Page 104 - ARTE!Brasileiros #56
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CRÍTICA FRESTAS












            POÉTICAS POLÍTICAS






                     Frestas - Trienal de Artes, no Sesc de Sorocaba,
                     que já está sendo chamada de “Sorokassel”, aborda
                     os dramas do mundo contemporâneo de forma lírica

                     por fabio CYpriano








           “apesar De nossas Conversas         Com 53 artistas e coletivos   Mattiuzzi, uma versão sonorizada
            sempre começarem com            selecionados por Beatriz Lemos,   e não literal do livro de mesmo
            amenidades, todas as vezes      Diane Lima e Thiago de Paula Souza,  nome da brasileira radicada no
            o caminho fluía para o assunto   é a primeira vez no Brasil que uma   Canadá Denise Ferreira da Silva,
            pandemia. Estava sendo muito    mostra do tipo bienal tem na direção   organizada no Brasil pela Oficina
            dolorido este momento. No tempo   artística um time negro, um mérito   Imaginação Política e a Casa do
            em que estive com ela, somente   do Sesc que, sem dúvida, merece   Povo e disponível gratuitamente
            na rua onde ela mora, seis amigos   reflexão das outras mostras do   para download.
            dela faleceram por Covid-19.    mesmo tipo como a Bienal de        A grande maioria das obras
            Numa das semanas que estive     São Paulo e a do Mercosul.      da Trienal está disposta no
            navegando pelos rios de mariWÁ,    Prevista para ser inaugurada   subsolo do Sesc e a instalação
            ela foi contaminada pelo vírus,   em 2020, Frestas acabou sendo   de Mattiuzzi é das poucas
            ficamos duas semanas sem se     prorrogada para este ano,       próximas à entrada do edifício, um
            falar. tivE mEdo”, escreveu o   carregando assim os vários      ambiente que parece um espaço
            artista-jaguar, como se         temores do que significa organizar   festivo, todo espelhado e com luz
            autodenomina Denilson Baniwa,   um evento presencial em um país   efusiva, mas que se nutre do texto
            em uma das paredes de sua ampla   que se aproxima de 600 mil    contundente sobre o mundo atual
            instalação Nhíromi.             vítimas de uma política genocida.  e “o que se torna acessível à
               No centro de Nhíromi está uma   Assim, mesmo que de forma    imaginação, o tipo de abertura
            canoa do Rio Negro, a região    discreta, a contextualização    ética que pode ser vislumbrada
            do Amazonas onde nasceu         dá parâmetros aos visitantes    com a dissolução do jugo do
            Baniwa. Seu relato aborda várias   que mostram que Frestas não    Entendimento e a entrega do
            outras questões em torno da visita   é apenas mais uma mostra, mas   Mundo à imaginação”, nas
            à sua avó, mas ao expor o medo   uma exposição concebida em     palavras da própria autora.           FOTOS: MATHEUS JOSÉ MARIA / CORTESIA SESC SOROCABA
            dos tempos da pandemia ele traz   tempos de guerra.                De certa forma, várias obras
            uma importante contextualização    A guerra, é verdade, não ocorre   da mostra participam dessa
            a O rio é uma serpente, nome da   só aqui e muito menos se      espécie de jogo de sugestões que
            terceira edição de Frestas –    restringe aos anos 2020/21, como   se afasta de abordagens explícitas
            Trienal de Artes, organizada    se percebe na instalação A dívida   ou militantes para buscar poéticas
            no Sesc Sorocaba.               impagável, de Musa Michelle     mais sedutoras, mas não por isso

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