Page 37 - ARTE!Brasileiros #51
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O museólogo Marcelo Araujo, diretor geral do Instituto Moreira Salles




            critérios de sucesso e de        pessoas, o museu surgia         que a essa obra dava acesso.
            legitimação. O museu integrava-  igualmente como um lugar de       A visita ao museu começava a
            se veloz e apressadamente numa   ocupação intensiva do tempo dos   assemelhar-se à visita ao
            sociedade global do espetáculo   seus visitantes, não um tempo   shopping center, condicionando
            que o pressionava cada vez mais   para a experiência sensorial das   a atenção e a curiosidade do
            para que se transformasse num    obras, o conhecimento, nem tanto   visitante à permanente excitação
            elemento essencial da paisagem   assim um tempo para a           das numerosas atrações que se
            mundial do entretenimento e do   aprendizagem ou a partilha dos   lhe oferecessem no seu
            lazer, mobilizando uma indústria   objetos ou dos documentos neles   percurso. Ficava de fora o prazer
            do turismo que nele identificava   apresentados, a reflexão individual  da descoberta do desconhecido,
            uma das suas atrações. Aliás,    ou coletiva em situações que    o estímulo da curiosidade mais
            como sucede no Brasil, não deixa   neles se pudessem viver, mas   radical, o desconforto
            de ser significativo que a pasta   antes um tempo ocupado em     revigorante do confronto
            antes ministerial da cultura se   leitura nas suas paredes de textos   dissonante com as ideias,
            integre agora como secretaria    quantas vezes simplistas ou     sempre já feitas e servidas como
            num ministério do turismo... São   redutores (quando não crípticos   fast food para o espírito. O
            numerosos os casos que se        ou incompreensíveis...), um tempo   museu se afirmava como lugar
            verificam, num contexto          preenchido com a duração de     de anestesia dos conflitos da
            internacional, dessa associação   materiais audiovisuais sem fim,   vida, muitas vezes à revelia das
            política da cultura ao turismo,   com visitas guiadas por        obras apresentadas, mesmo
            muitas vezes acrescida do        audioguias, frequência de lojas,   quando os enunciava
            desporto, da China a Abu Dhabi,   cafés e restaurantes, filas    edulcorados pelo perfil curatorial
            da Turquia à Etiópia...          intermináveis para ver exposições   politicamente correto das suas
               Nesta sociedade que se        blockbuster nas quais o tempo   exposições e programas. A
            estrutura ideologicamente no     para estar em frente a uma obra   transmissão constante de
            roubo do tempo à vida das        era definido pela fila de espera   informação se sobrepunha

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