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Legalização do aborto, uma exigência da mulher latino-americana

Manifestação de mulheres pela legalização do aborto no Rio de Janeiro, em 2016.
Manifestação de mulheres pela legalização do aborto no Rio de Janeiro, em 2016. FOTOS: Fotos Públicas

Nesta semana se vota no Senado argentino a legalização do aborto. Já foi aprovado pela Câmara de Deputados e após uma mobilização organizada e democrática mais de 1 milhão de mulheres, a conquista deste direito está sendo discutido amplamente em todos os países de América Latina. 

Leia no jornal argentino pagina12.com.ar entrevista com a deputada Monica Macha

https://www.pagina12.com.ar/123240-estado-de-alerta

Leia a seguir matéria publicada pelo páginab.com.br em 2017

Mulheres entram e saem do Hospital Pérola Byington, na região central da cidade de São Paulo, com um segredo que provavelmente guardarão para sempre. Chegam sozinhas, com medo e vergonha. A maioria foi vítima de violência sexual e está ali para fazer um aborto. “Se contam para alguém, é para uma amiga. Falar para a família é mais complicado”, diz Daniela Pedroso, chefe do atendimento psicológico do Serviço de Aborto Legal da instituição.

No Brasil, a interrupção da gestação é permitida apenas nos casos em que é decorrente de estupro e se há risco de morte para a mãe. Esse direito existe desde 1940. No entanto, a primeira norma técnica do Ministério da Saúde para regulamentar e implantar devidamente o procedimento na rede pública foi redigida 59 anos depois, em 1999. Já o direito de abortar fetos anencefálicos foi reconhecido em 2012 pelo Supremo Tribunal Federal.

O Pérola Byington é um centro de referência em saúde da mulher e na realização desses procedimentos. “Chegamos a fazer um terço de todos os abortos registrados por ano no País”, diz o médico Jefferson Drezett, coordenador do Ambulatório de Violência Sexual e de Aborto Legal.

Em 2016, cerca de 320 mulheres foram submetidas pela equipe do médico ao aborto legal, número que é quase o dobro das intervenções feitas no ano anterior. “Se você reunir todos os outros serviços no estado de São Paulo em um ano, eles chegarão a uma fração do que é feito no Pérola. Essa concentração é terrível”, diz Drezett.

A realidade é que ainda são poucos os serviços que praticam o aborto legal e o atendimento integral previsto nesses casos. É o que evidenciam os dados obtidos pela pesquisa Serviços de Aborto Legal no Brasil – um Estudo Nacional, coordenada pela antropóloga Débora Diniz, professora de Bioética da Universidade de Brasília e pesquisadora do Anis – Instituto de Bioética. Diniz foi uma das principais articuladoras da ação no Supremo Tribunal Federal (STF) que admitiu o aborto em casos de anencefalia em 2012.

A pesquisa mostrou que, entre 2013 e 2015, um total de 5.075 mulheres foram à rede pública em várias partes do País para realizar o procedimento, mas apenas 2.442 tiveram êxito. O estudo não investigou o que aconteceu às mulheres que não conseguiram abortar, mas não é errado imaginar que boa parte foi parar em clínicas clandestinas.

O estudo avaliou 68 centros de referência cadastrados no Ministério da Saúde, dos quais apenas 37 estavam, de fato, realizando o aborto. Em sete estados, não havia serviço disponível e 70% dos atendimentos foram realizados na região Sudeste. Essa ideia é reforçada pelo volume de pacientes de fora de São Paulo atendidas no “Pérola”. Em 2016, elas representaram metade do movimento do serviço. “Cerca de 18% foram encaminhadas por serviços públicos do estado que, publicamente, se dizem aptos a realizar o aborto legal, mas não o fazem”, aponta o obstetra Drezett.

Sobram dificuldades para complicar a vida da mulher que precisa se submeter ao aborto legal. Uma delas é a negativa de alguns médicos em realizar o procedimento. Eles estão amparados pelo código de ética médica e por uma norma técnica que permite rejeitar a tarefa por “objeção de consciência”. A mesma norma, porém, determina aos serviços públicos credenciados que garantam o atendimento em tempo hábil por outro profissional da instituição ou de outro serviço. E mais: a objeção de consciência não é reconhecida na falta de outro médico para atender a mulher, se houver risco de morte ou a omissão do atendimento puder causar danos.

O pedido de documentos que não são mais exigidos legalmente nos casos de violência sexual é outra barreira. Muita gente não sabe, mas não é obrigatório apresentar Boletim de Ocorrência e nem um laudo do Instituto Médico Legal. Apesar disso, 14% dos serviços em atividade ainda pedem tais comprovações, como mostrou o estudo conduzido por Diniz.

Mesmo amparada pela lei, a mulher que chega aos serviços de aborto legal ainda pode ser maltratada. Lamentavelmente, é comum no País encontrar médicos e funcionários dos serviços de saúde capazes de inocular suspeitas sobre a história da violência relatada. Levantamento de 2012 feito com ginecologistas e obstetras brasileiros mostrou que 43% dos médicos declararam objeção de consciência quando não tinham certeza se a mulher estava contando a verdade sobre o estupro.

“A ambiguidade que o aborto legal provoca por ser exceção à regra da criminalização gera essas distorções. Em vez de ouvir, acolher e cuidar da mulher em sofrimento, os profissionais assumem postura policial, promovendo a intromissão de um requisito investigativo no que deveria ser apenas cuidado em saúde”, afirma Diniz.

A resistência dos médicos é mais intensa em relação ao aborto por violência sexual do que à interrupção de uma gestação de risco. “Os profissionais sabem que até 35% de toda mortalidade materna está relacionada a complicações de saúde que se acentuam na gravidez”, diz o médico. A oferta de assistência integral às vítimas da violência sexual é outro desafio.

Mesmo entre os serviços cadastrados pelo Ministério da Saúde, são raros os que prestam atendimento como manda o figurino, conforme aponta Thomaz Gollop, coordenador do Grupo de Estudos sobre o Aborto (GEA) e professor livre-docente de Genética Médica pela Universidade de São Paulo.

A integralidade de que fala Gollop engloba o acolhimento, o suporte psicológico, a coleta de material para extração de DNA e possível identificação do agressor, a anticoncepção de emergência, a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e, quando indicada, a interrupção da gravidez. “Dos mais de cinco mil municípios do País, apenas 1% teria esse atendimento, ainda que incompleto”, diz Gollop.

O especialista atribui essa escassez a fatores como as pressões políticas de prefeitos, das câmaras de vereadores e de variados cultos religiosos. Some-se a isso a cumplicidade do estado. “Os serviços de saúde têm ignorado essa responsabilidade sem que sejam incomodados pelas autoridades”, aponta o obstetra Drezett.

O “esquecimento” do tema é extensivo às faculdades de medicina, especialmente àquelas ligadas a universidades regidas por religiões. “Como muitos temas ligados aos direitos sexuais e reprodutivos, a questão do aborto deixa de ser discutida e permanece um tabu para a maioria das escolas médicas e médicos em geral”, diz Gollop. “Não faz parte do currículo das faculdades, dos congressos e simpósios da área. E quando incluídos na programação, isso se dá no último dia do evento, quando há mínima audiência.”

