Page 35 - ARTE!Brasileiros #51
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A escassez de recursos direcio- e Sebrae) é uma constante desde  toCanDo em Frente
            nados às instituições culturais não   o início da gestão Bolsonaro - uma   Mesmo com todos os empecilhos,
            estariam, neste sentido, desvincu- Medida Provisória para a diminuição   dificuldades econômicas e políticas,
            ladas de um projeto de governo que   nos repasses de empresas para o   em meio à pandemia de Covid-19,
            exclui a cultura de seu planejamento.  sistema transita no Congresso no   os cinco gestores entrevistados
            Para Farkas, esse processo de des- período de publicação desta repor- afirmam estar buscando os cami-
            monte remete ao governo anterior,  tagem. “Justamente no momento em   nhos possíveis para manter vivas
            de Michel Temer. “Se não fosse o   que mais se necessita de instituições   e atuantes as instituições que diri-
            Sesc, que eu digo sempre que é a   que lidam com essas questões do   gem. “Então eu acho que cada um
            nossa política cultural, a gente não   debate, da discussão, da informa- vai fazendo seu trabalho, algo que
            teria feito a bienal desde 2016, por- ção, da educação e da cultura, para   consiga responder a essa situação”,
            que não há condições para isso”. E  que possamos vencer tudo isso”,  diz Ohtake. E em uma “escala macro”,
            com o agravamento da situação por  diz Miranda.                  completa, “nós temos que voltar a
            conta do isolamento social, “ou você   Saron, por sua vez, considera que   construir um projeto de país. E um
            tem que se reinventar, de fato, ou   a falta de uma política de Estado para   projeto de país tem a ver com arte,
            esperar esse terremoto passar. E  a cultura não é algo recente. “Há sete   com educação e cultura.” Jochen
            nesse sentido a pandemia nos tira   anos que o Fundo Nacional da Cultura,  Volz, por sua vez, relembra a Bienal
            totalmente de uma zona de confor- um instrumento importantíssimo na   de São Paulo de 2016, Incerteza Viva,
            to. Eu acho que este momento nos   constituição de uma política cultural   da qual foi curador, para dizer que
            obriga a resgatar um pouco o espírito   consistente tem visto, sucessivamente,  é preciso “pensar em como abraçar
            marginal que permeava a criação   o seu orçamento ser reduzido, mesmo   este momento de incerteza. E em vez
            artística antes dessa profissionali- tendo uma fonte segura de recursos   de se recolher no medo, pensar em
            zação toda”.                     advinda das loterias”, diz. “Outro indi- como transformar esse momento
               Segundo Ohtake, as captações   cativo de vulnerabilidade nas políticas   em ação”. Para isso, a arte pode
            no instituto, sem vínculo direto com   públicas é o fato de que em 30 anos   sempre servir de inspiração: “Acho
            o Estado, têm sido cada vez mais   de existência de um órgão dirigente   que é um momento de olhar para
            difíceis e, por isso, o número de   de cultura tivemos, em média, um   as estratégias artísticas novamente
            mostras anuais deverá ser reduzido.  responsável a cada 10 meses, com   e ver como os artistas tem, desde
            “Porque nós também não temos um   exceção de Francisco Weffort, que   sempre, imaginado o inimaginável”.
            padrinho, um patrono, como a maio- permaneceu no cargo por oito anos, e   Danilo Miranda, apesar de tudo,
            ria das grandes instituições têm”,  de Gilberto Gil, por cinco anos e meio.  não deixa de se dizer esperançoso.
            diz ele. “E o fato de ter um governo  Tudo isso sem contar a histórica fragili- “Porque cultura é muito amplo. É mui-
            como esse atual exige que a gente   dade da Funarte, em tese a instituição   to mais sério e mais importante do
            invente as coisas para fazer. Pre- pública que deveria ser a responsável   que qualquer governo possa ima-
            cisamos ser mais inventivos. Nós   por fomentar a arte no Brasil.”  ginar. E ela vai existir independente
            temos que achar caminhos, procurar                               da vontade dos governos, estejam
            saídas para isso tudo, mas é muito                               eles favorecendo ou prejudicando.
            difícil saber o que deve ser feito”,                             Porque ela é inerente à vida humana.
            completa. No caso da Pinacoteca,                                 Você vai em qualquer lugar deste
            um corte de verbas do Governo                                    país, ou do mundo, estão produzindo
            do Estado por conta da pandemia                                  cultura. E não só a cultura que se
            implicou na redução da jornada de                                transforma num produto – como
            trabalho e salários dos funcionários                             uma música, uma literatura -, mas
            e na suspensão temporária de outros                              a cultura que é a expressão humana
            contratos. Por enquanto não houve                                necessária na comunicação, na nar-
            demissões, mas o risco não está                                  rativa, no dia a dia, nas lembranças,
            totalmente descartado.                                           na memória. Não existe memória
               Para o Sesc-sp, a ameaça de                                   sem cultura. Então não conseguirão
            cortes no sistema S (formado por                                 destruir isso nunca, nunca. Por mais
            instituições como Sesc, Sesi, Senai   Danilo Miranda, diretor-geral do Sesc-SP  que tentem.”

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