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Instituto Moreira Salles inaugura escultura grandiosa de Richard Serra em São Paulo

FOTO: Maria Clara Villas

Um dos mais celebrados artistas plásticos contemporâneos, conhecido por suas monumentais esculturas de aço, Richard Serra terá a partir deste sábado, dia 23 de fevereiro, sua primeira obra aberta à visitação permanente na América Latina. Composta por duas placas de aço de 18,6m de altura – cada uma com 70,5 toneladas –, a escultura Echo foi criada pelo norte-americano especialmente para o Instituto Moreira Salles (IMS) de São Paulo.

A abertura será marcada por um debate sobre a obra de Serra, às 11h, com a participação dos críticos e curadores Cauê Alves, Lorenzo Mammì e Sônia Salzstein e com a artista Iole de Freitas.

Apesar de produzir também desenhos, esculturas em menor escala e trabalhos de vídeo, é por suas peças grandiosas espalhadas por diversos países – muitas vezes concebidas especialmente para o local onde serão expostas – que Serra, hoje aos 80 anos, se consagrou ao longo das décadas. Suas obras se integram às paisagens urbanas de Londres e Nova York, aos desertos do Catar, às matas da Nova Zelândia ou às salas e jardins de alguns dos mais importantes museus do mundo.

Escultura de Richard Serra. FOTO: Maria Clara Villas

Agora, com Echo, posicionada no jardim externo do IMS, São Paulo se integra a esse circuito. O processo de instalação da escultura envolveu o trabalho de mais de 60 profissionais, entre técnicos e engenheiros, do desembarque no Porto de Santos até a chegada e montagem no IMS. Apesar de tamanho e peso impressionarem, é possível perceber também, junto ao brutalismo, uma sutileza nas obras de Serra.

O artista começou a utilizar o aço nos anos 1970 e, certa vez, escreveu em um catálogo de uma exposição: “O peso é um valor para mim. Não que ele seja mais expressivo que a leveza, mas simplesmente eu sei mais sobre o peso do que sobre a leveza e tenho, portanto, mais a dizer sobre ele”.

Curta de Bárbara Wagner e Benjamin de Burca é premiado em Berlim

Cena de RISE. FOTO: Divulgação

Mais uma vez a dupla Bárbara Wagner e Benjamin de Burca ganha destaque internacional com suas produções impactantes que transitam entre cinema e artes visuais, documentário e ficção e que, em sua maioria, tratam de realidades “periféricas” de diferentes cidades do mundo.

Dessa vez, a dupla baseada em Recife – Bárbara é brasiliense e Benjamin nasceu em Munique – recebeu, com o curta RISE, o Audi Short Film Award no Festival de Berlim. O prêmio é concedido pela montadora que é uma das patrocinadoras do evento. Em maio, a dupla irá também representar o Brasil na 58ª Bienal de Veneza – a partir de escolha de Gabriel Pérez-Barreiro, curador da 33ª Bienal de São Paulo.

Segundo Wagner, RISE é “uma hip-hopera feita em colaboração com poetas, rappers e cantores do incrível coletivo R.I.S.E (REACHING INTELLIGENT SOULS EVERYWHERE), em Toronto”. O curta documenta o trabalho destes jovens que se encontram em um centro comunitário no subúrbio da cidade canadense e foi filmado em uma estação de metrô da cidade.

Bárbara Wagner e Benjamin de Burca trabalham juntos desde 2011 e tiveram trabalhos apresentados em museus, festivais e bienais, sendo muitos deles premiados. Na 32ª Bienal de São Paulo expuseram Estás Vendo Coisas, criado em colaboração com MCs de brega de Recife.

Seja no Brasil ou no exterior, a dupla afirma buscar um “fazer junto” – e não um trabalho unilateral – com os grupos com que trabalham. “O que eu quero é estar dentro, conversar, entrar em acordos. Não se trata de ir lá, tirar um produto deles e mostrar fora”, afirmou Wagner à ARTE!Brasileiros na época da 32ª Bienal de SP.

Não Temos Condições de Responder a Todos – SESC Consolação

A exposição “Não Temos Condições de Responder a Todos”, no Sesc Consolação, é um convite a uma viagem à cena punk rock dos anos 80 e 90. Um conjunto de objetos como fitas K7s, vinis, cartazes de shows, entrevistas, e fotografias rememora os tempos nos quais a comunicação entre bandas, gravadoras e fãs acontecia através de cartas e fanzines.

