Page 51 - ARTE!Brasileiros #47
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SÓ SE ME DORMIREM, 2018, PERFORMANCE DE KARLLA GIROTTO
grupos de uma vanguarda política. Foi construído um passaram por aqui várias gerações, inclusive muitas
prédio de arquitetura modernista, tinha uma escola pessoas que já morreram, mas a gente tem esse acervo,
experimental e um teatro brechtiano. Então a Casa nos esse arquivo, que é o núcleo duro da Casa, que conta sua
condena a ousar. Ela nos pede para fazer diferente”. história”, diz Marilia Loureiro, curadora e programadora
Diferente, inclusive, do que se fazia ali nos anos 1940 e da instituição. O próximo passo é a restauração do TAIB,
1950, em um contexto radicalmente diferente. “Quando hoje bastante degradado, em um planejamento que já
a Casa abriu havia dois ou três centros culturais na está em estágio avançado.
cidade. Hoje só o bairro tem a Pinacoteca, a Oficina O jornal Nossa Voz, símbolo da instituição, foi relan-
Cultural Oswald de Andrade, o Sesc Bom Retiro, a Sala çado em 2014 e é publicado anualmente com textos
São Paulo, o Teatro Porto Seguro, o Museu de Arte sobre temas atuais e colaborações de artistas e inte-
Sacra e o Teatro de Container. Então a gente ia fazer lectuais. No último número, de 2018, a capa estampa o
mais um lugar com exposições, temporada de teatro e Manifesto Herzog Vive!, publicado pelo grupo Judeus
shows? Não, quisemos fazer outra coisa”, explica. “Até pela Democracia no período das eleições em reação à
porque esses espaços são fundamentais, mas acho ascensão conservadora e à possibilidade da eleição de
que não dão conta de uma série de práticas artísticas Bolsonaro. Na página seguinte, a transcrição da fala
contemporâneas. Porque eu acho que muitas vezes eles feita pelo escritor israelense Amós Oz em junho de
separam um tanto a cultura das outras esferas da vida.” 2017, quando esteve no local, evidencia um pouco do
Hoje, com os coletivos e uma programação dividida entre espírito – passado e presente – da Casa do Povo: “Eu
o que a Casa organiza e o que ela acolhe, o orçamento realmente me sinto em casa. Aqui é o lugar certo para
anual passou dos R$ 60 mil, em 2011, para R$ 1,2 milhão, começar uma revolução, ou, pelo menos, como disse
captados entre leis de incentivo, editais, contribuições
minha amiga Lilia Schwarcz, o lugar certo para planejar
FOTOS: CAMILA SVENSON | ADMA MACENA de arrecadação – como o show de Caetano Veloso em do que executá-la”, brincou. Se não será o epicentro da
a revolução. Porque é sempre mais agradável planejá-la
dos grupos e associados, locações e um evento anual
revolução, a Casa é, retomando a afirmação de Seroussi,
2018. A biblioteca da instituição, após 40 anos fechada,
um lugar para se ensaiar outros futuros possíveis. “E
foi reativada no último mês de maio, representando mais
tudo que acontece aqui hoje confirma que os nossos
um grande passo para a Casa no sentido de retomar sua
história e, ao mesmo tempo, se abrir à sociedade. “Já
desejos não eram loucura”, conclui o curador.
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