"DAS AVÓS", 2019, videoinstalação de Rosana Paulino. Foto: Videobrasil.
"DAS AVÓS", 2019, videoinstalação de Rosana Paulino. Foto: Videobrasil.

No novo episódio do Acervo Comentado VB, a filósofa Alice Lino, professora de filosofia da Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), no Mato Grosso, e pesquisadora de estéticas ameríndias e afro-brasileiras, comenta a obra Das avós (2019), de Rosana Paulino [1], descrita como “uma artista que vem se firmando como uma das principais de sua geração por sua capacidade em plasmar rigor estético/artístico aos questionamentos sobre a história dos afrodescendentes no Brasil e também sobre uma história da arte que se pretende hegemônica no país”, como colocou o crítico Tadeu Chiarelli.

Na obra em questão, Lino descreve que a performer Charlene Bicalho “entra no cenário completamente coberto de branco carregando com muito cuidado, envolto em um pano também branco, a sua ancestralidade”. Para a professora, o gesto é uma referencia à violência pela qual as mulheres negras aqui escravizadas passaram. Diante desse passado cruel, Bicalho abre o tecido branco, dentro do qual estão impressas, em transparência, imagens dessas mulheres negras, o que reverencia, então, a sua ancestralidade nesses termos. A performer, com cuidado, paciência e afeto, passa a costurar essas imagens junto à sua vestimenta que também é branca.

“Eu chamo atenção aqui pro fato de uma construção política da mulher negra quando ela se reconhece a partir da história de sua ancestralidade”, atenta Lino, completando que: “Ademais vale notar que há uma tessitura de um afeto, ela olha com muito carinho para as imagens que ela traz para próximo de si. Há na performance, portanto, a reconstituição desse afeto também direcionado à mulher negra. Onde há violência, não há afeto. A Rosana Paulino, portanto, subverte essa imagem assegurando essas mulheres negras o nosso respeito pela luta travada até os nossos tempos”. Para a filósofa, quando Charlene se levanta no final do vídeo, seu gesto simboliza, com altivez, a tomada de posição pela personagem para enfrentar o racismo cotidiano pelo qual as mulheres negras passam.

"DAS AVÓS", 2019, videoinstalação de Rosana Paulino. Foto: Videobrasil.
“DAS AVÓS”, 2019, videoinstalação de Rosana Paulino. Foto: Videobrasil.

Ainda não conhece o Acervo Comentado?

Acervo Comentado Videobrasil é uma parceria entre arte!brasileiros e a Associação Cultural Videobrasil. A cada 15 dias publicamos, em nossa plataforma e em nossas redes sociais, uma parte de seu importante acervo de obras, reunido em mais de 30 anos de trajetória. Confira os outros episódios neste link.

Sobre Videobrasil

A instituição foi criada em 1991, por Solange Farkas, fruto do desejo de acolher um acervo crescente de obras e publicações, que vem sendo reunido a partir da primeira edição do Festival de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil (ainda Festival Videobrasil, em 1983). Desde sua criação, a associação trabalha sistematicamente no sentido de ativar essa coleção, que reúne obras do chamado Sul geopolítico do mundo – América Latina, África, Leste Europeu, Ásia e Oriente Médio –, especialmente clássicos da videoarte, produções próprias e uma vasta coleção de publicações sobre arte.

Este projeto contribui para “redescobrir e relacionar obras do acervo Videobrasil, e vertentes temáticas, na voz de críticos, curadores e pensadores iluminando questões contemporâneas urgentes”, afirma Farkas.


[1] Além de artista visual, pesquisadora e educadora, Paulino é doutora em artes visuais pela USP, com especialização em gravura pelo London Print Studio. Foi bolsista da Fundação Ford e da Capes, e em 2014, foi agraciada com a bolsa para residência no Bellagio Center, da Fundação Rockefeller, em Bellagio, Itália. Participou das individuais Atlântico Vermelho, na Galeria Superfície (2016), Mulheres Negras – Obscure beauté du Brésil, no Espace Fort Grifoon, Besançon (2014), Tecido Social, na Galeria Virgílio (2010); e das coletivas South­South: Let Me Begin Again, Cidade do Cabo, África do Sul (2017), La Corteza del Alma, Madri (2016) e Territórios: Artistas Afrodescendentes no acervo da Pinacoteca, São Paulo (2015), entre outras

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