Page 72 - ARTE!Brasileiros #41
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INSTITUIÇÃO ENTREVISTA JOCHEN VOLZ






             olhando para a arte desenvolvida por artistas   escala enorme. Há por exemplo um conjunto de
             mulheres dos anos 1960 até 1985. Um período   dez grandes telas, pinturas que tem 3,50 por 2,40
             claramente definido em que as artistas mulheres   metros de dimensão. Na história da arte, demo-
             assumiram cada vez mais um protagonismo den-  rou ainda muito tempo até chegar nessa escala.
             tro da reinvenção da arte. O que é muito bonito   E ela desenvolveu uma prática extremamente
             nessa exposição é que ela mostra claramente que,     interessante, baseada numa exploração serial. É
             embora muitas tenham sido ativistas solitárias,   muito impressionante.  Quando ela faleceu, em
             elas não estiveram sozinhas. Fazem parte de um   1944, pediu em testamento que não mostrassem
             grupo de pessoas, de uma pesquisa, bem maior do   esse trabalho por mais vinte anos para ninguém.
             que uma conquista individual de cada uma delas.   Ficou trancado até os anos 1960. A família quis
                                                         doar esse trabalho todo para o Pontus Hultén, que
             Uma arte fora dos paradigmas?               era o diretor do Moderna Museet de Estocolmo.
             Vejo que essa exposição tem um papel, por isso   Ele não entendeu a história de uma mulher que
             a gente está fazendo este esforço de trazê-la   fazia figura abstrata antes do Kandinsky e deixou
             para cá, em sua única itinerância para América   passar. O material ficou meio desconhecido até
             Latina. Podemos destacar três aspectos muito   os anos 1980. A partir daí algumas obras come-
             interessantes. Um deles é o fato de olhar para a   çam a circular, mas só em 2013 ocorre a primeira
             arte feita por artistas mulheres neste período;   retrospectiva mais sistemática de sua obra, que
             outro é o destaque dado para as mídias e formas   foi feito pelo próprio Moderna Museet de Esto-
             de expressão que foram inventadas por essas   colmo. Tem alguns eixos na pesquisa dela, a ideia
             artistas, que hoje a gente entende como parte   da serialidade, das cores, da geometria, a ideia
             do nosso vocabulário, mas que na verdade des-  de se entender cada vez o mundo de uma forma
             conhecemos a fonte. Por último, talvez esta seja   mais plural e cosmológica, que permite um diálogo
             uma das maiores exposições já feita sobre a arte   extremamente interessante com a arte brasileira.
             latino-americana. Ela não olha a arte colombiana, a   Enfim, foi uma artista sobre quem sempre fiquei
             arte brasileira, a arte chilena, enfim. Ela realmente   curioso e agora abriu-se essa possibilidade de
             conta uma história de uma geração, dentro de um   trazê-la, com uma nova exposição, curada por nós.
             continente, um conjunto cultural, de uma forma
             extremamente ampla, algo que raramente se vê.   Foi idealizada para a Pinacoteca?
                                                         É. Uma curadoria minha junto com diretor do
             Você destacaria mais alguma exposição da programação?  Moderna Museet de Estocolmo e em colaboração
             Acho que o outro destaque será a próxima grande   com a Fundação Hilma af Klint. A gente fez uma
             exposição, que abre depois do Di Cavalcanti: uma   nova curadoria para cá que busca esse diálogo
             retrospectiva de Hilma af Klint, uma sueca, que se   com a história da arte brasileira. Apresenta por
             formou nos anos oitenta do século XIX, momento   um lado a pesquisa da Hilma para um publico
             em que muitas coisas não são visíveis se tornaram   brasileiro e latino-americano pela primeira vez,
             visíveis, como o raio x, o radio, etc. Ela começou a   mas também é uma tentativa de trazer um outro
             se comunicar com energias, criou técnicas de dese-  olhar para o trabalho dela onde talvez o diálogo
             nho automático, para explorar esse campo não   com a arte brasileira possa acrescentar alguma
             explorado ainda de uma forma muito inovadora.   coisa além da leitura dela própria.
             E, no início do século XX, começou a desenvolver
             uma arte “abstrata” extremamente revolucionária.  Uma coisa alimenta a outra?
                                                         A história da arte não é só linear. E a arte brasileira
             Precoce não?                                pode abrir caminhos para entender o trabalho de
             Super precoce. Antes de todo mundo. Foi uma das   uma Hilma embora ela não tenha diálogo biográ-
             pioneiras. E mais surpreendente, trabalhou numa   fico nenhum com a América Latina ou o Brasil.


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