Obra de Elvys Chaves e Carlo Schiavini exposta no Parque Cultural Casa do Governador, no Espírito Santo
Elvys Chaves e Carlo Schiavini, Geoescultura Cybernética. Foto: Leandro Pereira

Existe um crescimento no ambiente cultural de certos estados do Brasil, como Ceará e Espírito Santo, com o surgimento de novos equipamentos públicos como o Complexo Cultural Estação das Artes e o Museu da Imagem e do Som, ambos no Ceará, e o Parque Cultural Casa do Governador, em Vila Velha, no Espírito Santo, todos inaugurados em 2022.
Em Vila Velha, o novo parque ocupa a antiga residência de praia do governador, uma casa modernista em frente a uma praia particular. A vista lá é invejável e, com o parque de esculturas, o local lembra um dos espaços de arte na Europa celebrado por sua inserção na natureza, o Museu de Arte Moderna de Louisiana, na Dinamarca.

Aberto em maio passado, por enquanto apenas com visitas agendadas, o lugar conta com 21 esculturas realizadas como site specific, sendo dez temporárias e 11 permanentes, a um custo de R$ 2 milhões. As obras foram selecionadas após um edital nacional, que contou com a inscrição de 234 propostas. Há uma mistura entre artistas locais, como Geisa Silva e Natan Dias, e de outros estados, como Estela Sokol, de São Paulo, e a mineira Marilá Dardot, que vive no México.

A obra de Marilá é das mais poéticas. Ela instalou placas que, ao invés de conterem típicas frases informativas, reúnem citações de livros de autores e autoras com ampla diversidade, sejam LGBTQiA+, negras, negros e indígenas, publicados ou reeditados no Brasil nos últimos 20 anos, como Djamila Ribeiro, Ailton Krenak e Audre Lorde.

A ideia para o parque de esculturas veio da Secretaria de Cultura, que tem à frente o artista e gestor cultural Fabricio Noronha. Ele tem sido responsável por uma equipe com projetos dinâmicos. Essas iniciativas vêm ocupando os espaços culturais do estado com parcerias, como a realizada no Museu de Arte do Espírito Santo, que sediou a mostra Reviravolta, com acervo da Associação Cultural Videobrasil, realizada também na galeria Homero Massena, que em breve passa a ter nova sede.

Em entrevista à arte!brasileiros, Fabricio conta, a seguir, os princípios que nortearam sua gestão dos últimos quatro anos e a importância das novas leis Aldir Blanc 2 e Paulo Gustavo, para a descentralização das verbas públicas no Brasil.

ARTE!✱ – Enquanto o governo federal fez uma batalha contra a cultura nestes últimos quatro anos, o Espírito Santo atuou com políticas públicas exemplares, como criar o Parque Cultural Casa do Governador, em Vila Velha. Como foi a orientação para a cultura neste governo que se encerra?

Fabricio Noronha – A orientação do governador Renato Casagrande, minha primeira grande experiência na gestão pública – eu, que venho da iniciativa privada, da organização e produção de eventos e curadoria de mostras –, foi o desafio de trabalhar uma política de cultura de forma transversal, entendendo a centralidade da cultura em nossa vida, seus potenciais de desenvolvimento econômico assim como do senso de pertencimento do capixaba. Tudo isso com uma liberdade de criação e de trabalho muito grande. Em quatro anos construímos muitas coisas. O governador sancionou uma lei de incentivo de ICMS, que era um desejo de décadas do setor cultural do Espírito Santo, e um mecanismo de transferência de recursos do fundo estadual para fundos municipais, e com isso conseguimos crescer em quatro vezes o número de fundos e leis municipais de cultura.
Junto a isso veio a ideia dele e da primeira-dama, Maria Virgínia, de transformar a casa de praia do governador em um parque. A Secretaria entrou com o concurso de esculturas que ancora esse parque cultural.

ARTE!✱ – Entre as inovações desta gestão está realmente a criação do parque com esculturas realizadas especialmente para o local. Qual foi a concepção geral deste projeto?

A concepção veio do próprio governador de abrir a residência e um parque para visitação misturando arte, meio ambiente e tecnologia. Criamos um grupo interdisciplinar de várias secretarias e nós entramos com a proposição do parque de esculturas, que hoje totaliza dez obras temporárias e 11 permanentes, um investimento total de R$ 2 milhões. Essa concepção passa pela própria relação da casa e seu significado histórico e político, assim como o local onde ela existe para a criação de obras site specific. Nós recebemos 234 propostas de artistas do Brasil inteiro, foi o primeiro concurso nacional do Fundo Estadual de Cultura, e selecionamos 21 obras. Como dez são temporárias, teremos um novo ciclo para seleção de novas obras, criando assim uma dinâmica para esse parque. Por enquanto, as visitas são agendadas, mas temos eventos quinzenais que misturam música, teatro, poesia e dança, várias linguagens artísticas aos domingos.

ARTE!✱ – A galeria Homero Massena, onde esteve a mostra do Videobrasil, também tem mudança de sede prevista. Para quando se espera o novo espaço e o que se pretende com a mudança?

Estamos trabalhando em uma nova sede para ela, que, por enquanto, está na fase de projeto. Em breve devemos contratar essa obra. Ela fica em frente à atual sede, onde era o antigo Arquivo Público, tombado pelo Patrimônio do Estado. Ela deverá ter uma galeria com o dobro do tamanho atual, uma área de oficina, ateliê para residências, um miniauditório, reserva técnica adequada para todo acervo da galeria, que é o espaço de arte mais antigo do Espírito Santo, que vem dos anos 1970, e tem um acervo muito interessante.

ARTE!✱ – Você liderou, pelo Fórum de Secretários da Cultura, as Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2, a derrubada dos vetos do presidente, mesmo assim a liberação dos cerca de R$ 6 bilhões foi postergada até outubro, e é possível ainda novo adiamento. Qual o significado disso?

Estamos diante de dois avanços históricos do setor cultural, sobretudo a Lei Aldir Blanc 2, que é um recurso permanente de R$ 3 bilhões que, junto com o possível retorno do Ministério da Cultura, dá uma perspectiva muito boa para o setor cultural. São leis que trabalham a partir do pacto federativo, da descentralização de recursos para estados e municípios, fortalecendo a institucionalidade da cultura nesses lugares, fortalecendo os conselhos de cultura e as cenas locais. As duas leis trabalham dentro de uma lógica pelos fundos de participação dos municípios, dos estados e a população de cada local. Assim, dessa maneira, consegue-se um equilíbrio na distribuição de recursos, diferentemente de outros mecanismos, como a própria Lei Rouanet, que concentra muito em Rio, São Paulo e Minas. Essas leis conseguem equilibrar, pulverizar e chegar no pequeno. Um estudo do Observatório da Economia Criativa da Bahia mostrou que 63% dos beneficiados pela lei Aldir Blanc 1, muito parecida com a 2, nunca tinham recebido recursos públicos. Isso demonstra o alcance e a capilaridade dessas leis. E esse processo foi construído pelo Congresso Nacional, pela bancada da cultura, a lei Paulo Gustavo, pelo senador Paulo Rocha, a lei Aldir Blanc 2, pela deputada Jandira Feghali, e estamos muito envolvidos enquanto fórum de secretários. É um movimento bonito que é além do setor cultural, tão coletivo.

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