À frente, "Distraídos Perderemos", de Kauê Garcia. Foto: Marcos Ferraz

Entrelaçando trabalhos de mais de 30 artistas e coletivos atuantes principalmente nas últimas duas décadas, a mostra Estamos Aqui apresenta alguns eixos temáticos principais: em primeiro lugar, a relação com o território, destacadamente aquele onde a própria unidade do Sesc Pinheiros está inserida, na região paulistana próxima ao Largo da Batata; junto a isso surge o debate sobre o espaço público, seus usos, carências e as constantes disputas políticas que o marcam, além da possibilidade de transformação e melhoria urbanas; por fim, tudo está conectado pelo fato de todos os participantes da mostra terem ligações com espaços e plataformas independentes de arte, o que destaca a existência de um circuito pujante – mesmo que tantas vezes invisibilizado – que não é composto por grandes instituições e galerias.

Com organização do Ateliê397 – um dos mais longevos espaços independentes de arte de São Paulo, criado há quase 20 anos – e curadoria de Thaís Rivitti, a exposição fica em cartaz até 24 de abril no Sesc Pinheiros e apresenta uma produção de forte tônica política e social. “Esses espaços são pólos aglutinadores em torno dos quais os artistas podem discutir projetos e realizar obras mais experimentais. É preciso reconhecer que há vários circuitos dentro do sistema da arte”, afirma Rivitti. “E claro que não são sistemas que não se conversam. Por exemplo, o Jaime Lauriano, ele está lá e cá, num grande sistema e também no independente.” Para além do Ateliê397, Rivitti cita como exemplo desses espaços a Casa da Xiclet, que é ao mesmo tempo ateliê, local expositivo, galeria “e um ponto onde as pessoas se reúnem para tomar cerveja e conversar”.

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Cena de “ESTÃO VENDENDO NOSSO ESPAÇO AÉREO”, 2004, do coletivo Bijari. Foto: Divulgação

Pensar o espaço público pode se dar tanto através da ação de artistas que intervém diretamente no ambiente urbano – como mostram os vídeos dos coletivos Bijari e a Revolução Não Será Televisionada -, como também obras que tratam do assunto sem ações diretas, através do espaço virtual, de entrevistas em áudio, câmeras de vigilância ou imagens apropriadas. Mas, em um caso ou no outro, todos possuem preocupações em comum: “Uma ideia de entender a arte como algo que tem um compromisso dessa ordem política. Não como algo apartado da cidade e do tempo em que a gente vive, mas que reflete sobre as questões importantes do nosso tempo”, diz Rivitti. “Acho que isso é um pressuposto tanto do Atelie397 quanto dos outros espaços com os quais a gente foi construindo essa rede.”

À frente, obra de Raphael Escobar; ao fundo, “Biroska Lanches”, de Chico Togni e Kadija de Paula.

Outro aspecto marcante da mostra no Sesc Pinheiros é a expografia, assinada por Edu Marin, em projeto que dialoga com um debate corrente no circuito independente. O questionamento da ideia do cubo branco e a desconstrução de modos convencionais de expor se dão por meio de estruturas abertas, sem paredes ou painéis, priorizando a transparência – inclusive a visão dos versos das obras – e uma circulação mais livre. “A desconstrução do cubo branco é importante pois, apesar de uma suposta neutralidade, ele tem toda uma carga ideológica, uma aposta numa ideia de arte apartada do mundo, que tem que ser contemplada por suas relações internas autônomas”, explica Rivitti.    

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“32 formas de gravar resistência”, 1999, de Rebeca Ramos

Todo o debate presente não deixa de nos remeter às dificuldades vividas pelos espaços de arte – nas mais diferentes instâncias – no Brasil governado por Bolsonaro, onde o ataque à área cultural se mostra cada vez mais forte. “A ameaça é geral, mas, pensando neste circuito independente, tudo o que nós ajudamos a construir durante governos passados – com o Ministério da Cultura, a ideia de acesso à cultura e um pensamento sobre a nossa própria rede econômica – foi simplesmente jogado no lixo. Todas as formas de fomento, inclusive. E então nesse novo cenário, infinitamente pior, estamos aprendendo a fazer outras articulações, inclusive com a iniciativa privada”, diz a curadora. “Mas, sim, há um desmonte geral e o que era muito difícil está agora no limite do impossível.”

O título Estamos Aqui, portanto, se abre para diferentes interpretações e leituras: da ideia de “estamos aqui resistindo”, como sinaliza o trabalho 32 formas de gravar resistência, de Rebeca Ramos ou o filme do coletivo Foi à Feira – que mostra a resistência de povos indígenas ao longo do tempo; ao fato de “estarmos aqui” constantemente ocupando, atuando e transformando territórios. “Me lembra até aqueles mapas que dizem ‘você está aqui’, brinca Rivitti, ressaltando ainda que as coisas são temporárias, transitórias, e que podemos estar cada hora em um lugar. Por fim, “Estamos Aqui é uma afirmação de todo um circuito, de uma multidão de pessoas que estão discutindo, fazendo e pensando arte e que ficam tantas vezes invisibilizadas”, conclui a curadora.

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Cena de “O Castelo”, 2015, filme de Alexandre Wahrhaftig, Guilherme Giufrida, Helena Ungaretti e Miguel Antunes Ramos. Foto: Divulgação

Além dos artistas já citados, participam de Estamos Aqui: Alexandre Wahrhaftig, Guilherme Giufrida, Helena Ungaretti, Miguel Antunes Ramos; ali: leste; Aline Motta; Ana Matheus Abbade; Bruna Kury; Bruno Baietto; C. L. Salvaro; Chico Togni & Kadija de Paula; Erica Ferrari; Guillermina Bustos; Heloisa Hariadne; Isabela Alves; Jaime Lauriano; Kauê Garcia; Laixxmo; Lícida Vidal; Luana Lins; Manuela Costa Lima; Mari Nagem;   Natalie Braido; Pedro Gallego; Raphael Escobar; Raphael Franco; Sergio Pinzón, Serigrafistas Queer e Yiftah Peled. 

SERVIÇOOcupação Estamos Aqui
ONDE: Sesc Pinheiros – Rua Paes Leme, 195
QUANDO: De 12 de janeiro a 24 de abril de 2022
Terça a sábado, das 10h30 às 20h30. Domingos e feriados, das 10h30 às 18h30
QUANTO: Entrada gratuita

*Para entrada na unidade é necessária a apresentação de certificado de vacinação contra a Covid-19 com as duas doses ou dose única.


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