Ao chegar nos hospitais com complicações pós-aborto, frequentemente as mulheres são alvo de desconfiança. Muitas postergam ao máximo a ida ao hospital em razão das denúncias feitas à polícia por médicos, funcionários ou agentes dos serviços de saúde. Na visão do juiz e professor José Henrique Torres, professor de Direito Penal da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), quem está cometendo um crime são os acusadores.

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Pelo código de ética médica, a relação de confidencialidade entre médico e paciente não pode ser desrespeitada. “A polícia deveria desconsiderar essas denúncias porque são uma prova ilícita, praticada de forma criminosa. O Ministério Público, em vez de instaurar inquérito para apurar a conduta da mulher, deveria fazê-lo por violação de sigilo profissional e crime de quem fez a denúncia.”

Para Torres, há incompatibilidade entre a legislação brasileira, o sistema internacional de direitos humanos e a assistência e saúde da mulher: “A criminalização em si acarreta mortes de mulheres, sequelas terríveis e tem um custo social muito grande. Não consegue proteger o feto, a vida. Ao contrário, traz prejuízos para a saúde e vida das mulheres”.

Por isso, a questão precisa ser enfrentada de outras formas que não a drástica, severa e repressiva penalização das mulheres. O especialista argumenta que a criminalização contraria diversos princípios constitucionais. “Quando uma sociedade tem um problema a ser enfrentado, deve lançar mão de providências legislativas e políticas públicas antes de criminalizar, o que deveria ser a última alternativa a ser posta em prática pelo estado”, explica.

A proibição do aborto contrariaria ainda o princípio da idoneidade, uma vez que não reduz o índice de procedimentos realizados. “As pesquisas apontam que as mulheres não deixam de fazer o procedimento porque é criminalizado”, diz Torres. O princípio da racionalidade também sai ferido. No caso do aborto, a criminalização empurra as mulheres para o atendimento clandestino, matando-as e deixando sequelas. “O estado não pode causar problemas maiores ainda”, afirma o juiz. A cada ano, no Brasil, são feitos de 700 mil a um milhão de abortos, segundo Torres.

“É uma ilegalidade consentida. Se temos um milhão de abortos praticados, deveríamos ter um milhão de mulheres processadas. Isso não acontece porque a ideia é manter a criminalização como uma ameaça constante contra as mulheres, com o objetivo de controlar o corpo e a sexualidade femininos”, analisa o juiz.

Um caminho a seguir, segundo o especialista, seria a linha adotada em uma decisão do STF, que afirmou, recentemente, não haver crime de aborto até o terceiro mês de gestação. Ainda que diga respeito a um caso específico, é considerada um avanço na descriminalização do ato e pode influenciar magistrados de outras instâncias. Outros países já consentiram o aborto no início da gravidez, como Portugal, Itália, França e Espanha.

“O Brasil possui regras muito restritivas sobre aborto, inspiradas na legislação italiana fascista de Mussolini”, diz Gollop. Além disso, tentativas de retrocesso emergem volta e meia, como a proposta do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB), que queria obrigar as mulheres a ir à delegacia de polícia antes de ter atendimento. “A intenção de Cunha não era punir o agressor, mas ver se a mulher não estava mentindo”, pontua Drezett.

Na opinião da antropóloga Débora Diniz, estamos aquém do que poderíamos. “Mas, por iniciativa das mulheres, o tema tem se mantido em pauta e deve amadurecer”, diz a especialista. Que seja rápido. O aborto clandestino é a quinta causa de mortalidade materna no Brasil. Estima-se que tire a vida de 300 brasileiras a cada ano.

Modelo a ser copiado

Daniela Pedroso, chefe de psicologia do Serviço de Aborto Legal do Pérola Byington, ao lado do doutor Jefferson Drezett, coordenador do Ambulatório de Violência Sexual e de Aborto Legal.
Daniela Pedroso, chefe de psicologia do Serviço de Aborto Legal do Pérola Byington, ao lado do doutor Jefferson Drezett, coordenador do Ambulatório de Violência Sexual e de Aborto Legal. FOTO: Luiza Sigulem

Daniela Pedroso, chefe de psicologia do Serviço de Aborto Legal do Pérola Byington, ao lado do doutor Jefferson Drezett, coordenador do Ambulatório de Violência Sexual e de Aborto Legal. Foto: Luiza Sigulem[/caption]

No Hospital Pérola Byington, o atendimento a quem procura o aborto legal começa com uma conversa para ouvir a história de cada mulher e avaliar se ela está em situação de risco, se precisa de abrigo e assistência social. Depois, é feita uma avaliação emocional, psicológica e das condições de saúde.

A maioria é encaminhada pela polícia, pelo Instituto Médico Legal ou outros serviços de saúde. “Mas estamos vendo um aumento da busca espontânea por atendimento”, diz o ginecologista e obstetra Jefferson Drezett, que chefia o Ambulatório de Violência Sexual e de Aborto Legal. Isso seria resultado da divulgação dos serviços pela Internet e funciona como um indicativo de que as mulheres estão menos dependentes de intermediários para encontrar os locais de atendimento.

Feitos os exames, a mulher assinará cinco documentos. Neles, se responsabiliza pelo que é declarado para fazer o aborto legal, autoriza o procedimento e se diz ciente das alternativas. A equipe médica aprova ou não o pedido e, por fim, faz uma avaliação técnica do tempo de gravidez para checar se é compatível com o tempo passado do estupro.

Entre 25% e 30% das mulheres não conseguem aprovação para fazer o aborto legal. O principal motivo é o tempo de gestação superior ao limite técnico para interrompê-la – até a 20ª semana ou até a 22ª se o feto pesar menos de meio quilo. O segundo impedimento mais frequente é a gravidez não ser decorrente de violência sexual.

“Muitas vezes, a mulher foi estuprada e está grávida, mas não do estuprador”, diz Drezett. Depois do procedimento, a psicóloga Daniela Pedroso, que há 20 anos dá suporte às mulheres que vão ao hospital, diz que prevalece um sentimento de alívio.

“Elas sentem que poderão retomar a vida, o trabalho, os estudos – voltar a ser quem eram antes de engravidar.” Segundo a psicóloga, aproximadamente 25% das mulheres pensaram em suicídio. “O trauma é maior em relação ao estupro e à falta de opção para fazer o aborto do que pelo procedimento em si”, diz a especialista.

Pela complexidade da situação, o “Pérola” oferece acompanhamento psicoterapêutico por seis meses a um ano. Metade das mulheres aceita frequentar as sessões.

