Intervenção da Escola Criativa desenvolvida na EMEF Des. Amorim Lima em 2020. Foto: Reprodução

Um olhar sobre Paulo Freire nos permite conceber a educação para fora da sala de aula, para além da configuração – que muitos de nós conhecemos – das paredes acinzentadas, muros altos e grades de proteção. É nessa ideia que o projeto Escola Criativa do Instituto Choque Cultural se constrói. Encabeçado pela educadora Raquel Ribeiro e pelo casal Baixo Ribeiro e Mariana Martins, sócios da galeria Choque Cultural, a iniciativa teve início em 2011 e, ao longo desses dez anos, atuou em mais de 40 escolas, alcançando cerca de 275 professores e milhares de crianças e jovens paulistanos com ações que usam a arte urbana para repensar atividades pedagógicas. 

“Nossos modelos de escola pública em sua estrutura física ainda espelham muito uma visão de educação que Paulo Freire descreve como ‘educação bancária’, que se estrutura como uma ‘linha de produção’ tal qual as fábricas, com turmas divididas em faixas etárias, aulas em tempos de 50 minutos e sinais sonoros que marcam esses tempos”, explica Raquel Ribeiro, coordenadora do projeto. Porém, hoje já sabemos que essa não é a única opção, é possível transformar a escola em um ambiente acolhedor e convidativo, um lugar no qual estudantes e professores se sintam instigados a criar e inovar. Partindo dessa premissa, o Escola Criativa leva artistas consagrados da arte urbana para ressignificar, por meio de intervenções, áreas comuns de escolas públicas de São Paulo. 

“No Escola Criativa entendemos que o tempo, os espaços físicos e as relações de aprendizagem na escola são partes de uma mesma engrenagem. Mudando um, impactamos os demais”, afirma Raquel. Aliado às ações artísticas, o projeto também oferece à comunidade escolar uma formação conceitual, que contempla ações e ferramentas que possibilitem que as transformações nos espaços escolares continuem após a finalização das intervenções. “Acreditamos que intervindo no espaço físico da escola com a arte, oferecemos um apoio ao professor para que ele mude sua prática e com isso também contribuímos com a quebra desse modelo de organização escolar que muitos educadores e críticos da educação já avaliaram como ultrapassado.”

Na opinião dos organizadores, a arte urbana vem como um caminho muito pertinente para esse objetivo. “Ela é uma linguagem que serve a essa conversa e integração entre a estética e a arquitetura, ela conversa com os espaços.” Para Raquel, ao trazer a arte de forma viva e integrada ao cotidiano da comunidade escolar, torna-se possível compreender que a arte e a criatividade não estão circunscritas à uma disciplina apenas, mas fazem parte de outros processos de decisão, criação e resolução de problemas na nossa vida. “Desenvolver o pensamento criativo está entre uma das principais competências a serem desenvolvidas na educação contemporânea, pois hoje estamos formando alunos para profissões que ainda nem foram criadas e realidades sociais que não podemos ainda prever”, explica. 

Com a pandemia, uma nova pergunta reiterou a importância do projeto: após meses de isolamento, como reintroduzir as crianças ao espaço escolar? A necessidade de tornar o ambiente convidativo e repensar as práticas educacionais nesse momento pandêmico e pós-pandêmico tornou-se ainda mais perceptível. Neste mês de julho, o Escola Criativa está trabalhando na Escola Estadual (EE) Brigadeiro Faria Lima e, em seguida, começará sua ação nas Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI) Gabriel Prestes e EE Caetano de Campos, com intervenções do Coletivo Cicloartivo e dos artistas Gitahy, Jota, Presto e Tec. 

Nesses casos, porém, algumas dinâmicas propostas pelo Instituto Choque Cultural tiveram que ser alteradas. Os organizadores explicam que antes da pandemia as intervenções artísticas eram feitas em grandes mutirões, envolvendo alunos, educadores, pais e toda a comunidade escolar; atualmente, as pinturas são feitas só com os artistas e os registros desse processo são compartilhados com a comunidade escolar em um sarau cultural virtual. As reuniões com professores, para compreender as necessidades dos colégios, também passaram a acontecer de forma remota. 

A iniciativa é uma das frentes de atuação do Instituto Choque Cultural, junto aos projetos Ponte – iniciativa que promove intercâmbios e desenvolvimento de cenas artísticas locais – e Redes – que atua como uma interface entre a sociedade civil, a iniciativa privada e o poder público em nome de um urbanismo mais democrático ligado à cultura.

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