O nome da mostra faz menção a uma frase dita por um músico da época, que afirmava não conseguir responder a todas as cartas que sua banda recebia de fãs. No espaço, o público pode conferir inclusive correspondências enviadas de outros países para algumas bandas brasileiras que se destacavam.

Os objetos fazem parte do acervo do curador, Alexandre Cruz Sesper, e de outros colecionadores que viveram o movimento.  A exposição conta com uma série de atividades paralelas, entre elas intervenções musicais, conversas e oficinas.  ‘Não temos condições de responder a todos’ possibilita um encontro de gerações, o que – segundo o Sesc – afirma o compromisso da instituição com a preservação da memória e dos saberes coletivos”.

Artista plástico e músico, o curador buscou pontuar a cultura do Faça Você Mesmo, utilizada especialmente na produção dos materiais de divulgação das bandas, que tinham pouco orçamento e poucos meios de expandir suas criações. Com isso, tudo era transformado em algo artesanal e até mesmo com muito valor afetivo ao construírem seus próprios conteúdos e sua própria estética.

Um movimento cheio de atitude e reivindicações, o punk rock foi especialmente político, carregado de ideologias que também aparecem na exposição, com destaques para o veganismo, as lutas pelos direitos LGBTs, a defesa dos diretos dos animais e a defesa do meio ambiente.

Visite a mostra até 5 de março e confira no site do Sesc a programação integrada.

Pinacoteca expõe novas obras de seu acervo de arte contemporânea

Obra de Regina Parra. FOTO: Divulgação

A Pinacoteca de São Paulo apresenta a partir deste sábado, dia 16, quatro obras incorporadas recentemente à sua coleção. Os trabalhos de Marcius Galan, Débora Bolsoni, Regina Parra e Matheus Rocha Pitta poderão ser vistos em diálogo com a exposição de longa duração do acervo do museu.

As obras ocupam quatro salas contíguas à mostra no 2º andar da Pina Luz. Com curadoria do Núcleo de Pesquisa e Curadoria da Pinacoteca, o conjunto propõe um contraponto entre o histórico e o contemporâneo a partir do próprio acervo da instituição.

Seção diagonal (prisma fumê), 2012, de Marcius Galan, integra uma série de trabalhos nos quais o artista cria ilusões óticas a partir de intervenções em ambientes com linhas traçadas no espaço, combinadas a um jogo cromático e ao uso da luz como elemento pictórico. A obra foi adquirida pelo programa de Patronos da Arte Contemporânea do museu.

Lição de mímese (2004-2006) de Débora Bolsoni, é um trabalho crucial na trajetória da artista e foi doada ao museu pelo Iguatemi no contexto da SP-Arte 2017. É composto de várias lousas recortadas em diferentes formatos e emolduradas em madeira, à semelhança de espelhos. Esses espelhos que nada refletem, podem, no entanto, receber desenhos riscados com giz, o que traz à discussão o efeito mimético da arte e sua capacidade de duplicar a realidade.

Lição de Mímese, de Débora Bolsoni. FOTO: Divulgação

Chance (2015-2017), de Regina Parra, que chegou a ser instalada em meio à Mata Atlântica do Parque Laje e no Parque do Ibirapuera, também foi adquirida por meio do programa de patronos do museu. O trabalho, o primeiro que a Pinacoteca adquire da artista, traz a frase “A grande chance” em neon vermelho, e apresenta-se como um portal ambíguo podendo tanto ser interpretado como uma promessa quanto uma ameaça.

Por fim, Primeira pedra (2015-2016), de Matheus Rocha Pitta, é uma instalação interativa composta de cubos de concreto e foi doada ao museu pelo próprio artista e pela galeria que o representa. Dispostos no chão do espaço sobre folhas de jornal do dia anterior, os cubos são oferecidos ao público não por dinheiro, mas por uma outra pedra: para possui-los, o visitante deve sair do museu e trazer a primeira pedra que encontrar. A obra radicaliza o conceito de múltiplo no qual cada peça poderá ser levada pelo visitante como obra para casa, afirmando também um vínculo entre a instituição e a cidade. Também serão exibidas quatro obras da série Acordo.