Registros de um país em conflito

Residência afetada por bombardeio. Vila Mariana, São Paulo, 1924. Foto: Coleção Mons. Jamil Nassif Abib

A mostra que esteve no IMS até julho de 2018,  Conflitos: Fotografia e Violência Política no Brasil 1889-1964,  é uma aula de fotografia, política e História. Negando de forma peremptória a tese oficialista de que o Brasil é uma nação pacífica, a exposição reúne um amplo conjunto de imagens captadas entre dois momentos-chave: a proclamação da República, em 1889, e o Golpe Militar de 1964. A ideia de “mãe gentil” propalada pelo hino nacional e pelos livros escolares se desfaz rapidamente diante da sucessão de registros de conflitos, guerras civis, revoltas, insurreições e muita repressão liderada por um Estado violento nesse intervalo de 75 anos.

Como sintetiza a cientista política Angela Alonso, em um dos textos introdutórios do alentado catálogo da exposição, “os confrontos armados envolvendo governo e Exército bordam nossa história com alta frequência e virulência”. Alguns dos conflitos representados são extremamente conhecidos, como a Guerra de Canudos, a Revolução de 1930 e o suicídio de Getúlio Vargas. Outros passam batido nos livros escolares, como a Revolução de 1924, por exemplo. O mesmo ocorre com as imagens selecionadas. De autorias diversas (assinadas por mestres como Marc Ferrez ou por fotógrafos cuja identidade se perdeu no tempo), essas imagens podem ser lidas de diferentes e enriquecedoras formas.

Em conjunto, elas falam sobre a brutalidade de um país marcado pela violência, no qual “um povo que se insubordina e uma elite que não se civiliza” têm sua relação mediada sempre pelo conflito. Traçam também um interessante painel sobre a diversidade e evolução da imagem fotográfica no país, desde as técnicas mais antigas, em prática no século XIX, até a utilização massiva das imagens pela imprensa, passando por momentos distintos como o uso recorrente do cartão postal e as primeiras experiências com a fotografia em movimento (precursoras do cinema). Em todos os casos, com maior ou menor intensidade, fica evidente o uso político da imagem como arma de convencimento e testemunho. Como lembra Heloisa Espada, curadora da exposição e autora do catálogo juntamente com Angela Alonso, “toda imagem realizada num conflito é interessada”.

Em muitos casos, o que essas imagens registram não é a ação propriamente dita. Temos diante dos olhos o palco dos conflitos, seus atores e as marcas de destruição depois que a violência ocorreu, que sempre coloca de um lado o poder constituído e de outro os derrotados. Da primeira imagem, que registra um grupo que posa antes da degola de um inimigo na Revolução Federalista de 1894, ao registro final, que recorda a brutal repressão e tortura à qual foi submetida o líder comunista Gregório Bezerra em 1964, surge um número amplíssimo de questões, muitas delas tratadas detalhadamente por um diversidade de ensaios reunidos no livro/catálogo.

Do ponto de vista do registro da imagem, é possível notar como a melhoria dos recursos técnicos permite uma captura mais “realista” da cena. A pose dá lugar a uma imagem capturada no calor da hora, como os registros feitos por Evandro Teixeira nas primeiras horas do golpe militar (1964). Isso não se traduz necessariamente em uma maior dramaticidade. Difícil superar o caráter trágico de imagens como as que mostram o corpo do inimigo aniquilado, numa clara estratégia de reafirmação do poder. Vale citar, por exemplo, os registros das cabeças decapitadas de Lampião e outros cangaceiros (foto anônima, 1938) ou do corpo morto e exumado de Antônio Conselheiro (Flávio de Barros, 1897). Nem tampouco que a velocidade do fotojornalismo tenha substituído integralmente o controle da pose e da composição por parte dos fotógrafos, estratégias de organização interna da imagem que se repetem ao longo das décadas.

Outro aspecto que se destaca nessa trajetória, ao mesmo tempo histórica e técnica, é como evoluem de forma quase paralela a maneira de registrar os conflitos e a forma como eles são realizados. Em outras palavras, o avanço tecnológico não tem impacto apenas sobre as formas de registrar e distribuir as imagens, mas também tem seus efeitos sobre as formas de combate. Conflito a conflito, a mostra nos revela como pouco a pouco a faca vai dando lugar ao poder cada vez mais destrutivo de canhões e bombas lançadas dos ares.

Agenda: destaques da semana 23 a 29 de junho

Rogério Reis, série Na Lona, Rio de Janeiro (1987-2002) Campo Grande, 1997, Rio de Janeiro, 1987-2002, Hasselblad com filme Tri-X, 120 mm (sais de prata), Impressão em pigmento mineral sobre papel algodão, 50 x 60 cm

 

Programe-se


Nelson Leirner, ‘Futebol’, 2001

O tridimensional na coleção Marcos Amaro: frente, fundo, em cima, embaixo, lados. Volume, forma e cor, coletiva na Fábrica de Arte Marcos Amaro, em Itu, abertura em 23/6.

Exposição inaugural da Fábrica de Arte Marcos Amaro, em Itu. Com curadoria de Ricardo Resende, a mostra traz um recorte do acervo do colecionador, artista e empresário Marcos Amaro. A exposição reúne cerca de 50 trabalhos entre pinturas, esculturas, relevos e instalações. São criações de artistas de gerações e influências distintas, do Barroco à contemporaneidade, passando ainda pelos modernistas.


Rogério Reis, série Na Lona, Rio de Janeiro (1987-2002) Campo Grande, 1997, Rio de Janeiro, 1987-2002, Hasselblad com filme Tri-X, 120 mm (sais de prata), Impressão em pigmento mineral sobre papel algodão, 50 x 60 cm

Histórias Afro-atlânticas, coletiva no Masp e no Instituto Tomie Ohtake, a partir de 28/6.

Cotada como a grande exposição do ano, apresenta cerca de 400 obras de mais de 200 artistas, tanto do acervo do MASP, quanto de coleções brasileiras e internacionais, incluindo desenhos, pinturas, esculturas, filmes, vídeos, instalações e fotografias, além de documentos e publicações, de arte africana, europeia, latino e norte-americana, caribenha, entre outras. No sábado, 30, parte da mostra também é inaugurada no Instituto Tomie Ohtake.


Héctor Ragni, “Número Uno”, 1936

Construções Sensíveis: a experiência geométrica latino-americana na coleção Ella Fontanals-Cisneros, coletiva no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro, abertura em 27/6

A exposição traz ao Brasil um recorte da abstração em nosso continente. Junto ao importante legado do concretismo e neoconcretismo brasileiros, são apresentadas as poéticas abstratas que prosperaram em outros países a partir dos anos 1930. Pensada especialmente para o Brasil, presta uma sutil homenagem à mostra “Arte Agora III, América Latina: Geometria sensível”, destruída num trágico incêndio em 1978, quando ocupava o MAM Rio de Janeiro. Diversos artistas apresentados naquela histórica ocasião estão presentes, junto a artistas contemporâneos que apontam para os rumos da abstração atual.


Bruno Dunley, “No meio”, 2016

Bruno Dunley: No meio e Fabio Miguez: Fragmentos do Real (Atalhos), individuais na Galeria Nara Roesler, em São Paulo, aberturas em 23/6
Ambos os artistas pertencem a gerações marcadas pela retomada da pintura, 2000 e 80 respectivamente, e compartilham referências históricas do universo pictórico. Todos estes aspectos serão abordados em uma conversa aberta ao público entre os artistas e os críticos Rodrigo Moura e Tadeu Chiarelli, no dia 04 de agosto.


