Page 31 - ARTE!Brasileiros #57
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conta ela, que foi tanto observadora quanto agente da
transformação desta perspectiva ao longo das décadas.
Curiosamente, com a atual pandemia de Covid-19 e
o longo confinamento das pessoas em suas casas, a
curadora nota um retorno maior a essa mídia: “É inte-
ressante pensar como o vídeo, nesse momento, ocupa
um lugar central em todos os campos da cultura. O
vídeo é o modo de comunicação, é a expressão possível
nesse momento, é o que está nos conectando”, afirmou
à arte!brasileiros ainda em 2020.
Uma outra longa batalha travada pelo vB ao longo
das décadas, talvez mais dura e permanente, se refere
à decisão da associação de se dedicar à produção
artística do chamado Sul Global, definido em uma de
suas publicações como “termo que se refere à condição
cultural, econômica e política de países e territórios à
margem da modernização hegemônica e do capita-
lismo central”. Após a internacionalização do festival
na passagem dos anos 1980 para 1990 e a inclusão do
termo “arte eletrônica” no nome do evento em 1994, o
Videobrasil se firmou de fato como plataforma dedicada
a produções “de fora do eixo tradicional formado pela
Europa e pelos Estados Unidos”.
O conceito de Sul Global, no entanto, esteve sempre
em transformação e não deixa de incluir também terri-
tórios internos aos países centrais: “É um Sul político,
não exatamente geográfico. Não é recortar o globo no
meio”. A aproximação com diversas regiões da África,
América Latina, Oriente Médio, Leste Europeu e Ásia,
entre outros, colocou o vB em um lugar de vanguarda,
mas criou também uma série de dificuldades em um
mundo geopoliticamente tão desigual. “Inclusive entre
os artistas, alguns me diziam: eu não quero ir para África,
quero ir para Paris. Porque todo mundo, para existir,
queria ir ou para a Europa ou para os Eua”, conta. “Foi
uma militância nossa a de tentar criar pontes, redes, que
possibilitassem o trânsito entre nós do Sul Global, para
que ele pudesse existir sem que os artistas tivessem
sempre que ser chancelados pelo norte.”
Se a questão está longe de estar resolvida, Farkas
percebe uma enorme mudança nos dias de hoje, com
a proliferação, por exemplo, de espaços culturais e
residências artísticas em lugares antes excluídos do
mapa global das artes. Na entrevista concedida em
2020, no primeiro pico da pandemia, ela afirmou: “Existe
Acima, parte da exposição
da 20ª Bienal Sesc_ uma coisa interessante – se é que é possível falar de
Videobrasil, em 2017, no alguma coisa interessante nesse momento em que há
Sesc Pompeia; ao lado, de tanto sofrimento, tantas pessoas padecendo -, que é
cima para baixo, cartazes que todas as grandes certezas, as diretrizes sempre
do 1º, do 2º, do 9º e do 10º
festivais Videobrasil colocadas de lá para cá, do Norte para o Sul, estão
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