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REPORTAGEM CAPACITISMO E ACESSIBILIDADE





































            Espetáculo Devotees. João Paulo Lima, semi-nu, está de perfil e tem as duas mãos e o
            único joelho apoiados no chão, mantendo as costas alinhadas





            obras, permitiam que eles tomassem mais tempo, para   orçamento”, explica. “Isso pode acarretar num sucatea-
            que Ratão pudesse de fato admirá-las. Em outros casos,  mento”, acrescenta Moira, que também tem deficiência
            deparou-se com instituições que contavam com estru- visual, referindo-se a verba destinada aos recursos, que
            turas táteis que através de relevos o permitiam sentir os   muitas vezes é menor do que a necessária. “O recurso
            trabalhos, ou com espaços expositivos que liberavam   de acessibilidade é uma possibilidade que você está
            horários específicos para que pessoas cegas ou com   dando de um espectador usufruir aquela obra, então
            baixa visão pudessem tocar algumas esculturas e dessa   se você faz de qualquer jeito quer dizer que você não
            forma melhor compreendê-las.                    se importa com esse público”, pontua.
               Em sua experiência profissional, Leonardo Castilho   De forma a garantir uma melhor transmissão de seus
            nos dá outros exemplos sobre o estímulo artístico. Seja   conceitos e propostas estéticas, a performer e videoar-
            na peça Cidade de Deus - apresentada em linguagem   tista Estela Lapponi agiu de outro modo. Nas primeiras
            de sinais no Brasil e na França -, nas suas atividades   oportunidades com recursos, os construiu em diálogo
            como educador no Museu de Arte Moderna de São   com os profissionais da área e, em um de seus últimos
            Paulo (MAM-SP) ou nos shows de música - nos quais   projetos, o filme Profanação, fez da audiodescrição não
            trabalhou com a interpretação em Libras -, ele buscou   ferramenta de acessibilidade, mas linguagem, parte
            ir além da simples informação, permitindo que pessoas   constituinte da obra. Porém, ela aponta que essa res-
            surdas (como ele) tivessem acesso àquela arte em forma   ponsabilidade em alguns casos vai além dos produtores
            e conteúdo. Como explica Castilho, a acessibilidade   e artistas, está ligada às leis de incentivo e aos editais.
            precisa ir além do protocolar. Não se trata apenas de  “Penso que o que recebo ainda é muito pouco dependendo
            incluir Libras ou audiodescrição, mas de transmitir a   do projeto. Se não aumentar a verba, vai virar evento: é
            experiência estética que a arte propõe - o que envolve   um dia só de recurso, porque não consigo tê-lo sempre.”
            um refinamento dos recursos, um maior preparo sobre
            eles e uma consultoria constante com PCds. “Os reali- seJa bem-vinDo ao munDo bípeDe                  FOTOS: REPRODUÇÃO
            zadores de eventos dificilmente pensam em públicos   Esta postura, para Estela, tem uma raiz estrutural: vivemos
            mais amplos quando estão concebendo o projeto e o   em um mundo bípede. O termo está ligado ao conceito

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