Vista da exposição DESVAIRAR 22
Vista da exposição "Desvairar 22", com sarcófago em primeiro plano. Foto: Ricardo Ferreira

“Allah-lá-ô, ô ô ô ô ô ô. Mas que calor ô ô ô ô ô ô. Atravessamos o deserto do Saara. O sol estava quente. Queimou a nossa cara”. É com a famosa marchinha de carnaval que o público tem seu primeiro contato com Desvairar 22, exposição em cartaz no Sesc Pinheiros, em São Paulo. Com curadoria de Marta Mestre, Verônica Stigger e Eduardo Sterzi, a mostra faz um convite à imaginação a partir de quatro marcos de 1922: a Semana de Arte Moderna, o centenário da Independência do Brasil, a primeira transmissão de rádio no País e a descoberta da tumba de Tutancâmon, no Egito.

Mais de 270 itens – entre pinturas, fotografias, livros, excertos literários, vídeos, músicas e um carro alegórico da Grande Rio – nos conduzem pela coletiva, que transita entre fatos e ficção, literal e poético, costurando as efemérides. “Desvairar 22 é um grande convite a colocar a imaginação como um fio condutor dessa relação com o modernismo brasileiro”, diz Verônica Stigger, ao que Eduardo Sterzi dá continuidade: “É em alguma medida invocar a imaginação modernista para se transportar um pouco para aquele tempo”. Stigger completa: “Daí acho também que vem o nome da mostra, é um convite pra que o espectador também desvaire junto conosco esses anos de 1922 e 2022.”

A arte!brasileiros vistou a exposição e conversou com dois de seus curadores, Eduardo Sterzi – escritor, crítico literário e professor de Teoria Literária – e Verônica Stigger – escritora e professora universitária. Confira:

A mostra se organiza em quatro núcleos: Saudades do Egito, Os ossos do mundo, Meios de transporte e Índios errantes. Em Saudades do Egito estão obras de Abdias Nascimento e Tarsila do Amaral (que passou lua de mel no Egito com Oswald de Andrade), projetos “faraônicos” registrados por Marcel Gautherot, fotos de viagem de D. Pedro II ao país africano e um sarcófago original.

A seção Os ossos do mundo é inspirada no livro homônimo de Flávio de Carvalho. Para o modernista, as ruínas e coleções dos museus possibilitam compreender as várias camadas da História, nos ajudando a compreender não apenas o passado, mas o presente e o futuro. “O passado interessa, sobretudo, enquanto imagem a ser ativada no presente. Essa ativação, segundo Flávio, cabe ao ‘arqueólogo malcomportado’, que, ao contrário do ‘bem-comportado’, apreende ‘a força penetrante da elaboração poética’ naquilo que resta: os resíduos, as inscrições, as ruínas”, explica o texto de parede, dando tom ao núcleo.

Meios de transporte, por sua vez, transita entre o real e o poético. “Usamos a noção meios de transporte literal, mas também usamos a ideia no sentido metafórico: como a arte e a poesia são meios de transporte também. Nós entramos nelas e nos transportamos pra outros lugares, pra outros tempos e outras formas de pensar”.

Em Índios errantes, entre diversas variações de Iracema, destacam-se obras de Denilson Baniwa, Anna Maria Maiolino, Carybé, Hélio Oiticica, Lygia Pape e Paulo Nazareth. Sterzi explica que nesta seção, a curadoria buscou “fazer um percurso pelo qual a gente primeiro apresenta essas imagens de povos indígenas tal como figuradas pelos modernistas, mas a gente traz também artistas indígenas. A gente propõe em alguma medida que num determinado momento foi preciso que alguns artistas imaginassem essa presença pra que ela pudesse se fazer efetiva em um país que é racista e excludente. Em alguma medida para que as coisas existam na realidade, é preciso que primeiro elas existam na imaginação. O espaço imaginário abre um espaço político”.

Desvairar 22 fica em cartaz até 15 de janeiro de 2023 no Sesc Pinheiros. As visitas ocorrem de forma gratuita, de terça a sábado, das 10h30 às 20h30; e aos domingos, das 10h30 às 18h.

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