José Alberto Nemer, ‘Sem título’

José Alberto Nemer: Aquarelas recentes – Geometria Residual, individual na Galeria de Arte do Centro Cultural Minas Tênis Clube, abertura em 24/6.

As aquarelas surgiram de forma diferente na vida do artista. “Foi por meio de um processo psicanalítico. Perguntei para a analista se podia fazer um relatório usando aquarelas”, conta Nemer. A partir daí veio a primeira série, intitulada “Ilusões Cotidianas”, exposta, nos anos 1980, em São Paulo e na Bienal de Cuba. O artista se afeiçoou à técnica e não parou mais. Segundo Nemer, a forma da aquarela mostra sua personalidade. “A técnica se adequou à minha introspecção e silêncio. A minha linguagem passou a ser 100% a aquarela”, afirma.

 



 

Leda Catunda “O Nove e o Novilho ll”, 2013,

Transformers: Catunda, Chaves, França, Rauschenberg, coletiva na AURORAS, abertura em 23/6.

A apropriação de imagens é uma prática que se intensificou drasticamente nas ultimas décadas. Desde então, incorporar imagens das mais diversas origens é uma das características da produção contemporânea, frequentemente misturando diferentes materiais e técnicas. A exposição Transformers, no auroras, destaca o uso diverso da imagem que é articulada por Leda Catunda, Arthur Chaves, Pedro França e Robert Rauschenberg.


Manuella Karmann, “Mata”, 2017

Campos Gerais, coletiva na Adelina Galeria, até 24/8.

Josué Mattos, o curador da exposição, reconhece a importância do encontro dos três artistas pelo fato de “residirem áreas em que os biomas sofrem grande degradação. Daniel Caballero e Miguel Penha preservam interesses pela paisagem do cerrado, colocando o assunto em voga em suas investigações. Manuella Karmann, por sua vez, atua diretamente na Serra da Mantiqueira, em área de reflorestamento, resistindo à frenética transformação do bioma em pastagem.”


Yoko Nishio, “Bemtevi”

Luzes indiscretas entre colinas cônicas, coletiva de abertura da Galeria Simone Cadinelli Arte Contemporânea, até 8/8.

A proposta de Marcelo Campos com esta exposição é unir trabalhos que tratem de ideias relacionadas à luz, ao corpo e a paisagem. Ele se baseou no relato de viajantes que se deparavam com as cidades brasileiras e em três conceitos que se tornaram evidentes: a luz, a transbordante paisagem e o gentio. A mostra traz Anna Kahn, Brígida Baltar, Claudio Tobinaga, Hugo Houayek, Jimson Vilela, Leo Ayres, Lívia Flores, Osvaldo Gaia, Roberta Carvalho, Robnei Bonifácio, Thiago Ortiz, Tiago Sant’Ana e Yoko Nishio.


 

 

Por um grito de resistência

EM TEMPOS NOS QUAIS A ARTE tem sofrido com reações caluniosas ao se mostrar política, algumas instituições optaram por isentar suas mostras de qualquer tipo de militância. Outras, corajosas, dão aos curadores e artistas a voz necessária para propagar a mensagem desejada. É o caso da curadora Júlia Rebouças, que buscou obras de arte que se encaixassem no que ela define como “estratégia de hackeamento para pensar o nosso momento político”.   

Convidada para fazer a curadoria, Júlia teve pouco tempo para preparar a mostra MitoMotim, que fica em cartaz no Galpão VB até 28 de julho. Essa limitação de prazo fez com que ela optasse por focar sua pesquisa no próprio Acervo Histórico da Associação Videobrasil, o qual já conhece há algum tempo, tendo trabalhado várias vezes com a instituição. “Eu disse ‘vamos fazer um motim com o que temos aqui’”, conta a curadora. A partir daí, todo o processo da exposição foi construído com os braços e os recursos do Videobrasil.

Escolheu um momento específico da história do País para articular sua ideia. Quis, então, olhar para o momento do processo de redemocratização do Brasil, passando pelas décadas de 80 e 90. Para ela, a construção desse período reflete na realidade atual. A insurgência de um grito de resistência diante do que ela considera “tempos difíceis” levou à palavra “motim”: “Motim é levante contra uma institucionalidade. É sempre um desejo de contestação”, declara.

Luiz Roque, Geometria Descritiva, 2012, videoinstalação

Já a palavra “mito” surgiu da contestação sobre os mitos criados no decorrer da história do País, como o do “homem cordial” e o das “harmonia entre três raças”. Desta forma, o palíndromo criado na união das duas palavras se referem, de acordo com ela, a um motim do mito: “É no sentido de pensar que é preciso desconstruir os clichês identitários”.

Utilizando muito da linguagem da televisão, meio muito mais utilizado pela massa na época que nos dias de hoje, buscou também discutir o papel do discurso televisivo nas questões políticas e sociais: “Também é uma discussão sobre comunicação e mídia. Vamos descobrindo quem está representado na mídia”, acrescenta.   

Além das obras do acervo, Júlia convidou outros artistas para participar da exposição, com instalações. “É um conjunto de artistas pelos quais me interesso e acompanho. Eles são os nossos aliados nesse contexto todo”, explica. Para ela, ao mesmo tempo que eles criam diálogos também criam contrastes, mas não se opõem, e considera: “São artistas importantes para o País e que têm uma arte disruptiva e contestadora”. O grupo de convidados é formado por Artur Barrio, Marilá Dardot, Randolpho Lamonier, Rivane Neuenschwander, Sara Ramo e Traplev.


MitoMotim
Até 28 de julho
Galpão VB

Av. Imperatriz Leopoldina, 1150 – Vila Leopoldina, São Paulo


O que nos une?

Capa edição 43 - Sem Título - Moisés Patrício
Obra Sem Título da série "Aceita?", de Moisés Patrício. A obra foi capa da nossa edição 43.

Quando o escritor, educador e presidente argentino Domingos Faustino Sarmiento escreveu, em 1845, Facundo: Civilización y Barbárie, tentou retratar a formação nacional argentina por meio das relações do homem do deserto, “do pampa”, versus o homem da cidade e a força que a colonização europeia teria tido nas cidades. A existência de dois países, um  civilizado – branco, ilustrado, integrado com a Europa – e um bárbaro – a Argentina do analfabetismo, dos mestiços, do isolamento, da violência: uma antítese que colocava em jogo a possibilidade de construir um corpo de nação. A obra é considerada fundadora da literatura argentina pelo pioneirismo na ruptura com os padrões do romanticismo europeu.

Em 1930, Sigmund Freud escreveu O Mal-estar na Cultura (na tradução brasileira editado também como O Mal-estar na Civilização). Nesse texto chave da sua obra, Freud (se concorde ou não) coloca por terra qualquer ilusão sobre a possibilidade dos homens virem a coexistir em paz. Ou qualquer teoria que, vinda de um conceito político, econômico ou sociológico, sugira que o homem consiga se relacionar num encontro cordial, solidário, onde supostamente teríamos acesso a um objetivo superior, deixando de nos comportar como animais.

