Richard Bell, Sol, 2022
Richard Bell, “Sol”, 2022. Foto: Patricia Rousseaux

Três exposições de grande escala em cartaz na Europa – a documenta de Kassel, a Bienal de Berlim e a Bienal de Veneza – dão conta de um complexo e complementar panorama da arte contemporânea. As duas primeiras são realizadas basicamente por fundos públicos alemães, o que permite maior independência – aliás, com curadores escolhidos por processos democráticos com profissionais da área.

Já a centenária bienal veneziana, a cargo da curadora italiana Cecília Alemani, segue próxima do mercado – apesar de, nesta edição, em todas as legendas as obras serem identificadas apenas como “cortesia do artista”, evitando assim o óbvio nexo. De qualquer forma, é explícito que a mostra italiana continua apresentando muito mais uma produção objetual, disponível em grande parte nas galerias poderosas do circuito, que vê a figura da artista e do artista como gênios individuais com um trabalho que valoriza o fazer em detrimento do conceito.

Enquanto isso, as exposições na Alemanha enfatizam processos, como dos trabalhos colaborativos, no caso da documenta, a cargo do coletivo indonésio ruangrupa; ou de denúncia social, como em Berlim, que tem à frente o artista franco-marroquino Kader Attia. Contudo, é inegável que ver Veneza é um prazer: a maior parte das obras parte de um acabamento estético primoroso, além de estar buscando um efeito de reparação à própria história da bienal.

Isso porque em cerca de 200 artistas presentes, 180 nunca participaram desta que é considerada a primeira bienal – iniciada em 1895 –, sendo que a maioria composta por artistas mulheres, além de um significativo aporte de negras, indígenas e figuras do Sul Global. As mostras alemãs, por outro lado, são muito mais contemporâneas de fato.
A documenta, com seu orçamento multimilionário de mais de 42 milhões de euros (R$ 232 milhões) consegue fazer algo que, desde o início da produção contemporânea, lá nos anos 1960, busca-se de fato: acabar com a representação para tornar a vivência o principal sentido da arte. Com cerca de 70 coletivos, que por sua vez mobilizaram mais de 1.500 artistas no total, a mostra em Kassel traz uma energia vibrante para apontar como a arte pode transformar o mundo, seja através de processos educativos, seja no cuidado com o ambiente, entre várias temáticas abordadas.

Já Berlim aposta na necessidade de denúncia, de apontar para questões que nem sempre estão visíveis, seja dos abusos pela polícia norte-americana contra imigrantes latinos, seja sobre como algoritmos conduzem o mundo para a direita. Tudo isso, importante dizer, sem abrir mãos de elementos estéticos que permitem que esses debates aterradores estejam no campo da arte. De qualquer maneira, cada uma a seu modo, essas exposições conseguem se complementar pois reúnem formas de trabalhar que, mesmo contraditórias em alguns casos, seguem sendo realizadas e constituem a complexa cena contemporânea atual.


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