Page 20 - ARTE!Brasileiros #54
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ENTREVISTA BENJAMIN SEROUSSI
Benjamin Seroussi, diretor
da equipe da Casa do Povo
seu plano anual vetado para captação via Lei de
Incentivo] é no mínimo curioso. Ao mesmo tempo
que quando a gente estava com uma democracia
funcionando melhor também não dá para dizer
que a área cultural havia deixado de ser precária
- mesmo com os pontos de cultura e outras políti-
cas incríveis. Porque existe sempre esse mote de
“consiga seus recursos, vá atrás de financiamento
privado”. E a gente nunca pede para um físico ser
preocupação maior é realmente 2022. Porque e se popular, por que é que temos que pedir para um
a gente não captar no fim desse ano, como vamos museu ser popular? Sendo que o museu também
fazer? Vamos ter editais? Ao mesmo tempo, a Casa cria conhecimento, memória, não é apenas um
do Povo voltou a funcionar com tudo quando estava espaço de espetáculo. Então acho que já vivíamos
começando a crise econômica, por volta de 2012 e uma espécie de censura embutida no entendimento
2013. Então a gente é especialista em crise. neoliberal do que é cultura, que era uma censura
econômica. Agora a gente vê uma espécie de
Sem falar na crise da qual a Casa vinha há 30 anos, fantasma do passado, que é uma possível censura
quase fechada… política. Mas, como tudo no Brasil, isso se dá numa
Sim… E no meio disso tudo, agora estamos fazen- espécie de legalidade, por meio de comissões
do algumas apostas ousadas. Contratamos novas que atrasam, recusam etc. Então fica difícil definir
pessoas, aumentamos algumas remunerações para exatamente a censura, mas, que existe um clima
consolidar a equipe. Então estamos apostando, geral de desconfiança, isso é nítido; que tem uma
mesmo em meio à crise, nessa consolidação. Porque insegurança econômica e jurídica, tem.
a gente acha que é isso que vai salvar a instituição. Ainda assim, voltando à questão mais econômica,
A Casa do Povo funciona com pouco, o orçamento acho que a gente também já é “safo”. Diferen-
esse ano está estimando em R$ 1,9 milhão. Parece temente do que vejo na França, onde um centro
muito, mas não é. Então a gente tem espaço para cultural depende quase totalmente de um convênio
crescer ainda, não tem gordura, e somos flexíveis com o Estado, nós aqui somos muito mais acos-
o suficiente para nos adaptar. tumados a sobreviver no ambiente adverso. E a
criar estruturas, por mais frágeis e precárias que
Por fim, eu queria fazer mais uma pergunta relacio- sejam. Então é claro que a gente deseja e precisa
nada ao contexto político. Nós temos, já antes da de melhorias e programas sólidos, mas quero dizer
pandemia, um governo federal que tem promovido que a situação não é totalmente binária. Enfim, o
fortes ataques ao setor cultural, tanto com corte contexto é nebuloso e nós estamos preocupados,
de recursos quanto com atitudes que beiram mes- mas não desesperados. Já costumam ser tão pou-
mo a censura. Como é trabalhar, sendo um centro cos apoios públicos que quando a gente cai não
cultural, neste contexto? é de muito alto. Mas precisamos lutar contra isso, FOTO: ANDRÉ PENTEADO
Sim, isso é muito preocupante. O que aconteceu com as ferramentas que temos, porque cultura é
agora com o instituto Vladimir Herzog [que teve um direito básico. Não tem arrego.
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