Para ele, “o instinto agressivo não é uma consequência da propriedade, esta já regia quase sem restrições nas épocas primitivas, quando a propriedade ainda era pouca coisa, [a agressividade] já se manifesta na criança, apenas a propriedade perdeu sua forma anal; constitui o sedimento de todos os vínculos carinhosos e amorosos… Se se eliminasse todo direito pessoal a possuir bens materiais, ainda seriam substituídos pelos privilégios derivados das relações sexuais, que necessariamente devem se transformar em fonte da mais intensa inveja e da mais violenta hostilidade entre os seres humanos.”…”Evidentemente ao homem não lhe é fácil renunciar à satisfação das suas tendências agressivas; não fica nem um pouco confortável sem essa satisfação”.

“Por outra parte, um núcleo cultural mas restringido oferece a vantagem de permitir a satisfação deste instinto através da hostilidade frente a sujeitos que ficaram excluídos daquele [núcleo]. Sempre terá mais facilidade para se vincular mais amorosamente entre sí, com a condição de que sobrem outros em quem descarregar seus golpes” (pag. 3049, El Mal-estar en la cultura, Sigmund Freud, Obras Completas, Biblioteca Nueva Madrid, 1981).

Nossa pulsão pela vida e pela morte bate sempre, mais, no não igual.

Esta edição mostra, através de uma primorosa recapitulação de imagens, arquivos e obras apresentadas por artistas, fotógrafos e pensadores, como no passar do tempo não conseguimos sair do lugar: como os conflitos entre norte e sul, entre classes e poder geopolítico estão sempre a serviço de uma subjugação de uns pelos outros. O preto pelo branco, o colonizado pelo colonizador. E também como, exatamente por conta dessa dificuldade, a arte resulta num suporte permanente para trabalhar o desamparo.

PS: Boas notícias: duas Fundações Privadas, uma que faz 45 anos e outra que inaugura, expõem seus acervos ao público! Isso nos une.

PS2: Acompanhe no paginaB todas as materias da edição ao longo das próximas semanas

Arte feita por negros. Você aceita?

Moisés Patrício, ‘Sem Título’ da Série ‘Aceita?’, 2018

À PORTA DO PRÉDIO onde fica seu ateliê, Moisés Patrício, artista e educador, recebe convidados com um sorriso e um abraço. Todo de branco, o artista por trás da série fotográfica Aceita? e da série de performances Presença Negra, que reúne negros para visitas em grupo a aberturas de galerias de arte, explica que ocupa o local, emprestado por uma amiga, há dois anos.

Patrício é artista e é negro. Para ele, as duas coisas não precisam estar sempre acompanhadas, mas não devem ser esquecidas. “Por que toda vez que um artista que é negro faz uma exposição ou projeto as pessoas chamam de Arte Negra? De alguma forma, isso acaba reduzindo tudo a essa única questão. Ninguém diz arte branca quando o artista é branco”, questiona. Para ele, arte é arte, mas Patrício não foge à critica de seu próprio questionamento, pois muitas vezes artistas brancos, mais velhos e conservadores, manifestaram opiniões como se a arte no Brasil estivesse em momento decadente, em referência à arte afro-brasileira e à arte periférica. “Já ouvi, também, de artistas brancos que ‘a arte não tem cor e que, portanto, não há porque privilegiar alguns artistas porque são negros’”, reproduz. Para ele, isso acontece porque uma parcela da classe artística receia perder seus privilégios.

Em 2014, negros (pretos e pardos) já representavam a maior parte da população brasileira, com 54% das autodeclarações étnico-raciais, mas ainda assim sua presença nos espaços artísticos é baixa. Mesmo com a pouca representatividade na arte, afrodescendentes têm dificuldade em escapar dos estereótipos. Negros costumam ser associados artisticamente, na forma mais comum e cotidiana, a temas como a escravidão, ritos tribais de etnias africanas e às religiões afro-americanas.

Mas o cenário começa a mudar e museus brasileiros estão abrindo as portas para a arte contemporânea de origem afro. Em maio de 2018, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) inaugurou a maior exposição de artistas africanos em São Paulo. Foram 90 obras de artistas de oito países africanos e dois artistas afro-brasileiros. Agora Museu de Arte de São Paulo (Masp), considerado cartão postal da cidade, terá pela primeira vez todo o seu espaço dedicado à exposição Histórias Afro-atlânticas. E não acaba aí. O Instituto Tomie Ohtake, no bairro de Pinheiros, outra instituição bastante popular na capital paulista, firmou parceria para expor, junto ao Masp, cerca de 400 obras de mais de 200 artistas na Afro-atlânticas.

Moisés Patrício, ‘Sem Título’ da série ‘Aceita?’, 2017

Moisés está entre os 200 artistas da exposição. No Masp, são de autoria do artista. E o destaque é para sua série fotográfica Aceita?.

A mão preta que envelhece

Andar pela cidade de São Paulo é estar diante de finais e começos o tempo todo. Dos trabalhadores que dão vida à cidade logo nas primeiras horas da manhã, antes mesmo do sol nascer, aos resíduos do consumo dos produtos cotidianos da vida urbana. Embalagens plásticas, papeis, garrafas, roupas, móveis: é possível encontrar todo tipo de objeto nas esquinas da cidade. O lixo, para Patrício, diz muito. A série de fotos Aceita? expõe a inquietação do artista paulistano com a cidade, com tudo aquilo que, segundo ele, deixamos de ver quando descartamos os plásticos, as vidas e uma variedade de bens com ou sem valor.

Moisés explica que a série nasce do seu desespero em ser assimilado pela sociedade ao seu redor e das reflexões sobre a mão de obra do período escravocrata e, atualmente, servil. “A série nasce, também, da busca de olhar para a mão como obra artística. Ela nasce do meu desespero de ser assimilado pela sociedade. De um modo geral, na faculdade, tive muita dificuldade de encontrar minha poética, porque tudo estava ligado a um universo pelo qual sinto mais dor do que amor. Passei quatro anos estudando e me embranquecendo”, conta.  Para se reencontrar, o artista produziu uma serie de autorretratos de nu artístico e outra de fotografias de partes do seu corpo. Mas foi caminhando pela cidade que encontrou o tom. “Eu aprendo e apreendo de outra forma, minha aprendizagem esta muito ligada à dança, à comida, ao tempo das coisas, de fazer junto, olhando. Fui educado assim no terreiro [de Candomblé]. Então, lá, você canta e dança para ter acesso ao conhecimento”.

Filho de Exu no Candomblé, orixá ligado à comunicação, movimentos do corpo, ao caminhar, ao facilitar o trânsito de corpos e ideias, Moisés se deparou com a cidade e seu próprio corpo como obra. Fez uma, duas, três fotos e, então, nasceu a série Aceita?, que busca, entre tantas coisas, discutir o descarte provocado pelo consumo e se apropria desse desprezo como metáfora para o que chamou de “descarte do jovem negro no Brasil”. 