Marcius Galan, Regina Parra, Débora Bolsoni e Matheus Rocha Pitta no acervo da Pinacoteca

De 16 de fevereiro até 17 de junho de 2019

Pinacoteca: Praça da Luz 2

A quadratura do círculo no Espaço Cultural Porto Seguro

Uma das atividades paralelas ligadas à exposição Meteorológica, da dupla Detanico Lain, no Espaço Cultural Porto Seguro, a performance A quadratura do círculo é uma parceria com a SP Companhia de Dança, com concepção coreográfica de Ricardo Gali.

A instalação coreográfica é apresentada 27 de fevereiro no espaço da obra. Confira entrevista com Ricardo e com o curador da exposição, Rodrigo Villela. Leia também matéria sobre a mostra, clicando aqui.

Frida Kahlo ganha grande mostra no Brooklyn Museum, em Nova York

Frida Kahlo ganha mostra no Brooklyn Museum
Foto presente na exposição. Foto: Divulgação

O Brooklyn Museum de Nova York acaba de inaugurar uma grande mostra sobre a artista mexicana Frida Kahlo (1907-1954), uma das mais celebradas pintoras latino-americanas do século 20 e grande nome do modernismo em seu país. A exposição reúne não só obras da artista, entre pinturas e desenhos, mas também objetos pessoais, roupas, fotografias e vídeos.

É a primeira vez que peças expostas na Casa Azul, na Cidade do México – onde Kahlo morou toda a vida – podem ser vistas nos Estados Unidos. Intitulada Appearances Can Be Deceiving, a mostra é dividida em dez seções como “Raízes”, “Arte e Revolução”, “Casamento” – Kahlo foi casada com o pintor e muralista Diego Rivera – “Arte e Vestimenta”, “Casa Azul”, entre outras.

Para além de sua produção artística, a pintora ficou conhecida por sua atuação política de esquerda, por sua relação com o movimento pela igualdade de gênero e pelas histórias de seu casamento. Recentemente, no entanto, familiares da artista e pesquisadores têm criticado distorções e uma mistificação da vida de Kahlo – que ao se tornar ícone “pop” teve sua produção artística ofuscada.

A exposição no Brooklyn Museum, que procura tratar com profundidade e cuidado o trabalho da artista e seus posicionamentos, ganha ainda mais relevância no momento em que o presidente americano Donald Trump fala em construir um muro entre EUA e México. Em entrevista recente, a diretora do museu, Anne Pasternak, falou sobre a importância de “reforçar pontes culturais”, não criar muros. A mostra fica em cartaz até 12 de maio no museu nova-yorkino.

Alex Flemming faz crítica à situação política brasileira em nova mostra

O artista com uma das obras da mostra. FOTO: Divulgação

Para Alex Flemming, artista paulistano radicado em Berlim há quase 30 anos, a arte deve ser bela, “por mais que eu entenda que isso não é uma unanimidade do pensamento crítico”, diz ele. “Minha vida tem sido a pesquisa da cor e a pesquisa do material. Sou um colorista que já se utilizou de bichos empalhados, tapetes persas, computadores velhos, cuecas, móveis e outras superfícies para fazer meus objetos.”

Mas, não menos importante, a arte deve ser política, o que é notável em toda sua trajetória e, agora, na exposição que o artista apresenta na Galeria Emmathomas, em São Paulo. Ao todo são 28 pias de formatos e cores diferentes, originárias dos anos 1970 e 1980, nas quais Flemming desenhou mãos esculpidas com ponta de diamante. A nova série – intitulada Ecce Homo –, faz referência, a partir da passagem bíblica da condenação de Jesus Cristo, ao comportamento dos brasileiros no atual cenário político.

“As formas das pias remetem aos antigos altares domésticos das fazendas brasileiras e, aqui, trata-se de uma metáfora bíblica aplicada ao triste panorama atual em nosso país. Não foi Pôncio Pilatos quem lavou as mãos e deixou o Brasil chegar ao estado em que está, e sim as elites, nela incluindo o egoísmo de todos os partidos políticos, a omissão das instituições e a ganância do mercado”, diz ele.

Uma das obras da mostra. FOTO: Divulgação

Apesar de residir na Alemanha há muito tempo, Flemming mantém forte relação com o Brasil. Além das várias exposições realizadas em museus e galerias ao longo dos anos, o artista é o autor dos célebres vitrais com rostos de “pessoas comuns” estampados, localizados na estação Sumaré de Metrô (desde 1998) e na Biblioteca Mário de Andrade (desde 2016).

