Page 38 - ARTE!Brasileiros #50
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ENTREVISTA DENILSON BANIWA



                    academia europeia. A partir daí, começaram a olhar   outros projetos nos quais está envolvido hoje?
                    para esses temas. É tudo muito complexo nesse    A rádio Yandê é um dos projetos mais importantes
                     discurso, a começar pela academia só ter levado em   que eu já consegui realizar. Hoje ele é copiado por
                    consideração quando um homem, hétero, branco e   vários indígenas, é tido como uma referência em
                    europeu falou sobre. E também é uma questão que   comunicação, escutado acho que em 40 países. É
                    ainda é discutida por pessoas que não são desses   um marco no Brasil. Rádios desse tipo já existiam na
                     lugares “descolonizados”. Acho que, inclusive, nós   América do Norte e do Sul há muito tempo. A gente
                    indígenas quando assinamos “decolonize” ao invés   fez isso em 2013, distante do que já era produzido
                     de “descolonize” é um modo de nos colocarmos em   na América Latina. Hoje é um marco no que é comu-
                     um lugar diferente do que a academia ocidental dis-  nicação, no que é acesso à comunicação, no que é
                    cute. É um modo de colocar que é um pensamento   estratégia. Quando eu decidi que ia me dedicar ao
                     diferente, talvez não o pensamento, mas uma posição   trabalho artístico, não consegui mais dar conta da
                     diferente dentro da discussão. Mas no Brasil isso é   Yandê. Eu saí da coordenação e das ações. Então é
                    muito recente. Em outros lugares da América Latina   um projeto muito importante, que eu tenho muito
                    a discussão é mais antiga.                       orgulho, que eu participo ainda, mas que eu não
                  E por que só agora?                                faço mais parte da linha de frente porque precisaria
                    O Brasil é muito tardio e também não se entende   de uma dedicação maior. Fora isso, eu tenho estado
                    como colônia. A maior ficção colonizadora que a   no movimento indígena, como sempre, e dentro de
                     gente tem é que o Brasil foi independente ou é inde-  discussões sobre acesso à informação e acesso à
                    pendente. Aqui é o único lugar das Américas que a   universidade. Participo das reuniões em universidades
                    independência veio por parte do rei e não do povo.   onde têm grupos indígenas, tenho participado de
                    Copiamos muito o estilo de vida de outros lugares   reuniões de ações de retomada de território. Tudo
                    porque não nos aceitamos brasileiros, ao contrário   o que eu faço agora é ligado a um trabalho artístico,
                     de outros lugares na América Latina. Na Bolívia,   a uma pesquisa artística.
                    Equador, Chile, você vê que existe um sentimento   Quando você decidiu se focar quase inteiramente
                    no qual as pessoas se consideram filhos daquele   ao trabalho como artista?
                    território.                                      Eu nunca tive um pensamento sobre trabalhar enquan-
                      Você foi um dos fundadores da rádio Yan-       to artista ou viver uma vida de artista. Em 2015 fui
                    dê, a primeira rádio indígena do país. Tem       convidado para fazer a identidade visual, junto com





































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