Page 41 - ARTE!Brasileiros #57
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Criatividade, liberdade e experimentação nortearam as oficinas
envolvendo barro e música, com 14 residentes de Belo Jardim
pessoa importante no projeto que se
estendeu até aquela área.
Com o trabalho concluído, uma das
formas de viabilizar a exposição, que
acontece digitalmente, foi gravar o som
em estúdio, separado dos instrumentos.
Por motivo de orçamento não houve a
queima do barro, o que deve ocorrer
mais tarde, segundo Tejo. “Tínhamos
a urgência de falar a partir do Teatro
Legislativo, do Boal, isso era importante
nesse contexto e era nossa prerrogativa.
Cada elemento da equipe vive em lugar
diferente, com sua formação, descons-
truindo o protagonismo do curador.
Tudo foi pensado em rede, cada um
com o seu saber”, comenta Tejo.
Os instrumentos estão prontos,
alguns com curva volumosa que se
de Phonosophia. Ele consiste em uma das técnicas multiplica em bocais, outros com sua exterioridade cur-
do Teatro do Oprimido que une teatro e política, numa vilínea que lembra um vaso de flores. Todos escondem
espécie de cidadania ativa. seu som secreto que corresponde, de modo sutil, aos
Camila conheceu os residentes no início dos traba- humores, ritmos e objetivos diversos de seus autores. Os
lhos quando ficou na cidade e, como não foi possível objetos/instrumentos exteriorizam os aspectos formais
voltar para outra imersão por causa da pandemia, do aprendizado e agora se transformaram em protótipos
David Biriguy fez a ponte entre a curadoria e os resi- digitais. Os residentes escolheram os três locais onde
dentes. Cristiana Tejo lembra que ele foi identifican- os instrumentos serão mostrados em situações espa-
do as pessoas e chegaram a um time afinado. Os 14 ciais de contraste: na cidade de Belo Jardim, na fábrica
participantes foram divididos em três grupos, por Mariola e nas margens de uma cachoeira, tudo em vídeo
questões sanitárias. Camila convidou Amália Lima, mostrando obras, espaços, pessoas, com direção de
que é coreógrafa, paraibana radicada no Rio há anos Ruda Cabral. Tejo considera a cena final meio surreal:
e preparadora de corpo para espetáculos de dança, um instrumento sozinho figurando num espaço e o som
teatro e para a tv Globo. Elas tiveram encontros digitais gravado ecoando digitalmente. Lembrando Jean-Paul
duas vezes por semana. “Eu passava os exercícios de Sartre, esses músicos/ceramistas souberam dar à sua
som e a Amália os de corpo. Aos poucos os grupos matéria a única unidade verdadeiramente humana: a
foram unindo o corpo, o barro e o som. “As atividades unidade do ato. É isso que difere um projeto estrutura-
de Amália propõem exercícios corporais que mantêm do de outros expostos ao exotismo turístico, chamariz
os desejos, partindo do corpo até a elaboração do para artistas estrangeiros em trânsito. A Residência
FOTOS: JADIEL SILVA palavra, uma nota. Cada instrumento toca uma nota, depende do atual governo. A esperança é que em 2023
Belojardim talvez não ocorra no próximo ano, tudo
instrumento. O desejo pode ser uma sentença, uma
tudo volte ao normal e a cultura reencontre o seu lugar,
um som.” Elaine Lima, líder da comunidade quilombola
do Barro Branco, na região do Belo Jardim, foi outra
de onde nunca deveria ter saído.
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