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EXPOSIÇÕES SÃO PAULO
Raylana, 2013
próprio ritmo. Após o dispendioso trabalho de domar pertencessem ao plano real – quase como visagens,
as cores e as luzes, o fotógrafo fada-se a abrir-se ao entes fantasmagóricos da cultura paraense.
acaso, ao diálogo. Ativamente espera e flana e, com um O projeto expográfico é consoante com os caminhos
conta-gotas, é agraciado com suas personagens ao conceituais propostos e instigados pelas obras. Nele,
longo de quatro décadas, que encontra e reencontra no as imagens elevam-se, numa espécie de suspensão
porto, no barco, na rua, no rio e em casa. À Espera de ideológica, reafirmando que não estão nem afixadas na
Rosa, à la Beckett: na obra de Luiz Braga, a persistência terra, nem alçadas aos céus, mas habitam esse campo
e a paciência andam de mãos dadas. fantasmagórico das imagens, num eterno “entre”: as
Nessa série de retratos em cor, reunidos pela primeira noções de material e imaterial, realidade e ficção, mate-
vez, o fotógrafo cria alegorias da vida cotidiana, onde o rialidade e abstracionismo são desafiadas, negando os
observador pode se identificar, no olhar do retratado, dualismos convencionais e transpassando-as como
com figuras distantes de sua realidade. Dessa forma, um dardo no exato momento em que rasga o véu – o
transforma os retratados em ideia, em personagens clique fotográfico. O espaço da exposição é pensado
idílicos, como as divindades da escultura tapajônica de forma que o espectador veja uma imagem de cada
ou as gravuras bíblicas de Gustave Doré – traçando um vez, paulatinamente, construindo um labirinto de planos FOTOS: CORTESIA DO ARTISTA / GALERIA LEME
caminho de matriz híbrida entre as tradições nativas e de madeira em que as fotografias são afixadas, que se
a cultura ocidental europeia. Ao ilustrar magicamen- assemelha à percepção labiríntica da floresta. Como
te episódios do dia a dia, Braga eleva a imagem dos a folhear um livro, vê-se uma imagem a cada vez, e
seus retratados a um patamar imaterial, como se não isso não só basta como transborda: em cada uma há
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