Page 73 - ARTE!Brasileiros #52
P. 73

sofredor. Não quero estar nesse lugar de totem apenas,  aqui na arte!brasileiros é apenas um pequeno passo
            não sou só isso, também mereço um lugar pra falar do   em direção a esses diálogos.
            que eu quiser”, explica. A artista conta que já questionou   Youssef complementa que é preciso criar esses
            a si mesma sobre a relevância de seu trabalho, “como   diálogos de forma crítica e aprofundada, para além de
            se só tivesse relevância se fosse político”, mas percebe  “discursos açucarados”. Para isso, a arte pode ser um
            que essa não é uma cobrança para pessoas brancas.   caminho, avançando nas discussões de forma mais
               Para Caroline e Dudu, uma forma de evitar esse olhar  hermética e próxima, como propõe Cyshimi: “Acredito
            fetichista ou limitante sobre os corpos dissidentes é a   que essa seja uma das minhas coisas preferidas no fazer
            presença de pessoas não brancas na curadoria e no   da arte, pela forma como assuntos políticos e herméti-
            comando das instituições. Ao que o curador Yudi Rafael   cos se tornam mais próximos, humanos e reais, o que
            complementa: “Se um trabalho sistemático não está   abrange e pluraliza o imaginário sobre certo assunto”.
            sendo feito por instituições de arte no Brasil, nesta área,
            o que existe hoje, em termos mais engajados, são inicia-
            tivas independentes que estão articulando um campo
            de questões e construindo plataformas para discuti-las”.

            sob um olhar CrítiCo e DissiDente
            Para Yudi, entender essa pluralidade e a questão asiá-
            tico-brasileira envolve pesquisa e diálogo por parte
            de curadores e instituições. “Sem uma perspectiva
            histórica e crítica, se ‘confunde’ asiático-brasileiro
            com asiático. Falta então um entendimento de que falar
            sobre asiaticidades brasileiras é falar do Brasil”, explica.
               Nesse aspecto, torna-se necessário ampliar os
            entendimentos sobre as relações raciais no Brasil,
            entendendo que o mito das três raças não faz sentido
            quando temos tantas etnias plurais compondo o país.
            “Não passamos pelo racismo estrutural que pessoas
            pretas passam, mas obviamente não somos pessoas
            brancas”, diz Cyshimi. Ao que Caroline complementa:
            “É fato que a sociedade brasileira é uma população de
            maioria negra e terra pertencente aos povos originários,
            com isso é preciso que tais narrativas sejam sempre
            privilegiadas e enaltecidas. A solidariedade antirracista
            necessita ser uma prática aplicada de forma cotidiana”.
            Ambas concordam que só a partir de uma solidariedade
            antirracista será possível compreender como as ques-
            tões asiático-brasileiras se dão no território brasileiro.
               Nesse sentido, Juily acredita que “o momento de
            reconhecimento étnico que estamos vivendo através
            do pertencimento e orgulho de nossas origens, tão
            diferente de gerações anteriores que foram colonizadas
            a terem vergonha e medo, é algo ainda muito recente. É   Na instalação Membro Fantasma, Caroline Ricca Lee faz um
            preciso ensinar, abrir canais de conversa, fazer alianças,   processo de resgate perante memórias negadas. A obra pauta a
            crescer em comunidade”. Neste sentido, esta conversa   memória trazida na diáspora que não é vista, mas pode ser sentida

                                                                                                         73
   68   69   70   71   72   73   74   75   76   77   78