O artista nasceu na periferia. Aos nove anos teve contato com a arte pela primeira vez, ingressando nas aulas promovidas pelo artista argentino Juan José Balzi, que morreu em 2018, aos 89 anos. “Ele [Balzi] disponibilizava os materiais, levava tintas, papeis e jornais para nós. Ele tinha um enfoque político e fazia questão de levar os jornais da semana para compartilhar com a gente. Nos ensinava técnicas de desenho e de pintura, e nos ajudava a desenvolver leitura crítica. Balzi intercalava os encontros no bairro com idas aos museus da cidade, como Pinacoteca, por exemplo”. Hoje, com 33 anos, Moisés conta que conheceu a arte na sua forma mais libertadora, diferente dos formatos engessados que estudou na ECA-USP, Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo.

Durante os quatro anos em que estudou, Moisés viveu sua maior crise enquanto artista. Sendo um jovem negro, de periferia, a arte europeia, majoritariamente branca, não proporcionava identificação. “Existe uma prepotência, uma arrogância do ser professor de uma universidade pública para um aluno negro. Eles se deparam com uma deficiência, uma falha e aí a minha maior frustração era que essa insuficiência me impedia de desbravar junto [com os professores] esses temas. Eu os colocava na parede e dizia ‘olha, eu não tenho uma afinidade com o Expressionismo alemão. Onde estão as outras referências?’”. A resposta, segundo Patrício, era de que seu olhar estava condicionado. “Eles costumavam dizer ‘vem aqui, vou te ensinar’. Eu ficava naquele lugar de [ser] muito pequeno, sem crescimento”, critica.

Apesar disso, o cenário mudou, ainda que pouco, para melhor. De acordo com ele, nos últimos quatro anos surgiu um grupo de artistas e estudantes negros da instituição que, juntos, criaram o coletivo Opa Negra, que promove ações de empoderamento e valorização do saber negro. Depois de se reencontrar, ele voltou à ECA como palestrante e, a partir de junho, ocupará no Masp um espaço que já foi menos aberto ao não-branco.

Apesar de ter sido idealizada como uma série de 200 fotos, Aceita? evoluiu para algo mais. Hoje, Moisés planeja chegar às mil fotos e seguir contando. Ele explica que a série continua trazendo reflexões atuais e importantes à sua vida, e que, além disso, enquanto negro, criado na periferia, ele deseja ver sua mão envelhecer a cada novo clique.

Comodato com a B3 leva novidades ao acervo do MASP

Benedito Calixto, 'Porto de Santos', 1890. FOTO: Jorge Bastos

Uma ideia de muitos anos, segundo o assistente curatorial Guilherme Giufrida, acaba de ganhar forma e espaço no MASP. Um comodato, empréstimo por tempo determinado, com a B3, Bolsa de Valores de São Paulo (junção entre a BM&FBOVESPA e a Cetip) colocou no acervo do museu obras que estarão sob seus cuidados pelos próximos 30 anos. É o terceiro comodato acordado pela instituição desde que Heitor Martins assumiu sua presidência, em 2014.

Uma parte dessas obras podem ser vistas em exposição aberta no dia 14 de junho. Acervo em transformação: Comodato MASP B3 reúne 25 obras da seleção de 66 que foram selecionadas pelos curadores Adriano Pedrosa e Olivia Ardui. A curadora conta que a maioria delas vem dos escritórios da B3 em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Ao longo dos anos, todos os trabalhos foram catalogados, inclusive alguns foram expostos em áreas destinadas para exibição na Bolsa e foram cedidos para integrar exposições em instituições. Essa coleção já era sabida pela curadoria do MASP há alguns anos. “Acho que a B3 também estava nesse momento de transformação interna, com reforma do prédio. Então foi o contexto ideal para que eles também atentassem para a importância dessa coleção e de elas não serem apenas vistas pelos frequentadores do escritório da Bolsa”, conta Guilherme.

Além das obras de arte, o acervo da B3 conta com outros elementos como objetos de design e mobiliário, dentre outros. “Recebemos a lista do inventário da coleção e apontamos para algumas linhas que gostaríamos de ter”, explica Olívia. A partir daí, começaram a fazer visitas nos prédios da Bolsa com o departamento de restauro e de conservação. Algumas das obras estão, inclusive, sendo restauradas para serem exibidas posteriormente.

Para Guilherme, o comodato “preenche lacunas importantes de artistas que já existiam no museu e introduzem artistas que não estava contemplados no acervo”. A iniciativa trouxe novidades como Lygia Clark, Ione Saldanha e Abraham Palatnik. O comodato, como um todo, reúne nomes e obras expressivas da arte acadêmica, modernista e abstrata: além dos já citados, mais alguns deles são Edmund Pink, Benedito Calixto, Anita Malfatti e Emiliano Di Cavalcanti.

Neste ponto, como o próprio Guilherme pontua, o MASP tentou manter certo equilíbrio entre as escolas, com uma ênfase maior no modernismo, pois “é uma fase significativa da arte brasileira que tem algumas ausências no museu”, preenchidas com o comodato. Entretanto, o balanceamento permite que o público também veja expoentes da arte abstrata, “algo que não é tão comum nas exposições do museu, posto que os cavaletes têm um foco em arte figurativa ou com diálogo com a figuração”.

A exposição que comemora o comodato, em homenagem aos ex-conselheiros da BM&F e BOVESPA, fica em cartaz até 29 de julho. Apesar disso, já existe uma obra da coleção nos cavaletes. Em breve, outras também integrarão a exposição do 2º andar do Masp, fazendo parte da rotatividade do Acervo em Transformação.

 

O poético sensual em Cícero Dias

Cícero Dias, ‘Coqueiral’, déc 30

 

O imenso painel Eu vi o mundo… Ele começava no Recife não é para iniciantes. Neste trabalho, Cícero Dias, um dos nomes seminais da arte brasileira, traz um fluxo de energia em que mistura Eros e Tanatos, Freud e Proust, Casa Grande e Senzala, brisa e fogo dos canaviais, como multiplicidade heterogênea de um imaginário quase intransponível. Chama atenção no Salão de 1931, no Rio de Janeiro onde é considerada profusa, confusa, dramática, cheia de devaneios eróticos. Apesar dos ataques, a obra consolidou sua trajetória. Cícero Dias é considerado inexplicável. Não para Mário de Andrade, que ao descobri-lo logo o definiu: “Cícero possui uma personalidade surpreendente. Uma expressão formidável e seus valores psicológicos principais são a sexualidade, o sarcasmo e o misticismo”. Concordem ou não com Mário de Andrade, essa trilogia perpassa toda sua obra.

