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SEMINÁRIO INTERNACIONAL DIA 2



            como a bienal e os museus, para estas ques-           Em videoconferência do Goethe-
            tões: “Para que artistas como Edgar nos               Institut, o argentino Osías Yanov e a
            mostre como, num ícone da modernidade                 brasileira Castiel Vitorino falaram sobre
            brasileira, está implícita a negação de um            as obras que exibiram em Berlim
            conhecimento, que foi segregado durante
            anos”, argumenta Agustín.                             por eDuarDo simões
               O curador em seguida mencionou o traba-
            lho de Antonio Pichillá, também da Guatemala,         para Complementar o seminário aberto, o
            apresentado na mostra berlinense: o vídeo             Goethe-Institut Rio realizou também uma video-
            Ação de um personagem árvore, em exibição             conferência especialmente organizada para um
            no Gropius Bau, que abriga o segmento O               grupo de convidados que não conseguiram viajar
            museu invertido da bienal, uma tentativa de           na ocasião da abertura da 11a Bienal de Berlim, em
           “contra-narrativa” à perspectiva eurocêntrica       ESTRATÉGIAS DO POSSÍVEL  setembro. Dentre eles, curadores, artistas e gestores
            sobre a arte. “Para entender como esta visão          de diferentes museus e das diferentes unidades
            colonial é perpetuada pelas instituições”, disse      do Goethe-Institut da América latina. Neste dia
            Agustín, citando o Humboldt Forum, espaço             participaram, além dos curadores, os artistas Osías
            museológico que será aberto ainda este ano            Yanov (Argentina) e Castiel Vitorino (Brasil).
            em Berlim.                                                Em Berlim, Osías participou do espaço dedi-
               Agustín também criticou a recepção das             cado a experimentações da mostra, o ExRotaprint.
            obras por parte de jornalistas alemães: “Eles         Parte de seu projeto foi comprometido pelas
            só podem ver a etnografia destes trabalhos e          restrições sanitárias da pandemia, entre eles
            não conseguem considerá-los a partir de uma           seus exercícios grupais, que já fizera na Argentina,
            raiz filosófica, estética e artística como traba-     numa reflexão sobre a repressão dos corpos,
            lhos contemporâneos. Ou, para eles, são obras         entre outras questões.
            com algo de esotérico. É muito interessante               O artista buscou manter o necessário contato
            ver que todos estes críticos e a cultura alemã        à distância com seu grupo de performers, que
            deixaram que este racismo e esta maneira de           faziam desenhos e liam contos. Os resultados
            ver a alteridade fossem perpetuados, a partir         foram apresentados na bienal, junto a elementos
            de sua etnografia eurocêntrica”, afirmou. “E          caros à sua pesquisa artística: colheres - cuchari-
            como na Alemanha o esoterismo está muito              tas - que remetem ao ato de dormir abraçado com
            próximo da extrema direita, preferem quase            alguém, e apareceram em formas escultóricas, e
            não falar destes trabalhos”.                          o sal - substância ligada à noção de purificação e
                                                                  cura. Por meio de alto-falantes, o registro sonoro
            Demolição, retribuição                                das leituras fazia vibrar mesas de acrílicos no chão,
               Como evitar, então, o extrativismo de bienais      criando desenhos no sal em contato com elas.
            e outros eventos culturais? Como o quarteto              Lisette Lagnado ressaltou a importância da escuta
            curatorial da mostra de Berlim lidou com a            no trabalho de Osías e mencionou outra experimen-
            questão? “O patriarcado, as mazelas colo-             tação feita em ExRotaprint com o coletivo feminista
            niais, estão nos sufocando, e temos que reagir        fCnn, que discutiu o espaço institucional que a arte
            mesmo com violência. Por outro lado, há uma           deixa para jovens artistas mães, que não têm onde
            questão do cuidado. Então, como ser violento          deixar seus filhos. A presença da mulher na bienal,
            e, ao mesmo tempo, acolher outras vozes e             em luta contra o patriarcado, também é um dos temas
            estas vidas mais vulneráveis? O que sempre            importantes da exposição. Em Berlim, a curadora teve
            me guia é um misto de intuição com ética. E           a oportunidade de ler um livro sobre maternidade,
            nesse sentido escutar tem sido nossa bússola”.        da egípcia Iman Mersal, que trazia a ideia de uma
            Para Agustín, além da escuta, uma maneira não         criança destruir os possíveis devires da mãe, com
            extrativista seria entender que você toma algo,       a pressa de alcançar o novo mundo. “Era algo que   FOTOS CORTESIA DOS ARTISTAS
            mas também retribui. “A ideia de  restituição,        estávamos sentindo em relação à bienal, diante da
            com os artistas, as comunidades, os museus            pandemia, e tomamos emprestado esta noção de
            vulneráveis”, concluiu.                               rachadura, fissura, para o título.”

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