Page 62 - ARTE!Brasileiros #51
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ARTIGO COLONIZAÇÃO NA ARTE








            conceitualização de suas produções. Para o artista,   conhecido termo “nipo-brasileiro” e a migração
            curador e ativista Denilson Baniwa, outro artista   japonesa como referência. “É preciso começar a
            indígena em destaque, esse movimento de artistas   entender a participação de outros grupos asiáticos
            indígenas já existe há muito tempo, mas apenas   na conformação da sociedade brasileira, como as
            nos últimos anos foi acessado com mais atenção   comunidades chinesa, sul-coreana e indiana, dentre
            pelas redes não indígenas. Segundo ele, “foi    outras múltiplas migrações advindas da região”.
            através da coragem desafiadora de alguns artistas   Além disso, “o reconhecimento dessa população
            que lugares foram abertos, gerando uma rede     como racializada também é parte fundamental para
            crescente de outros artistas que já produziam ou   o engajamento na luta antirracista”.
            que começaram a produzir com mais liberdade”.      O galerista também aponta que é importante
            De acordo com ele, “esse movimento contribui não   a adoção de políticas que visem a ampliação de
            apenas para os artistas indígenas, mas, sobretudo,   pessoas racializadas nos quadros de funcionários das
            para demonstrar que há um outro tipo de visão   instituições de arte, reforçando a sua presença em
            possível de arte, e que pode servir de base para a   todas as instâncias e lhes garantindo maior autonomia
            construção de um meio decolonial e crítico”.    profissional, inclusive nos postos de decisão e cargos
               Os artistas indígenas, assim como os demais   de gestão. Ele complementa dizendo que a Diáspora
            que são racializados pelo sistema, possuem      Galeria é uma “possibilidade de criar isso enquanto
            dificuldade de inserção nas coleções museológicas,   uma rede produtiva integralmente racializada,
            nas galerias de arte e nos acervos privados de arte   que possa suprir e se distanciar das práticas do
            contemporânea. É comum encontramos galerias     circuito até então hegemônico e apresentar outras
            brasileiras que não possuem nenhum artista negro,   possibilidades de organização dentro desse sistema”.
            indígena ou de origem asiática em suas listas. Como   E que, para além desse compromisso, “o espaço
            crítica a esse mercado excludente, o arquiteto e   apresenta uma possibilidade de transformação para
            urbanista Alex Tso, brasileiro filho de imigrantes   o sistema das artes, acreditando em sua capacidade
            chineses, abriu a primeira galeria dedicada a artistas   de ser menos excludente, menos branco, menos
            cujas vidas são marcadas pela racialização. Segundo   elitizado; e mais crítico, mais posicionado e envolvido
            o site da instituição, por compreender a necessidade   com a sociedade”.
            de lançar um olhar atento para as “questão de      Empenhar-se na construção de um novo futuro
            gênero, raça, classe e territórios geopolíticos”, a   para as artes brasileiras é entender-se enquanto
            Diáspora Galeria se propõe a defender a “articulação   agente de mudança. É compreender que são ações
            de uma rede de colecionadores que reconheçam    diárias que as tornarão permanentes. Para isso, é
            o valor de mercado como indissociado do valor   fundamental a mudança de postura, a autocrítica,
            histórico da produção artística dos artistas”,   a crença no trabalho coletivo, a cobrança de
            que não entenda a arte apenas pela “circulação   políticas públicas para o setor, a realização dos
            única como objeto e valor monetário”, mas que   revisionismos históricos, dos critérios estéticos, das
            a expanda “enquanto legado de ancestralidade    nomenclaturas, das linguagens, dos termos, entre
            e identidade, tornando-se simultaneamente       tantas outras ações. Combater a hegemonia branca
            proponente de uma nova contemporaneidade”.      nas artes é um desafio que deve ser enfrentado por
            Para Tso, o reconhecimento da população brasileira   todos e todas. Rejeitá-la é acreditar em um novo
            de ascendência asiática deve extrapolar o já    projeto de futuro para as artes brasileiras.


            REFERÊNCIAS                                     Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
            herKenhoff, Paulo. Tomie Ohtake, gesto e razão geométrica.   Universidade de São Paulo (fflCh-usp). 2018. Pág. 21.
            Instituto Tomie Ohtake. 2014. Pág. 14           Coletivo Mulheres Negras nas Artes: https://
            KilomBa, Grada. Memórias da Plantação - Episódios de Racismo   mulheresnegrasnasartes.tumblr.com/
            Cotidiano. Editora Cobogó. 2019.                Diáspora Galeria: http://diasporagaleria.com.br/
            meneZes, Hélio. Entre o visível e o oculto: a construção do   Laboratório de Curadoria de Exposições Bisi Silva: https://www.
            conceito de arte afro-brasileira.               facebook.com/metodologiasdecuradoriadeexposicao/
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