Um corte transversal na retrospectiva Cicero Dias, na Simões de Assis Galeria de Arte, em São Paulo, nos leva a reconhecer sua formulação criadora em pinturas, aquarelas e litografias, por meio de suas várias fases. Colecionar é uma convenção que traduz o fazer artístico, sentimento e anseio. Waldir Simões de Assis, além de galerista é colecionador e assina a curadoria da mostra. Amigo pessoal de Cícero Dias por várias décadas, conviveu com ele, cotidianamente, em Paris, quando ambos residiam na capital francesa. A exposição, aparentemente enxuta com 40 obras, toca em várias fases de Cícero Dias, abrangendo aquarelas e pinturas de 1920 a 1960 e litografias da série Suite Pernambucana. Waldir Simões, no texto do catálogo, lembra que Cícero Dias raramente dedicou-se às litografias. A primeira delas foi em 1933 quando ilustrou o livro Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre. Em Lisboa, em 1944, produziu imagens para o livro Ilha dos Amores, de Os Lusíadas, de Luís de Camões e, em 1983, em Paris, produziu a Suite Pernambucana, adquirida por Waldir Simões.

Exposto lado a lado, esse conjunto de obras diferentes entre si faz conviver trabalhos de movimentos díspares. O Sonho Tropical, aquarela sobre papel, de 1929, pode ser uma ode à vida liberta, uma trilha poética non sense, uma exaltação ao não território. Em contraponto, Coqueiral de 1930, óleo sobre tela, retrata um cotidiano real, vivido em uma vila, com moradores dispersos em dupla ou em trio em posições determinadas. A sexualidade que transborda do imaginário de Cícero Dias parece se concentrar no Encontro no Canavial, de 1930. A cena, inusitada retrata uma mulher nua deitada sobre uma cama, em plena “rua” de um canavial, tendo à sua frente um cavaqueiro, suposto capataz, o todo poderoso da fazenda de cana de açúcar. Cícero se apropria do real, e sonha uma situação limite entre a força e a sexualidade.

 

Em Musicalidade, de 1940, óleo sobre tela desvenda sua chegada ao abstracionismo por meio de formas inspiradas no Recife, assim como o uso das cores impregnadas pela arquitetura local. A influência de Kandinsky se deixa transparecer em meio à luz tropical, coqueiros, bananeiras, como reminiscências já borradas. Alegria de 1970, traz de volta as tonalidades de Pernambuco, agora de forma mais intensa assim com os personagens mais rígidos. Entropia XII de 1960, óleo sobre tela é como águas tintas que o artista deixa escorrer pela tela. O crítico francês Pierre Restany diz que após um grande período abstrato e lírico das Entropias enegrecidas, que abrange o período dos anos 50 e os ultrapassa, o artista na metade dos anos 60 tem uma expansão da noção tropicalista, num retorno às origens da sensibilidade.

Cícero Dias nasce em 1907, no Engenho de Jundya, a 53 quilômetros de Recife, mora no Rio de Janeiro onde estuda pintura. Em 1927 faz a primeira exposição e no ano seguinte abandona a Escola de Belas Artes. Em 1937, cria o cenário do balé de Serge Lifar e Villa Lobos, expõe na coletiva de modernos em Nova Iorque, viaja a Paris, onde se fixa.

O modernismo manifesta-se em São Paulo, na Semana de 22 e espalha-se pelo Rio de Janeiro, por outras vias e climas. Na capital federal, na época, alguns artistas nascidos em outros estados brasileiros começam a chamar a atenção, entre eles Ismael Neri e Cícero Dias. O escritor Mario de Andrade logo se encanta com o imenso painel assinado por Cícero Dias, Eu vi o mundo…, considerado muito erótico para a época. Os dois artistas, escreve Mário, são completamente loucos. “Cícero Dias, mais dentro do sonho, ao passo que Ismael vive dentro de uma realidade, por assim dizer translata”. O crítico Roberto Pontual definia Tarsila como a telúrica, Ismael o poeta-filósofo, Cícero o lírico, “todos os três mergulhando sua característica mais forte num mesmo mar de ondas simbólicas impregnadas de sexualidade”.

Em meio à efervescência daquele momento, Cícero Dias conhece Di Cavalcanti, ligado ao movimento modernista, de quem se torna amigo. Di o incentiva a mudar-se para Paris, onde ele já morava. Ao chegar à capital francesa Cícero Dias participa da Revue D’Anthropologie, publicação muito importante na época, para qual escreviam vários intelectuais. Logo faz amizade com o poeta Paul Élouard, entra para o Grupo Espace e a seguir é convidado a expor na famosa galeria de Denise René. Nessa época se deixa seduzir pelo surrealismo.

Trabalhando no domínio da pura intuição Cícero Dias cria uma antropologia pessoal carregada de cor, luz e liberto à fantasia. Conquista seu espaço na capital francesa e, mais que isso, a amizade de artistas importantes como Picasso e frequenta sua casa e vice-versa. Seu trabalho evolui para uma espécie de combinação da intuição, do enigma e alguma narrativa seja surreal ou verdadeira.

Durante toda a sua vida tentou contextualizar sua obra com o seu tempo e, por isso mesmo talvez tenha sempre surpreendido os críticos com soluções enigmáticas. Roberto Pontual fala das opções contraditórias que cercaram Cícero Dias e da lógica interna de sua obra, enquanto o francês Philippe Dagen simplesmente o classifica como “inexplicável”.

Serviço
Cícero Dias
Local: Galeria Simões de Assis. Rua Sarandi 113 – A, Jardins – SP.

Período de visitação: até 04/08
Horário de funcionamento: segunda a sexta-feira, das 10h às 19h. Sábado das 10h às 15h. Fecha aos domingos e feriados.
Telefone: (11) 3062-8980

Grito e silêncio na fúria dos vulcões

NEOARTE - Soluções Fotográficas para o Mercado de Arte / www.neoarte.net

A fúria de um vulcão não intimida Manuela Ribadeneira, artista equatoriana residente em Londres; ao contrário, a instiga científica e artisticamente. De seu desafio sobre a associação entre fenômenos geológicos e sociais como corpo de nova pesquisa nasceu Ouça, exposição que toma todo o andar térreo da Casa Triângulo, até o dia 14 de julho próximo.

Tudo começou há dois anos quando Manuela foi a Armero, cidade colombiana, para conhecer de perto a chamada “Pompeia contemporânea”. Lá, em 1985 aconteceu a grande tragédia que matou a metade dos 50 mil habitantes soterrados nas lavas do vulcão Nevado del Ruiz. “Estar em Armero me impressionou muito ao conversar com as pessoas e saber que o desastre natural, logicamente, não poderia ser evitado, mas a tragédia poderia ter sido bem menor se houvesse um alerta sobre a erupção”.

