Page 88 - ARTE!Brasileiros #50
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LIVRO ESPAÇOS DE TRABALHO DE ARTISTAS LATINO-AMERICANOS
Livro mapeia ateliês
de 27 artistas latino-
americanos, com ensaios
fotográficos e entrevistas
por Fabio Cypriano
ONDE SE
CRIAM NOVOS
MUNDOS
o rio mapoCho, que atravessa a cidade de Santiago, masculina e branca já é uma busca inevitável. Para um
no Chile, foi o local escolhido pela artista Cecília Vicuña livro bancado pela Lei de Incentivo à Cultura, ou seja,
para representar seu ateliê no livro Espaços de Traba- verba pública, deveria ser padrão obrigatório.
lho de Artistas Latino-Americanos, lançado agora no O ensaio de La Barra, poético na forma e no con-
início de 2020, sob coordenação editorial de Fernando teúdo, é uma boa introdução ao tema, afinal o ateliê do
Ticoulat e João Paulo Siqueira Lopes. artista é um lugar altamente estereotipado e o curador
“Domesticado e transformado em esgoto e depósito mexicano radicado no Rio de Janeiro aborda muitas
de lixo químico”, segundo a artista chilena, ela conta, na das possibilidades que ele hoje representa, sendo tan-
publicação, que “trabalho no rio para recuperar o sentido to “um lugar de revolução e ativismo”, como também
de que esse é um lugar majestoso”. Em sete páginas, média responsável por “gentrificar a área”.
dedicada a cada artista, o rio é visto em uma situação Outra definição significativa de La Barra é que
de fato catastrófica, quase desaparecendo, o que se “entrar no ateliê é como estar do outro lado do espelho”,
transforma em uma espécie de manifesto, de obra em si. parafraseando a Alice de Lewis Carroll. Mas é um pouco
Dos 27 selecionados para a publicação, Vicuña, que isso que o livro consegue, já que além das imagens
há 38 anos vive em Nova York, mas sempre retorna à dos “espaços de criação”, entrevistas concisas, mas
sua terra natal, foi a mais ousada para apresentar seu aprofundadas, conduzidas pela jornalista Beta Ger-
espaço de criação. Todos os demais abriram seus ateliês mano, dão conta do que representa o ateliê para cada
convencionais, mesmo que tais locais, como indica Pablo artista, assim como algumas linhas poéticas de sua
Leon de la Barra no ensaio que abre o livro, sejam “o obra, revelando assim esse outro lado do que em geral
lugar que permite ao artista sonhar novas obras, novos se vê da produção artística.
mundos”. O fotógrafo Fran Parente é o responsável por Outra metáfora do ateliê é lembrada no texto de
todas as imagens do livro. introdução de Germano, lembrando uma ideia de Ronal-
Vicuña, na faixa dos 70 anos, é de uma geração do Brito: “O artista no ateliê é como o leão na selva e o
de pioneiras na produção artística latino-americano, artista no museu é como o leão no zoológico”.
que só recentemente conquistou espaço no circuito Artistas brasileiros seriam suficientes para uma
internacional, caso também da colombiana Beatriz publicação deste porte. Nomes não faltam, como
Gonzalez, das argentinas Liliana Porter e Marta Minujín, Claudia Andujar, Regina Silveira, Anna Maria Maiolino,
e da mexicana Graciela Iturbide, todas participantes do Rosângela Rennó ou Nelson Leirner, entre tantos outros.
livro, um mérito na seleção. Representatividade, aliás, Mas o recorte latino-americano revela-se altamente
foi uma questão seriamente observada na publicação: necessário, ao construir um caráter de identidade que
há artistas negros, casos dos brasileiros Lucia Laguna nem sempre nós brasileiros estamos acostumados. E
e Arjan Martins, e indígenas, como se declara a pró- é nos depoimentos dos hermanos e hermanas, como CREDITO IMAGENS DIVULGAÇÃO
pria Vicuña. É um sinal positivo de que, ao menos no Cecilia Vicuña e Alfredo Jaar, ambos do Chile, ou Beatriz
campo da arte, a preocupação em evitar as narrativas Gonzalez e Miguel Ángel Rojas, da Colômbia, que a
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