R. Trompaz

A galeria Martins&Montero, situada na rua Jamaica 50, reuniu, entre 10 de agosto e 14 de setembro, 28 obras de Trompaz, um artista/ativista das questões sociais que dá voz a traços carregados de gestualidade. Nascido no Capão Redondo, bairro do extremo sul da capital paulista, ele cruza a cidade seguidamente a pé ou de skate. Sua obra acumula desde gestos de matrizes africanas a signos próprios das grandes metrópoles desenvolvidos, em sua maioria, com pigmento em pó e verniz acrílico sobre papel ou com guache e nanquim. Criar é um ato cotidiano e contínuo que se desdobra em grafismos aparentemente desconectados, mas unidos por uma gramática enigmática e pessoal. “Essas obras abordam um tema que venho explorando há muito tempo, o SSGE – Segregação Social Geograficamente Escancarada. A exposição, que tem a curadoria de André Pitol, leva o nome Jornal do Mundo devido à apropriação que fiz de um livro, que comprei em um sebo, e que tinha esse título”. Trompaz sentiu uma forte conexão entre o conceito da publicação e a proposta do seu trabalho, que busca abordar questões sociais”. 

Com montagem impecável, o conjunto de obras destaca duas pinturas de grandes dimensões que se desdobram em grafismos que deslizam sobre persianas, geralmente usadas em janelas. Esse recurso dialoga diretamente com a ideia do que enxergamos através da janela, remetendo-se às questões sociais. “As persianas têm um papel simbólico importante nesse contexto, representando o que se revela – ou se oculta – no dia a dia das casas”. As pinturas em papel kraft seguem a mesma linha técnica, apresentando um aspecto de negativo. “Esse negativo tem um propósito claro: através da técnica de lavagem, revelo o que estava encoberto, aquilo que se esconde debaixo do tapete”.

Trompaz se movimenta pela cidade, com alguns papeis ou obras dentro da mochila que leva nas costas.  “Essa forma de me soltar por São Paulo me acompanha desde sempre. Todas as minhas pinturas contêm diversos símbolos e elementos que falam da relação que desenvolvi com a cidade, onde vivo por 35 anos”. Ele entende a metrópole como a mais rica do Brasil e, ao mesmo tempo, a mais desigual, onde convivem bairros extremamente ricos e outros em condições de extrema pobreza. “Esse contraste é o que busco transmitir em todos meus trabalhos, mesmo que, para o espectador, o resultado seja abstrato. Minha intenção é a de lutar contra as desigualdades sociais”.

Trompaz e a Trienal de Tijuana (México)

Para o artista, participar da segunda edição da Trienal de Tijuana, que vai até fevereiro de 2025, tem sido uma experiência transformadora. “Estar lá com artistas de 14 países é algo que ainda estou vivenciando, e tem sido verdadeiramente mágico.” Esta foi a sua primeira viagem de avião e, também, a primeira viagem internacional com o propósito de levar sua obra para fora. “Me sinto feliz por conhecer não apenas a expressão artística dos mexicanos, mas também a de todos os participantes da Trienal, muitos dos quais compartilham a mesma temática de isolamento social que permeia meu trabalho.” O fato de viver no Capão Redondo, área que sofre com fronteiras sociais evidentes entre o bairro e o restante da cidade, Trompaz diz que se identificou com várias propostas expostas na Trienal. “Tijuana reforçou a relevância do tema e a universalidade dessas questões que, infelizmente, ultrapassam fronteiras geográficas”.

Leonor Amarante é a curadora – geral da Trienal de Tijuana: 2. Internacional Pictórica


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