Page 81 - ARTE!Brasileiros #53
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do próprio Renato, feitos em notas de roda-  estudo e compreensão do fenômeno “arte
                    pé – procedimento que enriquece muito essa   afro-brasileira” – simplesmente sumiria.
                    segunda parte do trabalho.                  Podendo abrir a guarda que encerra o
                                                             processo de formulação de suas concepções,
                       ***                                   Renato, felizmente, não escreveu uma “Obra”
                       É claro que não posso falar por todos   porque nunca se viu como “Autor”. Todo seu
                    os leitores e leitoras de Arte afro-brasileira:   objetivo foi demonstrar, a meu ver, que, tanto
                    Altos e baixos de um conceito, porém, creio   a experiência dos estudos e comentários
                    que caberiam mais algumas palavras sobre o   sobre a questão “arte afro-brasileira” assim
                    “livro”: em primeiro lugar, não tenho dúvida de   como o próprio seminário, são partes de um
                    que ele simplesmente não existiria se tivesse   único processo para avançar no conhecimento
                    sido enviado para ser produzido dentro dos   sobre a complexidade da produção artística
                    padrões de um livro tradicional. Configuran-  levada a cabo no país, sem almejar chegar a
                    do-se como um documento em pdf e ligado   uma única “verdade”.
                    à Creative Commons, Arte afro-brasileira:   Saio da leitura de Arte afro-brasileira: Altos
                    Altos e baixos de um conceito apenas pode   e baixos de um conceito com algumas postu-
                    manter sua imensa primeira parte porque não   ras mais sedimentadas, embora repletas de
                    dependia de uma editora e, portanto, não pre-  novas perspectivas. Ou seja, saio transfor-
                    cisava obedecer à “lógica” do mercado livreiro.   mado pela leitura, o que me faz voltar ao que
                    Livre dessas amarras, o texto conseguiu se   escreveu Barthes sobre a morte do autor e o
                    apresentar em toda a sua generosidade e   fim do conceito tradicional de “obra”:
                    potência criativa, assumindo uma liberdade
                    de produção e divulgação de conhecimento   […] Assim se revela o ser total da escrita: um
                    de fato acessível a todos  .             texto é feito de escritas múltiplas, saídas de
                                          [6]
                       Estou convencido de que, caso os originais   várias culturas e que entram uma com as
                    fossem para qualquer editora para serem   outras em diálogo, em paródia, em contesta-
                    publicados dentro das normas existentes,   ção; mas há um lugar em que essa multiplici-
                    toda aquela primeira parte seria suprimida e o   dade se reúne, e esse lugar não é o autor, […],
                    que teríamos seria uma versão resumida dos   é o leitor: o leitor é o espaço exacto em que
                    anais do evento ocorrido da Pinacoteca. Ou   se inscrevem, sem que nenhuma se perca,
                    seja, a parte mais fraternal do escrito – aquela   todas as citações de que uma escrita é feita: a
                    em que Renato abre seu arquivo de notas e   unidade de um texto não está em sua origem,
                    comentários, explicitando seu processo de   mas no seu destino […]
                                                                                 [7]






            [1] – Em tempo: o Seminário “Olhares sobre a arte afro-brasileira”   afro-brasileira e seus artistas [cinco subdivisões]; 4.0 Arte
            (ocorrido entre 5 de novembro e 3 de dezembro de 2016, dava   afro-brasileira: esboços teóricos e estudos de caso [quatro
            continuidade às atividades levadas a cabo pela Pinacoteca de São   subdivisões]; 5.0 Miscelânia [três subdivisões]; 6.0 E agora,
            Paulo a partir da mostra “Territórios: artistas afrodescendentes   José?; 7.0 Referências; 8.0 Apêndices: um evento sobre arte
            no acervo da Pinacoteca. Pinacoteca de São Paulo (Pina Estação),   afro-brasileira [onze subdivisões]; 9.0 Anexos [três subdivisões].
            ocorrida entre dezembro de 2015 e abril de 2016.  [5] – Sim, a maioria deles pode ser descrita como Autor, no sen-
            [2] – “A morte do autor”, in Barthes, Roland. O rumor da língua.   tido que Barthes deu ao termo. E isso não é responsabilidade de
            Lisboa: Edições 70 Ltda., 1987. Pág.51.          Renato Araújo.
            [3] – Idem. Pág. 51/52.                          [6] – A falta de uma editora convencional por trás da escrita de
            [4] – Aqui vão as partes de Arte afro-brasileira: Altos e baixos   Renato Araújo só é sentida, na verdade, pela ausência de uma
            de um conceito: 1.0 As ondas de valorização Institucionais   edição que retirasse alguns poucos problemas de revisão do texto,
            do negro [com duas subdivisões]; 2.0 Arte afro-brasileira e   algo, no entanto, facilmente corrigível.
            o problema de sua definição [quatro subdivisões]; 3.0 A arte   [7] – Barthes, Rolando. Op.cit. Pág. 53.

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