O resultado desse mergulho no tempo transformou-se em uma mostra científico-poética, repleta de dinâmicas sociológicas, composta por escultura arquitetônica de grande escala, desenho topográfico direto na parede, conjunto de esculturas em vidro soprado, fotografias, vídeo e desenhos sobre papel, além de uma instalação sonora. Na opinião de Manuela, a emergência da história na sociedade contemporânea, rodeada de catástrofes naturais, sociais, econômicas, humanas, políticas, que podem ser previstas pelo homem, é cada vez maior. “A partir daí comecei a fazer investigações de textos científicos e encontrei alguns nos Estados Unidos em que se pode saber quando os vulcões vão entrar em erupção. Os cientistas gravam os sons que não são percebidos pelo ouvido humano, os comprimem para estudá-los e fazem uma representação de sons em barras, como aqueles que são mostrados em celulares quando gravamos algo como sound way. Queria muito trabalhar com os textos deles porque fazem metáforas de ritmos de instrumentos musicais”.  Temblores Armónicos III (Harmonic Tremors III) é um imenso desenho que cobre as paredes de uma das salas, realizado a partir da remoção da superfície pintada, onde Manuela cria um desenho topográfico e sonoro. “Uma instalação sonora”, define.  Ao percorrer a exposição, o visitante vai encontrando a memória da parede e do espaço e tem a noção do que está escondido. Aos poucos percebe os ritmos, os golpes sonoros, como um instrumento, se fazendo cada vez mais frequente e cada vez mais alto, até chegar a um ponto em que o vulcão grita. “Esta imagem não é minha, são os cientistas que fazem estes estudos que descrevem como um zumbido acompanhado de sons percussivos produzidos por um instrumento como um órgão ou uma combinação de instrumentos musicais tocados em frequências muito baixas. ” Estes são chamados de Tremores Harmônicos. A frequência e o tom desses tremores aumentam até o que soa como um grito. Quando a frequência atinge um nível altíssimo e não aguenta mais a pressão, ela fica quieta. São os trinta segundos de silêncio precedem a erupção. “Os cientistas encontraram este padrão de comportamento em alguns vulcões e pensam que, eventualmente, pode ser uma maneira de se prever uma catástrofe como a que se viu agora na Guatemala”.

Uma grande parede escultórica corta a galeria e exibe a palavra Ouça, que dá nome à exposição. É uma parede de sons, pode ser um convite, uma advertência, uma ordem, uma palavra que tem essa ambiguidade. Ainda nesta sala, pequenas esculturas sobre o piso exibem dedos de bronze apontando para diversas direções com o título de Los Culpables (The Guilty One) “São dedos de um braço de um santo colonial colombiano de terracota que eu tinha em minha casa em Quito. Durante um tremor de terra esse braço caiu no chão e os dedos se quebraram. Então os refiz em bronze. São chamados de Culpados, porque sempre que há uma catástrofe os deuses começam a culpar, não importa quem: `Você é o culpado`. ´Vocês são culpados´ e, assim por diante”.

A imagem-referência da erupção vulcânica é progressivamente decodificada como o elemento principal ao redor do qual todos os elementos da exposição orbitam, reaparecendo de diferentes formas ao longo da exposição. Os vidros soprados, expostos em uma vitrine, que formam uma instalação na segunda sala, representam os 30 minutos de silêncio do vulcão, que Manuela pediu para os artesãos cristalizarem. “Eles sopraram exatamente 30 segundos de ar, que formam uma partitura de silêncios. Essas formas, são formas de anotações musicais, uma pausa numa partitura, de trinta segundos”.

Na mesma sala, sobre a parede uma série de desenhos a tinta se referem à pesquisa histórica, assim como todo o seu trabalho. “Esta parte é histórico-científica, olhei muita pintura dos séculos 18 e 19 e de como representavam as erupções vulcânicas e então eu fiz minhas versões dessa representação”. São como anotações de cadernos, uma sequência de pequenos desenhos que formam uma única peça; me interessam as sequências, porque todas sequências são circunstanciais.

Uma foto desta sala mostra a imagem difusa de um homem suspenso no ar por um jato de água. “Essa peça eu tomei de uma fotografia que saiu na imprensa, feita por um fotógrafo durante uma manifestação política em Londres, no momento em que um caminhão tipo “brucutu” atinge um militante e o levanta: a foto mostra o momento antes dele cair no chão. Quis fazer uma relação como um golpe de uma coisa inesperada, como os policiais fazem nessas horas com suas mangueiras de água”.

Fecham a mostra dois diapasões usados para afinação de instrumentos musicais, chamados Harmonia e Dissonância. Uma metáfora de que, apesar de tudo, ainda podemos afinar os sons que nos rodeiam.

A Visita

A visita da escola no Instituto tome Tomie Ohtake foi um dos melhores passeios que eu já tive. Pela primeira vez eu conseguir ver obras de arte que são difíceis de se ver por aí, uma delas é do famoso e renomado pintor Pablo Picasso, uma lenda do mundo das pinturas, o nome dado a essa obra é ”Arlequim Sentado” ela entre todas foi a que mais me chamou a atenção.

A exposição do instituto tem muitas variedades de obras, entre elas havia obras de Salvador Dali, Cândido Do Portinari, entre outros gigantes do mundo da arte.

Quando nós chegamos no local, eu havia deduzido que o passeio seria muito entediante e sem graça, porém quando entendi a origem dos quadros e suas características, eu vi que aquele passeio seria algo bem especial para mim, pois eu nunca havia tido qualquer oportunidade semelhante a essa.

Não há palavras para explicar o sentimento de ver uma obra de Pablo Picasso na sua frente e ainda poder tirar foto da obra, é algo sem igual, resumindo, é uma experiência que eu irei guardar para sempre.

Uma parte do passeio que foi muito interessante, foi quando os funcionários do instituto exploraram nossa criatividade com músicas bastante exóticas e também explorando o nosso lado artístico, todos os alunos se arriscaram a fazer suas obras.

Em relação à estrutura da instituição, também é maravilhosa, com lojas de lembranças, mesmo a loja sendo pequena havia muitas lembranças interessantes. O passeio foi bastante interessante e inovador, porque eu nunca tive nada desse tipo na escola. Até a bagunça no fundo do ônibus foi muito legal, o passeio foi espetacular!

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A visita da escola no Instituto tome Tomie Ohtake foi um dos melhores passeios que eu já tive.  Pela primeira vez eu consegui ver obras de arte que são difíceis de se ver por aí, uma delas é do famoso e renomado pintor Pablo Picasso, uma lenda do mundo das pinturas, o nome dado a essa obra é ”Arlequim Sentado” ela, entre todas, foi a que mais me chamou a atenção.

A exposição do Instituto tem muitas variedades de obras, entre elas havia obras de pintores como Salvador Dali, Cândido Do Portinari, entre outros gigantes do mundo da arte.

Quando nós chegamos no local, eu havia deduzido que o passeio seria muito entediante e sem graça, porém, quando entendi a origem dos quadros e suas características, eu vi que aquele passeio seria algo bem especial para mim, pois eu nunca havia tido qualquer oportunidade semelhante a essa.

Não há palavras para explicar o sentimento de ver uma obra de Pablo Picasso na sua frente e ainda poder tirar foto da obra, é algo sem igual, resumindo, é uma experiência que eu irei guardar para sempre.

Uma parte do passeio que foi muito interessante, foi quando os funcionários do instituto exploraram nossa criatividade com músicas bastante exóticas e também explorando o nosso lado artístico. Todos os alunos se arriscaram a fazer suas obras.
Em relação à estrutura da instituição, também é maravilhosa, com lojas de lembranças, mesmo a loja sendo pequena havia muitas lembranças interessantes. O passeio foi bastante interessante e inovador, porque eu nunca tive nada desse tipo na escola. Até a bagunça no fundo do ônibus foi muito legal, o passeio foi espetacular!