Melissa Oliveira, sem título, 2022. Foto: Divulgação/Galeria Nonada
Melissa Oliveira, sem título, 2022. Foto: Divulgação/Galeria Nonada

Em novembro do ano passado, o Rio de Janeiro ganhou dois espaços – em Copacabana, na zona Sul da cidade, e na Penha, zona Norte – dedicados a artistas que estão fora do circuito de galerias. A exposição de abertura, que fica em cartaz até 4 de março, reúne 32 artistas, que trabalham com diversos suportes e materiais, e se debruçam sobre temas como racismo, política e gênero. Pertencentes a uma mesma galeria, batizada como Nonada – neologismo usado por Guimarães Rosa em seu clássico Grande Sertão: Veredas –, seus dois endereços, suas dimensões e as das obras foram, em parte, determinantes da divisão dos artistas e de suas criações em cada espaço.

Em Copa, a Nonada ZS abriga, em seus 70 metros quadrados, os trabalhos sob o tema A palavra: prosa, que tem tintas mais sociopolíticas. Na Penha, a seleção da Nonada ZN se chama A palavra: verso e tem caráter mais lírico. Ainda que haja nomes de fora do eixo Rio-São Paulo, uma descentralização pretendida pela galeria, a maioria dos artistas selecionados trabalha nas duas capitais. Duas exceções são Guto Oca, de João Pessoa, na Paraíba, e Guilherme Almeida, de Salvador, Bahia. De todo o grupo, apenas dois já são representados pela Nonada: os cariocas Melissa Oliveira e Miguel Afa.

O projeto da galeria começou a ser gestado no ano passado, pelo goiano Paulo Azeco, nome bastante conhecido do circuito de artes da capital paulista. No início da pandemia, e até motivado por ela, Azeco, que então estava na Fortes D’Aloia & Gabriel, mudou-se para o Rio, passando a trabalhar na Carpintaria, filial carioca da galeria.

Em abril do ano passado, então trabalhando como art advisor, Azeco vendeu quatro obras de Anna Bella Geiger, numa individual da artista na Galeria Danielian. Foi aí que se aproximou dos sócios do espaço, os irmãos Luiz e Ludwig Danielian, a quem levou o projeto da Nonada, de quem também participara João Paulo Balsini, colecionador de arte e advogado com atuação em políticas públicas. Os Danielian aceitaram participar e ainda trouxeram para a empreitada o espaço da Penha, uma fábrica de lingerie desativada, que pertencia à família dos galeristas.

 

Antes de fecharem a sociedade, no entanto, Azeco recebeu um “convite irrecusável” da Galeria Millan, que o levou de volta a São Paulo. A temporada, no entanto, foi curta, de poucos meses. As tratativas com os Danielian continuaram, ainda que a distância, até baterem o martelo. Juntos, os quatro sócios fizeram a seleção de nomes e trabalhos destas mostras de abertura, com indicações de outros artistas, de curadores e até mesmo a partir de buscas feitas em mídias sociais. Segundo Azeco, o foco da galeria será sempre trabalhar com questões que são urgentes.

“A arte contemporânea que não discute algum desses temas perde um pouco de sua importância. Acho relevante a gente ter essas pautas. Eu sou um homem gay, então, a partir de meu lugar de fala, quero discutir questões ligadas à arte queer. Nesta exposição inaugural, temos quatro artistas transexuais, por exemplo. E, lógico, também temos artistas negros, mas a intenção não é surfar nessa onda mercadológica”, afirma Azeco.

Para Luiz Danielian, a Nonada é um projeto que entende a arte como instrumento político e social, e as duas escolhas das sedes falam um pouco sobre isso. “Copacabana nós entendemos como a grande mistura do Rio de Janeiro. E a Penha foi uma coisa ainda mais natural. Além de ir para perto de onde estão vários artistas, um lugar em que quase não existem iniciativas culturais, a galeria está no térreo da antiga fábrica da minha família”, lembra o galerista. “Então, de certa forma, também faz parte do pensamento da Nonada, essa devolução daquele edifício para o bairro, mas agora com iniciativas culturais”.

Ainda segundo Danielian, a Nonada é a primeira dessas iniciativas a tomar forma, mas eles já têm um planejamento a longo prazo para que outras ações possam transformar a antiga fábrica em um equipamento cultural para a comunidade. “É como se estivéssemos, de uma forma pequenina, devolvendo para o bairro algo em agradecimento por tantos anos ali”, diz.

A programação do restante do ano nos dois endereços da Nonada está quase fechada. Já em meados de março, a galeria de Copa receberá uma individual de Melissa Oliveira, com curadoria de Victor Gorgulho. Em paralelo, o galpão da Penha terá obras de Siwaju Lima, em diálogo com outro artista, um nome ainda por definir pela curadora Clarissa Diniz. Em maio, a Nonada ZN vai receber uma grande coletiva sobre sexualidade, provavelmente com curadoria de Efrain Almeida.

Em agosto, os dois espaços receberão uma individual de Miguel Afa. No mês seguinte, durante a ArtRio, os galeristas vão abrir um novo espaço dentro do galpão da Penha, dedicado a projetos especiais, ocupações por parte de galerias de fora do Rio ou mesmo do Brasil, que acontecerão duas vezes ao ano. Para o fim do ano, está prevista uma individual de André Barion, na Nonada de Copa.

SERVIÇO
A palavra: prosa
Nonada ZN – Rua Conde de Agrolongo, 677 – Penha
Visitação: quinta e sexta-feira, das 12h às 17h; sábado, das 11h às 15h
A palavra: verso
Nonada ZS – Rua Aires Saldanha, 24 – Copacabana
Visitação: terça a sexta-feira, das 11h às 19h; sábado, das 11h às 15h
Até 4 de março
Entrada gratuita

 

 

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