A mostra na Galeria Emmathommas, que fica em cartaz até 22 de março, tem curadoria de Ricardo Resende e foi criada em programa de residência na Fundação Marcos Amaro, em Itú.

ALEX FLEMMING – Série Ecce Homo

De 14 de fevereiro a 22 de março

Galeria Emmathomas – Alameda Franca, 1054 – Jardim Paulista (São Paulo)

Entrada gratuita

 

Debates e exposições sobre causas indígenas em São Paulo

Trabalho que está na mostra no IMS. FOTO: Claudia Andujar

Em programação vinculada à exposição Claudia Andujar: A Luta Yanomami – uma grande retrospectiva do trabalho da fotógrafa, artista visual e ativista –, o Instituto Moreira Salles (IMS) realiza nesta quinta-feira, dia 14, às 19h30, uma conversa aberta com Ailton Krenak, um dos mais importantes e atuantes líderes indígenas do país.

Membro do grupo Krenak, nascido em Minas Gerais, Ailton se dedicou à luta pelos direitos dos povos indígenas desde cedo. Foi atuante na Assembleia Constituinte que produziu a atual Constituição Brasileira (1988), fundou organizações como a ONG Núcleo de Cultura Indígena e em 2016 recebeu o título de professor honoris causa da Universidade Federal de Juiz de Fora.

Também no IMS, na sexta-feira, dia 15, Krenak participa do seminário “Questão indígena, os museus e a escola”, organizado pelo Memorial da Resistência de São Paulo em parceria com IMS e MAE (Museu de Arqueologia e Etnologia da USP) e voltado para professores da rede básica e educadores (saiba mais aqui). O evento segue no sábado, na sede do Memorial, com a participação de historiadores, museólogos, curadores e líderes indígenas.

O líder indígena Ailton Krenak. FOTO: Divulgação

O seminário dialoga com a exposição Ser essa Terra: São Paulo Cidade Indígena, que está em cartaz no Memorial até 22 de abril. Com depoimentos, imagens e objetos, a mostra trata da existência e resistência de diferentes povos indígenas na capital paulistana. Desenvolvida conjuntamente por mais de dez lideranças, conta com mediação curatorial de Daniel Kairoz e Marília Bonas e consultoria de Casé Angatu Xukuru Tupinambá.

Em outro evento dedicado a questões indígenas, a Casa do Povo recebe Claudia Andujar neste sábado, às 11h, para o Círculo de Reflexão sobre Judaísmo Contemporâneo. Andujar, de origem judaica, já traçou paralelos entre o extermínio de povos indígenas no Brasil e o Holocausto na Europa. Publicamos na edição 45 da ARTE!Brasileiros um texto sobre sua série Marcados. Leia aqui.

Endereços dos eventos e exposições:

Instituto Moreira Salles – av. Paulista, 2424

Memorial da Resistência de São Paulo – Largo General Osório, 66

Casa do Povo – Rua Três Rios, 252

 

MoMA adequará espaço para dar atenção a minorias

Hervé Télémaque, Untitled from Homage to Picasso, (Hommage à Picasso), 1972

O Museum Of Modern Art de Nova Iorque (MoMA) anunciou no início desta semana que estará fechado durante o período de 15 de Junho a 21 de Outubro para reformar seu espaço e pensar uma nova organização, fugindo da habitual sistematização disciplinar.

A instituição pretende, com o novo espaço, dar enfoque diferente à arte moderna e à arte contemporânea, especialmente a artistas que pertencem a minorias: mulheres, latinos, asiáticos, afro-americanos e outros grupos pouco valorizados pelo sistema da arte. Esta é a última fase de uma reforma que já dura meses, tendo custado 400 milhões de dólares.

Também nesta semana, o museu recebeu a maior doação em dinheiro de sua história: a família Rockfeller doou 200 milhões de dólares para a instituição.

Mostra reúne obras de Melvin Edwards no MAM da Bahia

Melvin Edwards, 'Boa sorte, primeiro dia'. (FOTO: Ding Musa)
Melvin Edwards, ‘Boa sorte, primeiro dia’. (FOTO: Ding Musa)

 

Mostra de Melvin Edwards, originalmente criada e apresentada no espaço auroras, em São Paulo, tem a sua segunda itinerância. Após ser exibida de agosto a outubro no Museu da República, no Rio de Janeiro, a exposição segue para o Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM-BA), onde tem abertura no dia 8 de novembro, das 19h às 22h. A iniciativa é parte da programação do projeto HuMAMnamente Negro, que celebra o mês da Consciência Negra. A individual de Melvin é uma realização do auroras em parceria com a instituição baiana, com apoio da galeria Almeida e Dale.

