Page 33 - ARTE!Brasileiros #51
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contexto, com a pandemia de      além de mexer com questões como  o pós-Coronavirus
            Covid-19, escancara ainda mais as   o aquecimento global, que já é um   O tema do mundo que virá após
            diferenças sociais e econômicas   fato real, tem consequências na vida   tamanha crise para a humanidade
            entre os países. “Sabemos que o   biológica de um modo geral, na vida   perpassou também , de diferentes
            Sul global é atingido mais duramente   dos seres visíveis e invisíveis que   modos, as entrevistas de todos
            por uma crise como essa. As dife- estão sobre a terra”, afirma. Neste   os gestores. Para Saron, “parado-
            renças de fato são expostas.” Por  sentido, diz ele, a crise gerada pela   xalmente, o pós-corona trará uma
            outro lado, diz ela, é possível pensar  pandemia do coronavírus demonstra   humanização da sociedade, o que,
            também que “quando passar um     a necessidade de um debate muito   por sua vez, demandará o fortale-
            pouco o ápice de tudo isso, talvez   mais amplo do que pode aparen- cimento da ciência, o avanço da
            a gente esteja um pouco à frente   tar: “Não é apenas um problema de   educação e a ampliação do fazer
            em relação a algumas alternativas   saúde, mas diz respeito à economia,  artístico. Nós, que estamos intima-
            e saídas. Pois se essa situação da   às relações humanas, à cultura, à   mente ligados ao mundo do conhe-
            pandemia se coloca para todo o   educação e à vida como um todo”.  cimento, precisaremos estar prontos
            globo, nós que vivemos em países   Em concordância com o dire- para responder à altura este desejo”.
            subdesenvolvidos, em condições   tor do Sesc, Farkas cita escritos   Miranda, por sua vez, considera que
            subalternas a esse lugar do mundo   recentes do líder indígena Ailton   o “novo normal” exigirá das pessoas
            onde o dinheiro circula, sempre tive- Krenak para defender que após a   que elas sejam mais solidárias umas
            mos que lidar com a precariedade   pandemia não será possível, nem   com as outras. “Não quer dizer que
            e achar alternativas, sobretudo no   desejável, voltar à vida como era   elas serão mais solidárias, mas serão
            campo da arte e da cultura”.     antes. “Não vamos tentar continuar  convidadas a isso. Primeiro porque
               O quadro geopolítico no contex- numa normalidade que não exis- uma ameaça como essa é para
            to da pandemia foi tema também da   te. Eu acho que tudo isso que está   todo mundo. Depois, porque você
            conversa com Danilo Miranda, para   acontecendo não é gratuito. Como   depende totalmente do outro para
            quem “o que está acontecendo     o Krenak fala, essa é uma crise da   poder se manter saudável. Então é
            mostra o desequilíbrio e a falta de   humanidade, do ser humano. O pro- quase que uma solidariedade obri-
            equidade social no mundo”. Para o   blema não é o mundo, a natureza,  gatória, indispensável”, explica.
            diretor do Sesc-sp, “é muito mais   os animais. Somos nós. Quem está   De um ponto de vista das práticas
            grave o que está acontecendo no   doente somos nós. E nesse sentido   diárias das instituições, para além
            Brasil do que o que se passou na   eu acho que os povos originários   da intensificação nas atividades
            Europa. Lá foi grave, aqui vai ser  têm muito a nos ensinar, a nos dizer. ” virtuais, a realidade que virá deve-
            gravíssimo. Porque aqui a desi-                                  rá exigir alterações nos modos de
            gualdade, a pobreza, a miséria e a                               atuação presencial. “Vamos ter que
            falta de condições sanitárias são                                rever hábitos”, afirma Miranda. “E
            muito maiores”. Para piorar, “temos                              enquanto não tiver a vacina, como
            um presidente que nega absolu-                                   é que vamos juntar gente para ver
            tamente tudo isso e atua de uma                                  um filme, um teatro ou um concerto?
            maneira equivocada, totalmente                                   Então vai ser um desafio enorme do
            errática, em todos os sentidos. É                                ponto de vista prático, arquitetôni-
            tão grave quanto um guerra.”                                     co. Como será o novo presencial?”,
               Para além das consequências,                                  questiona ele.
            Miranda ressalta ainda que as cau-                                  Paradoxalmente, Solange Farkas
            sas que levaram ao quadro atual não                              considera que o trágico contexto
            estão desconectados do tratamento                                da pandemia pode ter ajudado as
            que o ser humano dá à natureza, ao                               pessoas a prestarem mais aten-
            planeta. “Então a exploração dos   Solange Farkas, diretora da Associação   ção a algumas questões e injusti-
            recursos naturais levada ao extremo,   Cultural Videobrasil      ças sociais latentes na sociedade.

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