com uma tapeçaria
                 Comemorações dos cem anos da     debate da Semana muitos artistas   com motivos florais de 1973. O
                  Semana de Arte Moderna é que a   até então invisibilizados,     artista com nome de personagem
                  efeméride vem ganhando um tom   especialmente os fora do eixo   de Oscar Wilde é uma das
                  crítico em torno do evento. Afinal,   rIo-SP.                   descobertas felizes da mostra.
                  após tanto debate já acumulado     O título em si já aponta para   Com curadoria de Aldrin
                  sobre o protagonismo paulista ao   desconstrução da própria Semana,   Figueiredo, Clarissa Diniz, Divino
                  longo desses cem anos seria     mandando-a para o “raio que o   Sobral, Marcelo Campos, Paula
                  estranho não aproveitar o       parta”, nome dado em Belém do   Ramos e Raphael Fonseca e
                  momento para uma revisão dos    Pará à decoração das fachadas das   consultoria de Fernanda Pitta,
                  significados da Semana e do     casas feitas por cacos de azulejos,   Raio-que-o-parta é organizada em
                  próprio projeto moderno brasileiro.   reunindo tanto padrões abstratos   quatro módulos: Deixa falar;
                  Em um momento de rever          como figurativos. Um vídeo logo na   Centauros iconoclastas; Eu vou
                  narrativas hegemônicas, sem     entrada da mostra, realizado por   reunir, eu vou guarnecer; e
                  dúvida chegou a vez da Semana.  Danielle Fonseca, documenta     Vândalos do apocalipse.
                    Raio-que-o-parta: ficções do   exemplos dessas construções com   O primeiro se dedica a um
                  moderno no Brasil, em cartaz no   testemunhos de moradores que   debate bastante contemporâneo
                  Sesc 24 de Maio, insere-se dentro   usaram tais procedimentos em   que diz respeito à apropriação
                  dessa perspectiva e uma de suas   suas casas. Ou seja, trata-se de   cultural. Ele traz, entre outras
                  marcas centrais é a inclusão de 200  um estilo contra-hegemônico e   obras, uma espécie de colagem
                  artistas de todo país em cerca de   fora do padrão de caráter   em feltro de Regina Gomide Graz
                  650 obras, com um recorte que   vernacular. Apesar desse ótimo   (1897-1973), chamada Índios, da
                  valoriza produções nem tão      começo, não há mais casos para   década de 1930, na qual estão
                  reconhecidas. Nesse sentido, a   esse tipo de processo construtivo   representados indígenas caçando.
                  mostra é menos uma exposição de   alternativo, o que é uma pena.  Procedimento típico do
                  obras primas e mais um imenso      Mesmo assim, não faltam obras   modernismo, essa representação
                  caleidoscópio na produção       surpreendentes, como o potiguar   de culturas “exóticas” ou
                  nacional. Ela é também uma forma   Dorian Gray (1930-2017), que   “selvagens”, como eram


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