Relembre matéria de Marcos Grinspum Ferraz, publicada no site da ARTE!Brasileiros na ocasião em que a mostra esteve em cartaz no auroras:

Nos 15 dias que passou no Brasil para montar sua exposição no auroras – espaço independente sediado em uma casa no Morumbi, em São Paulo –, o artista americano Melvin Edwards, de 81 anos, teve um verdadeiro surto criativo. Não só produziu as 16 esculturas e instalações que integram a mostra, como pintou, no que seria o seu “dia de folga”, 12 aquarelas que também estão expostas na casa.

“Falei para o Melvin pegar leve, mas ele dizia que estava aqui para trabalhar”, conta Ricardo Kugelmas, 40, fundador e diretor do auroras. “O próprio galerista dele comentou que há tempos ele não criava tanto.” A produção foi tão prolífica que pela primeira vez uma mostra ocupa todos os espaços da casa, desde a sala e o jardim até a sala de projetos, o corredor e um dos quartos do piso superior.

O resultado são obras abstratas – compostas de correntes, ferramentas de ferro, arames farpados e peças de aço – que facilmente remetem à segregação, preconceito, violência racial e escravidão, apesar de certa resistência do artista em afirmá-lo. “Se a cortina de arames nos faz pensar no muro de Trump ou em um campo de concentração, o Melvin não diria isso. Ele fala, inclusive, que correntes podem ser vistas como elos de conexão”, afirma Kugelmas.

O artista em frente a uma das obras da mostra. FOTO: Ricardo Kugelmas

Em entrevista recente ao jornal Folha de S.Paulo, o artista ressaltou: “Expressar-se socialmente no trabalho é natural, nós criamos a sociedade. Meu trabalho é uma expressão social, e não protesto social. Não está limitado a isso”. Se de fato sua obra transcende essas questões, é impossível não lembrar que Edwards nasceu no Texas em 1937 e vivenciou na pele a intensa segregação racial que dominava o sul dos EUA.

Anos mais tarde intitulou sua mais conhecida e longeva série de obras de Fragmentos Linchados, em referência aos linchamentos sofridos pelos negros após a abolição da escravatura nos Estados Unidos. Em 1970, Edwards foi o primeiro artista afro-americano a realizar uma mostra individual no Whitney Museum of American Art, em Nova York, e a partir desta época se aproximou também das culturas africanas, tendo inclusive estabelecido um atelier no Senegal nos anos 2000.

Proximidade com o Brasil

Fragmentos Linchados, que começou a ser produzida nos anos 1960 e continua até os dias de hoje – no auroras há seis novas peças da série – foi tema da primeira individual de Edwards no Brasil, uma retrospectiva no MASP realizada no ano passado. Foi durante a montagem da mostra que o galerista do artista, Alexander Gray, propôs a Kugelmas realizar uma exposição no auroras, onde o artista poderia mostrar outras facetas de sua obra, com peças criadas no próprio Brasil.

Foto antiga do artista com um de seus “Fragmentos Linchados”

Os materiais foram todos comprados em São Paulo, como conta Kugelmas. “Ele adorou quando entrou no primeiro ferro velho. Disse que naquelas peças estava parte da história dos últimos 150 anos do Brasil. Mas, ainda assim, ele sempre afirma que sua maior preocupação não é com a origem dos materiais, mas sim com suas possibilidades plásticas, de compor algo novo em que por vezes nem reconhecemos os objetos”, conta Kugelmas.

A relação de Edwards com o Brasil não é de hoje. Em 1986, acompanhando a poeta e ativista Jayne Cortez, sua mulher à época, viajou por diversos cantos do país. Conheceu artistas como Emanoel Araujo – hoje diretor do Museu Afro, que tem no acervo obras de Edwards – e produziu, pouco depois, trabalhos que remetem ao país, como “Palmares” – que estava exposto no MASP e acaba de ser incorporado ao acervo do museu.

