Carimbo para o convite da exposição "Carmela Gross: Carimbos", Gabinete de Artes Gráficas, São Paulo, 1978
Carimbo para o convite da exposição “Carmela Gross: Carimbos”,
Gabinete de Artes Gráficas, São Paulo, 1978

O Instituto de Arte Contemporânea (IAC) apresenta a partir deste sábado (4/2) a exposição Carimbos, em que retoma 12 dos 80 trabalhos apresentados por Carmela Gross em mostra homônima, realizada em 1978, no Gabinete de Artes Gráficas, em São Paulo. Feitos de repetidas carimbadas sobre papel, as obras estão agora acompanhadas de uma farta documentação – mais de 300 itens – que revela o processo criativo da artista, que fizera sua primeira experimentação com carimbo em 1968, no IV Salão de Arte Moderna do Distrito Federal, em Brasília, com um trabalho que formava o desenho de um murro sobre a mesa.

“Cada carimbo, com sua marca, repete-se muitas vezes numa mesma prancha, de 70cm x 1m, formando um padrão. Eu carimbava uma coisa ao lado da outra, até formar este campo de imagens repetidas”, conta Carmela, a respeito da exposição de 1978. “É um grande arquivo que estou doando ao IAC, e a instituição quis mostrar o processo, com começo, meio e fim”.

 

O conjunto (obras e documentos), diz a artista, revela todos os experimentos feitos à época, “que resultaram na produção dos carimbos de borracha, a matriz para pensar os trabalhos”. Segundo Carmela, a mostra é uma “arqueologia” do projeto original, que apresenta “como foi ele foi pensado e feito, com todos os passos da produção”.

Ricardo Resende assina a curadoria, firmemente lastreada pela documentação sistematizada que a artista faz de sua própria produção, algo que também se pode ver em seu site. “Trabalho intensamente nos meus arquivos”, diz Carmela, “então essa organização foi feita ao longo de anos e anos. É algo que não daria para se fazer em um ou mesmo seis meses. Muitos dos carimbos precisaram ser restaurados, o que aconteceu em 2015. Os documentos, por sua vez, estavam já organizados em pastas. Todo o material que se vê agora no IAC tem uma certa organização, minha, pessoal, que agora se torna visível”.

Para Resende, “em termos de arquivo e também de montagem”, a curadoria estava pronta. “A Carmela é a curadora de fato, por sua sistematização desse arco de produção, da ideia à conclusão, vista originalmente em 1978”, afirma. “A exposição do IAC é eminentemente museológica e traz à tona a característica processual da obra original. E a obra da Carmela é o pensamento, é reflexão, é ideia. É desenvolvimento de ideia. Portanto, processual”.

Entre os documentos presentes está um texto do historiador da arte Flávio Motta – o original e sua transcrição –, além de matérias jornalísticas que saíram à época, com títulos que se referem ao gestual da artista: “Tudo isso num soco”, “Os complicados rabiscos de Carmela” e “O traço sob uma visão radical”, entre outros. Para Resende, os títulos “certamente descrevem e definem o que ela fez” à época.

Carmela destaca a expografia que criou para a mostra, em parte organizada em três paredes forradas com folhas de zinco galvanizado, onde ela prendeu cada documento por meio de um imã. “As duas salas que foram oferecidas são de tamanho regular, e os documentos que seriam colocados lá, muitos deles são pequenos, com apenas 3cm x 5cm. O material era muito heterogêneo”, conta. “Para conseguir que isso virasse uma leitura de um conjunto, que mostrasse essa arqueologia, com as folhas de zinco, pude colocar itens de qualquer tamanho, sem qualquer anteparo, sem moldura ou vidro”.

As últimas exposições de Carmela Gross aconteceram em 2021, com obras inéditas na Galeria Vermelho (Fendas, fagulhas) e sua participação na 34ª Bienal de São Paulo, em que mostrou o painel Boca do inferno, composto de 160 monotipias. No momento, a artista trabalha em novos projetos, que serão apresentados em 2024, em espaços institucionais. Carmela ressalta que suas criações “são fechadas em ciclos” e que seria difícil fazer uma “conexão por semelhança ou continuidade” entre Carimbos e as obras mais recentes, por exemplo.

“Esse longo ciclo dos carimbos forma um conjunto exposto em 1978, e pronto. É conceitual, que vem do desenho, e em seguida fiz outras coisas, como o Projeto para a Construção de um Céu, que foi minha tese de mestrado [na ECA, em 1981, sob orientação do crítico de arte e curador Walter Zanini], e apresentado na Bienal de São Paulo naquele mesmo ano”.

Para a artista, as eventuais “semelhanças se dão muito mais nos bastidores, pelo conceito que está embutido neles, do que pela visualidade”, diz. “O contexto é diferente, a armação do pensamento é diferente e se liga a uma preocupação conceitual, com o desenho, com a cidade”. Segundo Ricardo Resende, a produção de Carmela Gross é marcada por uma “ação construtiva que atravessa toda a obra dela, assim como um pensamento gráfico”.

Para a exposição que o IAC abre neste sábado, Resende chegou a perguntar a Carmela se ela não poderia refazer algumas das pranchas, “repetir as carimbadas”, a partir dos carimbos restaurados. “A resposta foi muita bonita: ela disse que não poderia, porque a sua força daquela época não é a mesma hoje”, conclui.

SERVIÇO

Carmela Gross: Carimbos
Abertura: 4/2, às 12h; visitação: de 6/2 a 6/5
Curadoria: Ricardo Resende
Instituto de Arte Contemporânea (IAC) – Av. Dr. Arnaldo, 120/126, São Paulo (SP)
Horários: terça a sexta-feira, das 11h às 17h; sábado; das 11h às 16h
Entrada gratuita

 

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