Page 94 - ARTE!Brasileiros #39
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LIVRO ANDRÉ PENTEADO






             UMA HISTÓRIA


             CHEIA DE PISTAS





             EM MISSÃO FRANCESA, O FOTÓGRAFO ANDRÉ PENTEADO
             RETOMA PROJETO DE INVESTIGAR ELEMENTOS HERDADOS
             PELA CULTURA BRASILEIRA; AGORA ELE JOGA LUZ SOBRE
             GRUPO DE FRANCESES QUE, EM 1816, DESEMBARCOU NO RIO


             POR MARIANA TESSITORE










             O FAMOSO HISTORIADOR Carlo Ginzburg cos-    hoje ainda permanece essa ideia de que as soluções para os
             tumava comparar o estudo do passado a uma   nossos problemas virão de fora”, pontua o fotógrafo.
             investigação de detetive. Nos rastros do tempo,   Em busca dos vestígios da Missão Francesa, Penteado per-
             seria possível encontrar os sinais para a inter-  correu as ruas cariocas durante dois anos. Ele registrou
             pretação do presente. À sua maneira, o fotógrafo   desde locais emblemáticos, como o Museu Nacional de Belas
             André Penteado adota um procedimento similar:   Artes, onde está grande parte da produção do período, até
             “Em meu trabalho, reflito sobre as narrativas his-  personagens associados de alguma forma ao movimento,
             tóricas e como elas definem o que somos hoje”,   como os descendentes do pintor Nicolas-Antoine Taunay,
             afirma. Em seu novo livro, Missão Francesa, lan-  que foram localizados por meio de contatos obtidos por uma
             çado pela editora Madalena, Penteado se dedicou   cunhada de Penteado.
             a estudar possíveis heranças da Missão Artística  Nem sempre as fotos têm conexões evidentes com o tema,
             Francesa, grupo de artistas que aportou no Rio   como enfatiza o artista: “Ao pesquisar sobre o assunto, faço
             de Janeiro, em 1816, para fundar a primeira aca-  uma lista de imagens possíveis para o projeto, que são basi-
             demia de arte do Brasil.                    camente os lugares onde irei fotografar. Mas o interessante é
             A publicação faz parte de uma trilogia do autor   que, quando estou em campo, acontecem coisas imprevisíveis
             sobre eventos históricos anteriores à populariza-  e novas imagens se oferecem”.
             ção da fotografia. Lançado em 2015, o primeiro   Ele relembra, por exemplo, o seu encontro com o porteiro José
             livro trata da revolta paraense Cabanagem (1835-  Inácio da Silva. Andando pelo Rio, o artista avistou um prédio
             1840). O último, que está em fase de produção,   que levava o nome de Grandjean de Montigny, principal arqui-
             será sobre a Revolução Farroupilha (1835-1845).   teto da missão. O porteiro utilizava um uniforme com o mesmo
             O intuito da série é discutir grandes questões   nome bordado. Impressionado com a situação, o artista fez um
             da sociedade brasileira a partir da fotografia.   retrato de José e o publicou no livro. Na página ao lado, há uma
             “Quando fiz o livro sobre a Cabanagem, eu queria   tela, de 1850, que representa o maestro Francisco Manuel e suas
             questionar esse estereótipo do brasileiro como um   enteadas. Provenientes de épocas distintas, as duas imagens
             homem cordial, que não se revolta. Já ao abordar   acabam dialogando, enfatiza Penteado: “Eu faço um jogo nessa
             o tema da Missão Francesa, me interessava tratar   página, confrontando a pintura do maestro e a sua família, que
             da importação de modelos. É irônico como até   representam a nossa elite, com a imagem do porteiro”, conta.


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