Page 70 - ARTE!Brasileiros #52
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REPORTAGEM DECOLONIALIDADE
nos últimos anos, o debate sobre preconceitos questões que permeiam asiático-brasileiros não são
e inclusão de minorias passou a ocupar um espaço novas”, começaram muito antes e vão muito além
crescente no circuito das artes. Porém, ainda pouco do vírus.
se ouve sobre a inclusão (ou exclusão) de pessoas Na edição #51 da arte!brasileiros, Luciara Ribeiro
asiático-brasileiras nesses ambientes. trouxe uma reflexão sobre o assunto: “Precisamos
Em um mundo que foi surpreendido com uma pan- sempre nos perguntar o porquê de racializarmos deter-
demia em 2020, o fato de o coronavírus (Covid-19) ter minadas populações e atribuírmos a elas termos espe-
tido início na China gerou um movimento xenofóbico cíficos, como afro-brasileiras, indígenas brasileiras
ao redor do globo com pessoas de diferentes ascen- ou asiático-brasileiras: será porque reconhecemos a
dências asiáticas. No Brasil, não foi diferente. Porém, chamada arte euro-brasileira como sendo apenas arte
como destaca a artista transdisciplinar Cyshimi, “as brasileira?”. Para Shima, vencedor do Prêmio pipa 2013,
este é um ponto essencial da discussão. “Nasceremos
e morreremos asiáticos no Brasil, por mais brasileiros
que nos sintamos. Sei que jamais serei convocado para
representar uma ‘arte brasileira’”, afirma.
Nesta edição, decidimos olhar especificamente
para a arte brasileira feita por asiático-brasileiros, os
preconceitos que a envolvem, a luta que a permeia e
suas possibilidades. Para introduzir essa discussão,
conversamos com artistas, pesquisadores e curadores
de diferentes ascendências.
existe preConCeito Com asiátiCo-brasileiros?
A Ásia é o continente mais extenso e o que apresenta
a maior densidade populacional no mundo. São 50
países com diferentes fenótipos, etnias e culturas.
Porém, como destacam artistas e militantes, no Brasil
ainda há uma associação direta de Ásia com o Japão
e uma redução ao Leste Asiático. “A homogeneização
de etnias asiáticas carrega traços do colonialismo ao
simplificar e objetificar corpos, identidades e culturas
diversas e, com isso, motiva a perda de memória e
assimilação de povos”, explica a artista, pesquisadora
e curadora Caroline Ricca Lee. Juily Manghirmalani,
artista audiovisual e pesquisadora de cinema bolly-
woodiano, destaca que é por essa homogeneização
que comumente as pessoas se esquecem que há
também no espectro asiático e asiático-brasileiro,
pessoas de origem indiana, do Sudeste Asiático e do
Oriente Médio.
Para Youssef Cherem, pesquisador e professor de
história da arte do Oriente Médio da Universidade Fede-
ral de São Paulo (Unifesp), essa redução está ligada
Obra de Singh Bean põe em foco o olhar exótico sobre
asiáticos e a presença da espiritualidade na concepção a uma falta de conhecimento popular da cartografia
de ancestralidade da artista mundial. Juily faz coro. Em sua visão, a arte pode ter
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