Arte em ambiente doméstico

Agora, é nos vários ambientes da casa modernista de Kugelmas, projetada por Gian Carlo Gasperini em 1957, que as obras de Edwards se espalham até o dia 16 de março. Fundado em 2016, o auroras é um espaço de arte independente que tem como proposta se diferenciar tanto de galerias quanto de museus. O próprio fato de estar sediado em uma casa – onde viveram os avós de Kugelmas e ele mesmo morou até recentemente – cria um ambiente bastante peculiar.

“É uma casa, tem afeto, tem uma escala muito humana. E vai meio contra tudo o que tem acontecido em São Paulo. O vizinho semana passada subiu um muro de 30 metros, o outro colocou quatro portões… e aqui a gente está abrindo a porta da casa, tentando convidar, trazer alunos de escola pública”, diz Kugelmas, que também montou no local uma biblioteca aberta com livros de arte. Neste sentido, apesar de criticar instituições que se preocupam mais com o número de visitantes do que com a formação de um público interessado – “especialmente museus americanos” –, o diretor do auroras diz que pretende trazer cada vez mais gente para o espaço.

“Se eu já abri minha casa e estou dedicando minha vida a isso, não estou fazendo nem para os meus amigos nem muito menos para a madame que mora aqui no bairro. Estou pensando nos artistas, nos jovens artistas, nos estudantes e no cara da escola pública aqui perto”, diz ele. Após se formar em direito e trabalhar em outras áreas, Kugelmas entrou no mundo das artes em 2006, quando foi convidado para ser diretor de estúdio do artista Francesco Clemente em Nova York.

O auroras foi criado em sua volta ao Brasil, em 2016, em grande parte por influência de Tunga. “Ficamos amigos e ele me dizia que, por já ter formado uma grande rede de contatos nos EUA, eu deveria voltar para o Brasil e fazer algo aqui. Dizia que o Brasil é mata virgem, que tem muita coisa para ser feita por aqui.” Numa coincidência infeliz, Kugelmas voltou dos EUA exatamente quando Tunga morreu. Decidiu nomear o espaço em homenagem ao artista, inspirado em sua série de aquarelas Quase Auroras.

A biblioteca do auroras, que fica aberta ao público. FOTO: Marcos Grinspum Ferraz

Para não ser um projeto totalmente pessoal, o fundador logo formou um conselho com artistas como Fernanda Gomes, Claudio Cretti, Lenora de Barros, Lucia Koch e Bruno Dunley, além de nomes de outras áreas como os músicos Arto Lindsay e Rômulo Fróes e profissionais do mundo editorial como Charles Cosac e Isabel Diegues. Em pouco mais de dois anos de funcionamento, a casa apresentou exposições individuais ou coletivas com nomes de peso como os brasileiros Flavio de Carvalho, Antonio Dias, Tunga, Carmela Gross, Leda Catunda, Jac Leirner, Paulo Monteiro e Emmanuel Nassar e os estrangeiros Robert Rauschenberg, Cecily Brown, Alex Katz e David Salle. A próxima mostra será do artista conceitual americano Tom Burr.

Os trabalhos por vezes estão à venda, o que ajuda a manter o espaço – que sobrevive sem patrocínios ou editais, ao menos por enquanto –, mas segundo Kugelmas isso não é critério para incluí-los nas exposições. “Como não há uma preocupação grande em vender, como numa exposição de galeria, nem uma preocupação tão grande com a carreira, digamos assim, como numa exposição em um museu ou grande instituição, o artista tem uma enorme liberdade criativa. Ele sabe que está num espaço de projetos, onde pode arriscar.”

O auroras fica aberto apenas aos sábados ou com agendamento prévio nos outros dias. Esse sistema diminui os custos e possibilita uma existência razoavelmente barata para o espaço. Em um momento em que as artes recebem cada vez menos apoio estatal e que mesmo grandes instituições culturais se veem ameaçadas, Kugelmas considera que espaços independentes terão um papel ainda mais importante, “quase de resistência”. “Acho que com o andar da carruagem, o jeito de sobreviver será atuar cada vez mais colaborativamente, com mais articulação entre artistas, curadores, galeristas, instituições, espaços de projeto… E também realizar cada vez mais pequenas ações, arregaçar as mangas e fazer acontecer”, conclui.

Melvin Edwards 

Até 16 de março de 20019
auroras –  Avenida São Valério, 426
Entrada gratuita