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EXPOSIÇÕES NOVA YORK




























            uma apropriação permanente de
            referências do campo da psicaná-
            lise – “tem alguns conceitos psica-
            nalíticos que eu pego emprestado
            sem maiores compromissos con-
            ceituais, acadêmicos; um vocábulo
            rico que me permite fazer essas
            derivas, essas brincadeiras” –,
            Rivane alerta para a necessidade
            de nomear, corporificar e enfrentar
            os medos, em suas dimensões
            íntimas ou coletivas. “A gente
            acorda todo dia, inclusive lutando
            contra esse medo. Então, temos
            que lutar contra essa melancolia,
            mas é difícil porque a destruição
            é muito grande. A gente fica muito   À espreita (Capeta), 2020
            tocado, porque a coisa é suicidária.
            A destruição é em todos os sen-
            tidos. Ela é física, ela é simbólica,
            acontece para todo lado. As atrocidades imorais que   estupro como ato inaugural da sociedade brasileira.
            eles cometem em nome de uma falsa moralidade é     Esses trabalhos, sobretudo as tapeçarias, reforçam
            algo estarrecedor”, acrescenta.                 também a importância das referências e do trabalho
               E ela também tem suas raízes na história. A série   coletivo na trajetória de Rivane. Decidida a transpor
            Trópicos Malditos, Gozosos e Devotos, referência à   essas imagens - situadas em uma tênue fronteira entre
            obra com título similar de Hilda Hilst e que nomeia   erotismo e agressão, desejo e violência - para outra
            toda a exposição de Rivane, propõe um interessante   linguagem que não apenas a pintura, a artista optou
            amálgama de referências, sexuais, simbólicas e histó- por incorporar o trabalho de outros artesãos na feitura
            ricas, que remetem tanto à nossa situação periférica   da obra. Convidou três artistas que dominam a técnica  FOTOS: CORTESIA DA ARTISTA E TANYA BONAKDAR GALLERY
            como à relação predatória e violenta da nossa colo- desenvolvida por um tapeceiro uruguaio, Ernesto Aro-
            nização. Inspiradas nas Shungas, gravuras eróticas   ztegui, para que participassem do projeto: Elke Hülse,
            japonesas do período Edo (1603-1867) e também tribu- Magalí Sánchez Vera e Jorge Soto. Num processo lento
            tárias da simplificação gráfica da literatura de cordel,  e cuidadoso eles transferiram por meio do tear as ima-
            essas pinturas e tapeçarias são representações de   gens cuidadosamente planejadas por Rivane, com um
            intensos embates que remetem, segundo à artista, ao   desafio pela frente: propor uma leitura pessoal para

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