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MERCADO BALANÇO 2021
os ingressos disponibilizados, e contou com 40 mil que sabe o que gosta, que já vem com material para
acessos em sua versão virtual. Para a Gomide & Co., a iniciar o diálogo. Acho que isso também tem muito a ver
feira apresentou um dos melhores resultados do ano. A com a internet, com esse enorme acesso à informação”.
Verve Galeria vendeu 95% do primeiro acervo exposto Tem a ver também, segundo Perlman, com a expansão
e a Portas Vilaseca vendeu a totalidade de obras sele- de uma rede de profissionais qualificados voltados a
cionadas antes mesmo do fim do evento. A ArtRio, por apoiar este mercado, desde os chamados art advisors e
sua vez, contou com 14.500 pessoas na versão física e, avaliadores até os catalogadores e restauradores, entre
pouco após a edição, anunciou sua expansão em uma outros. “Ou seja, toda uma infraestrutura de serviços
nova empreitada: a ArtSampa, uma feira em território que facilita o crescimento do mercado”, explica.
paulistano com data já marcada para março de 2022. Segundo Brenda Valansi, o impacto desta geração
Cabe, porém, destacar que ambas as feiras - assim mais jovem foi sentida na ArtRio de 2021, e se relaciona
como as internacionais - aconteceram de forma mais também a uma produção mais engajada no país: “O que
local, com menos expositores e visitantes estrangei- eu percebo que acontece no mercado, em decorrência
ros, em decorrência das dificuldades de trânsito entre do contexto político e social, é uma mudança na escolha
países provocadas pela pandemia. Outras alterações dos artistas e dos assuntos tratados, que acompanham
de público também foram notadas, não só nas feiras, as discussões que estão acontecendo na sociedade.
mas na cena artística como um todo. Junto a isso, há um fortalecimento de um colecionismo
ativista, uma preocupação do colecionador em ser mais
entre ativismo e finanCeiriZação socialmente atuante, e isso se dá muito fortemente com
Mesmo sendo um movimento já perceptível ao longo as novas gerações. Então o mercado precisa também
dos últimos anos, o período pandêmico viu se intensi- estar atento e oferecer outros caminhos”. Em uma escala
ficar a entrada de novos compradores no mercado de global, o foco internacional na arte latino-americana e
arte, especialmente jovens, alguns dispostos a ter uma produzida por grupos minorizados - negros, indígenas,
postura mais “ativista”, outros interessados em fazer mulheres ou população lGBtQia+ - também favorece o
negócios. Este movimento, verificado globalmente, mercado brasileiro. Servem como exemplo - em uma
inclui especialmente os chamados millenials - gera- faixa mais elevada de preços - a venda realizada pela
ção que tem hoje entre 20 e 40 anos -, como mostra a Gomide & Co. para o Guggenheim de Abu Dhabi, em
pesquisa da Art Basel e uBs: “A mudança para o digital 2020, de uma obra de Lygia Clark por cerca de R$ 10
trouxe melhorias na transparência de preços, acesso milhões; ou a transação recente, em leilão da Sotheby’s
a informações e aos artistas. A redução das barreiras Nova York, de um autorretrato da mexicana Frida Kahlo
de entrada no mercado permite o desenvolvimento por quase R$ 200 milhões - valor recorde para uma obra
de uma base mais ampla de novos colecionadores em de artista latino-americano.
diferentes níveis de preços”, diz o relatório. Mas há ainda uma parcela cada vez mais significativa
Ao menos parte dos galeristas brasileiros percebeu de compradores, como revelam pesquisas nacionais e
este movimento em seu dia a dia. “Houve um cresci- internacionais, que está pouco - ou nada - preocupada
mento de compradores de 35 a 45 anos. Não foram com o conteúdo dos trabalhos, mas apenas com a arte
apenas os colecionadores tradicionais que alimentaram enquanto investimento financeiro. Perlman, ao analisar
o mercado de arte neste período, mas sim novos. Ou dados divulgados este ano pela consultoria Deloitte,
talvez pessoas que nem sejam ainda colecionadores, explica que há um grupo crescente de compradores
mas novos compradores com potencial de se tornar mais jovens, “ligado a tudo que é digital, inclusive arte
colecionadores”, afirma o galerista Murilo Castro. Gomi- digital”, que entra no mercado para fazer negócios, ou
de e Strina, que trabalham com obras em faixas de seja, comprar e vender obras com relativa velocidade,
preços mais elevadas, também perceberam a mudança, não colecioná-las. Surgem cada vez mais, neste sentido,
por mais que ressaltem que a manutenção dos velhos tipos de operações em que o comprador nem mesmo
compradores seja essencial. se torna dono da obra, mas apenas de uma fração do
“É um público consistente e que já chega com muita trabalho, como quem compra ações na Bolsa de Valores. FOTO: ANGELA WEISS / AFP VIA GETTY IMAGES
informação”, relata Cravo, atuante há 40 anos no merca-
do. “Até os anos 1990 sinto que a gente precisava informar a DesigualDaDe Que não afeta o merCaDo
muito mais o novo cliente, que vinha com vontade, mas Para Thais Darzé, essa relação da arte como investi-
muito cru. Hoje você observa o jovem que já pesquisou, mento talvez seja um dos motivos que leve os anos de
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