Page 26 - ARTE!Brasileiros #52
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SEMINÁRIO INTERNACIONAL DIA 1










            como aquele em defesa do meio-ambiente capitaneado   ou tornando quase impossível a solidariedade. “É pre-
            pela resistência de Gretta Thunberg, as diversas mani- ciso reativar o corpo erótico da sociedade”, afirma o
            festações que eclodiram em 2019 ao longo de todo o   filósofo, que se revela extremamente preocupado com
            planeta e a explosão do movimento antirracismo nos   os efeitos devastadores dessa doença, não apenas no
            Estados Unidos.                                 plano físico mas no plano psíquico. “A proximidade
               O tema adotado pelos protestos norte-americanos,  da pele se tornou uma espécie de perigo metafísico”,
           “não consigo respirar” (em referência aos assassinatos   diagnostica ele, dizendo temer os efeitos dessa sen-
            de Eric Garder e George Floyd pela polícia), tornou- sibilização fóbica em relação ao corpo, ao beijo. Mas
           -se peça estratégica na reflexão de Berardi, servindo   alerta que é preciso ter consciência de que, apesar
            inclusive de título para Asfixia: Capitalismo Financeiro   do perigo representado pelo vírus, ele não é a causa
            e Insurreição da Linguagem, uma das três obras de   de nossos males. O filósofo, que desde a juventude
            sua autoria publicadas no Brasil pela editora UBU. Se   se alinha com movimentos libertários como Maio de
            o trabalho já apontava e refletia sobre o sufocamento,  1968 e o movimento autonomista italiano, ousa dizer
            literal e metafórico, da sociedade contemporânea, a   que vivemos um momento apocalíptico. Afinal, em seu
            questão acabou adquirindo novos desdobramentos com   sentido etimológico, “apocalipse quer dizer revelação,
            a eclosão da pandemia do novo coronavirus, doença que   uma repentina compreensão de que algo deu horrivel-
            debilita profundamente o sistema respiratório. Vivemos,  mente errado”.
            segundo Bifo, “a convulsão de um corpo sufocado”.   “A real origem do desastre atual é a agressão capita-
               Os efeitos da pandemia, comparada por ele a uma   lista contra a liberdade das pessoas, do meio ambiente,
            tempestade avassaladora, que vem matando milhares e   a aceleração do ritmo de exploração, o extrativismo.
            torna mais próxima a ideia de que a sobrevivência huma- Tudo isso deixou a democracia esvaziada. Estamos
            na está em risco, de certa forma contiveram a potência   sem poder”. E não adianta mais pensarmos em termos
            transformadora dos movimentos sociais, dificultando   nacionais, já que os efeitos desse esvaziamento da
                                                            política se espalham, como o vírus, pelo mundo todo. A
                                                            epidemia de certa forma evidencia  o impasse diante do
            “A real origem do desastre atual                qual estamos. Torna mais intenso e palpável o colapso.
            é a agressão capitalista contra a                 “A Covid-19 não é a catástrofe em si”, afirma Berar-
            liberdade das pessoas, do meio                  di, que no calor da hora, durante o confinamento da
            ambiente, a aceleração do ritmo                 quarentena, escreveu uma espécie de diário. Extremo
            de exploração, o extrativismo”                 – Crônicas da Psicodeflação mergulha no significado
                                                                                    dessa pandemia, procu-
                                                                                    ra analisar os efeitos dela
                                                                                    no inconsciente coletivo e
                                                                                    reaviva as esperanças de
                                                                                    uma mudança profunda,
                                                                                    norteada pelo prazer e não
                                                                                    pela política destrutiva de
                                                                                    “gente que odeia o mun-
                                                                                    do, porque odeia a própria
                                                                                    vida”. “A razão política não
                                                                                    consegue lidar com esse
                                                                                    tipo de contração, de
                                                                                    sofrimento. A psicanálise,
                                                                                    a música, a poesia é que
                                                                                    são as línguas políticas do   FOTO DIVULGAÇÃO
                                                                                    futuro.”

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