Page 93 - ARTE!Brasileiros #40
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ACIMA,  UM  SAGRADO  LUGAR  DE
                               ERNESTO NETO. À DIREITA, BRESIL
                               (GUARANI) DE ABDOULAYE KONATE.





















                               Se há um eixo a ser notado na seleção de Macel, é o que trata   globalizada do circuito da arte dançando ao lado dos Huni
                               de obras, com pouquíssimas exceções, que evitam qualquer   Kuin, como se estivessem no Carnaval. Contudo, isso não
                               sofisticação tecnológica e são constituídas por uma fatura   desautoriza a relação constante que Neto vem desenvol-
                               manual, como na produção de Lai. Em certo sentido, com   vendo com os índios, e como seu trabalho vem crescendo
                               o excesso de conectividade do mundo contemporâneo e   com essa parceria, especialmente em um momento que,
                               dependência absoluta das telas digitais, isso até representa   no Brasil, se tornou política governamental o genocídio
                               um certo alívio, uma espécie de fuga para o essencial.   das populações indígenas.
                               Nesse contexto, a instalação de Ernesto Neto se sobressai.   Esse caráter quase artesanal da mostra é visto também
                               Primeiro pela magnitude que suas obras vêm assumindo   nas obras da mexicana Cynthia Gutierrez, nos desenhos
                     FOTOS: FRANCESCO GALLI | ANDREA AVEZZÙ  que acabam vinculando ao seu trabalho um caráter político,   Hicks, com seus grandes novelos de lã, a obra mais foto-
                                                                           enlouquecidos e deslumbrantes do tcheco Lubos Plny,
                               nos últimos anos, mas especialmente pelas relações que
                                                                           uma das revelações da Bienal, na produção de Sheila
                               o artista vem desenvolvendo com os Huni Kuin, do Acre, e
                               em defesa da dignidade dos povos indígenas.
                                                                           grafada desta edição, e em Abdoulaye Konaté, com seu
                               A instalação de Neto chegou a ser muito criticada em
                                                                           painel Guarani, criado para o Festival Sesc_Videobrasil, em
                                                                           2015. São alguns exemplos entre muitos possíveis de um
                               jornais estrangeiros por apresentar uma faceta exótica do
                               Brasil, como se a performance com os índios na abertura da
                                                                           procedimento que de fato se repete ao longo da mostra.
                               exposição fosse semelhante aos índios expostos em jaulas
                                                                           No entanto, a impressão final é que Macel olhou muito
                               no século XIX. De fato, foi um tanto chocante ver a elite
                                                                           para trás, mas não deu conta de falar do agora. Com tantas
                                                                                                                     93

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