Margareth Menezes
A Ministra da Cultura, Margareth Menezes, durante ato simbólico na reabertura da sede do MinC, em 24 de janeiro Foto: Filipe Araújo

A artista e curadora Naine Terena, que assinou a curadoria da pioneira mostra de arte indígena Véxoa: Nós sabemos, na Pinacoteca de São Paulo (em 2020, reunindo 23 artistas e coletivos), é a nova diretora de Educação e Formação Artística da Secretaria Nacional de Formação, Livro e Leitura do Ministério da Cultura. A cientista política Layanne Lisa coordena a diretoria de Articulação e Governança dos Comitês de Cultura do mesmo ministério. A socióloga Leticia Schwarz é a subsecretária de Gestão Estratégica. A antropóloga Raquel Dias Teixeira é a coordenadora do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular do Iphan. A educadora Kelma Ferreira coordena o Apoio Administrativo do Ibram. A doutora em estudos étnicos e africanos Desiree Tozi é a nova diretora de Cooperação e Fomento do Iphan.

No novo Ministério da Cultura do Brasil de 2023, as mulheres não são apenas maioria, elas decidem. Em apenas dois meses e meio, Margareth Menezes mudou completamente os consagrados paradigmas de composição administrativa na cultura do Estado Brasileiro. No dia 3 de março, na Sala Cecília Meirelles, no Rio, Margareth deu posse à baiana Maria Marighella (neta de Carlos Marighella) na presidência da Fundação Nacional de Artes (Funarte) com um grande ato público no Rio de Janeiro, sonorizado pelo batuque ao vivo do grupo percussivo Tambores de Olokun, um rito que incorporou o antigo movimento #OcupaMinC, nascido em 2016, na resistência ao golpe de Estado contra a ex-presidenta Dilma Rousseff. Ao anunciar a nova diretoria colegiada da Funarte, Maria Marighella comunicou que estava priorizando a paridade de gênero e montando “uma Funarte com mulheres no centro das decisões, incidindo no modo como vemos e fazemos as políticas”.

As mudanças, que poderiam se situar predominantemente no território da representatividade, vão muito além do simbólico: no último dia 7, por meio de uma portaria, Margareth Menezes criou o novíssimo Comitê de Gênero, Raça e Diversidade no ministério, com o intuito de produzir diagnósticos de ações que possam potencializar políticas de transversalidade afirmativa (e criar ferramentas e mecanismos a serem incorporadas definitivamente pelo Estado brasileiro). Quatro outros ministérios do governo Lula já integram o Comitê de Margareth. “O Brasil será um país melhor na medida em que respeitar, acolher e incentivar o desenvolvimento de todas as mulheres”, afirmou a ministra.

No plano prático, o novo MinC está mantendo seu foco principal no destravamento da ação cultural no plano federal. Na metade de abril, acaba o prazo que a ministra deu para um grupo de trabalho regulamentar a nova Lei Paulo Gustavo, que vai destinar R$ 3,8 bilhões para estímulo à cultura nos Estados e Municípios. A transferência, a maior em volume de recursos da História do país, já poderá começar ainda em abril.

Para fazer frente a essa demanda, que será de controle e fiscalização, além de acompanhamento, o Ministério da Cultura começou a recompor sua equipe de experts em incentivo e legislação. O retorno de servidores experientes, com largo conhecimento histórico e técnico das regras e normas que dão segurança jurídica ao setor de incentivo, está sendo minucioso.

Há alguns dias, Margareth recontratou o primeiro servidor que tinha sido demitido na gestão Mario Frias por questões ideológicas, Odecir Luiz Prata da Costa, um dos maiores experts em leis de incentivo do país. Costa fora exonerado por Frias assim que este assumiu a Secretaria Especial de Cultura do governo federal, em julho de 2020, a mando da chamada “ala olavista” daquela gestão, para que o antigo governo mantivesse centralizada a decisão sobre fomento, com regras não raras de exceção ideológica e censura. Servidor desde 1988, de perfil técnico, Costa se opôs à sanha persecutória, extremista e negacionista na condução das leis de incentivo e foi afastado.

Outra servidora reposta em suas funções foi Teresa Cristina Rocha Azevedo de Oliveira, nomeada como Diretora do Departamento de Fomento Direto da Secretaria de Economia Criativa. Essa reestruturação é considerada essencial para o acionamento não apenas da Lei Rouanet, que se encontra atrofiada (e soterrada por prestações de contas antigas), mas também das novíssimas legislações de incentivo que estão a caminho, a Lei Paulo Gustavo e a Lei Aldir Blanc II, que destinarão cerca de R$ 7 bilhões para o setor.

Segundo o MinC, cinco milhões de pessoas trabalham na área cultural do país e geram cerca de 3% do PIB nacional. Um estímulo do tamanho do que se anuncia para 2023 e 2024 pode gerar milhares de empregos e acionar uma área econômica fundamental, que se encaixa na chamada soft economy (baseada na criatividade, no acesso, compartilhamento, na colaboração e confiança), sem os efeitos colaterais das indústrias pesadas e ambientalmente daninhas.

A Lei Rouanet será alvo de um novo decreto governamental, que deve sair até o final deste mês de março, com o intuito de fazer ajustes pontuais no texto – além do retorno dos planos plurianuais e anuais para instituições culturais, das ações continuadas e do fomento aos grupos artísticos estáveis, novos limites de valores para captação, gestão e cachês, será reativada a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC).

Parte do mapeamento do potencial brasileiro de cultura estará a cargo da mais recente inovação do governo: a Secretaria dos Comitês de Cultura. A escolhida para pilotar essa experiência foi a socióloga e educadora Roberta Martins, ex-diretora de diversidade cultural da Fundação de Arte de Niterói (FAN). A gestora, que já teve sob sua administração no município de Niterói o Theatro Municipal João Caetano, o Museu de Arte Contemporânea (MAC) e a Companhia de Ballet de Niterói, tem agora por responsabilidade articular o provável sucessor dos Pontos de Cultura na vanguarda das ações governamentais.

O conceito dos Comitês pressupõe a existência de um núcleo em cada unidade da federação, formado por artistas, intelectuais, trabalhadores e trabalhadoras da cultura locais, sem vínculo com o governo. Será a própria comunidade refletindo e propondo estratégias de enfrentamento para grandes temas da contemporaneidade brasileira e global. Esses comitês, acredita o governo, permitirão um conhecimento mais profundo das demandas e necessidades de cada rincão do país, driblando a tendência centralista histórica do governo. ✱

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