Page 70 - ARTE!Brasileiros #50
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NAS BORDAS VERAS






                  Quando fala do Veras, Mattos costuma
                  referir-se no plural, “nosso projeto”, o que
                  inclui sua companheira e outros quatro
                  amigos,  “que não são do campo da arte”







                          jurídica da maioria dos museus privados no   aproximar experiências antes experimentadas
                          Brasil”, como define o curador.         apenas no contato com buscadores de cami-
                            O edifício de 1.100 m foi concebido pelos   nhos espirituais. Foi quando me deparei com
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                          escritórios Terra e Tuma Arquitetos Associados   a obra de artistas que pareciam ir no mesmo
                          e Gabriella Ornaghi Arquitetura de Paisagem,  sentido e tive a sensação de pertencer a uma
                          ambos de São Paulo.  Terra e Tuma ganhou, em   vasta comunidade”, afirma o curador.
                          2016, o prêmio de melhor casa do mundo pelo   Para ele, referências para o trabalho no novo
                          ArchDaily, graças à moradia de Dona Dalva, na   centro cultural serão, entre outros, os experimen-
                          Vila Matilde.                           tos de Joseph Beuys (1921 – 1986), o misticismo
                            O nome Veras vem da rua onde ele se   de Mondrian (1872 – 1944) ou de Agnes Martin
                          encontra, Vera Linhares, no centro da Ilha   (1912 – 2004), a condição clínica dos últimos
                          de Florianópolis, que não coincide com o   experimentos de Lygia Clark (1920-1988) assim
                          centro da cidade, mas está a 500 metros   como o criador dos happenings, Allan Kaprow
                          das duas universidades públicas da capital,  (1927 – 2006) ou o suprassensorial Hélio Oiticica
                          a Federal e a Estadual. Contudo, Veras tam- (1937 – 1980) com a arte ambiental. Da atualida-
                          bém poderia ser uma referência aos Vedas,  de, ele aponta Jorge Menna Barreto, “que fez
                          os quatro livros que formaram o sânscrito e   da escultura social do Beuys o que ele chama
                          de onde, de fato, vem a inspiração para os   escultura ambiental, envolvendo comunidades
                          quatro pilares conceituais do espaço: ciên- pouco convencionais no sistema de arte”, Mônica
                          cia, filosofia, Yoga e arte. “Nos Vedas, elas   Nador, com sua noção de autoria compartilha-
                          são as bases que sustentam uma comuni- da, Sandra Cinto, Ernesto Neto, Bené Fonteles,
                          dade”, explica Mattos.  No Veras, no entanto,  Rodrigo Bueno, com quem preserva fortes elos.
                          foi feita uma tradução livre de dois desses   No campo das exposições, “o que a gente
                          conceitos:  ciência foi alterada para educação   pretende desenvolver aqui são imersões de
                          e sustentabilidade ficou no lugar de filosofia.  alguns artistas com a comunidade, muito pouco
                            Mattos observa que, no Brasil, essa trans-  familiarizada com o estatuto desse artista que
                          versalidade já ocorre em outros espaços cultu-  não precisa desenvolver objetos”, afirma. Uma
                          rais, como o SeSC. “Eu acredito muito na trans-  referência é a bienal Manifesta, que ocorreu em
                          versalidade como forma de superar o desafio de   Zurique, em 2016, onde artistas foram criar pro-
                          formação de público em nossa região”, conta   jetos na cidade. “Em Florianópolis, nós temos
                          o curador, a partir de sua experiência como   quarenta e poucas praias, duas comunidades
                          diretor do Museu de Arte de Santa Catarina   rurais, um centro urbano minimamente desen-
                          por dois anos, em 2017 e 2018. Ele saiu de lá   volvido, e a questão é como criar mecanismos
                          para uma residência artística no Japão.  de arte contemporânea que façam valer essa
                                                                  topografia singular.  O que nós queremos é
                          Diálogos                                dar voz a artistas que estejam dispostos a criar
                         “Quando decidi dar início ao processo de con- relações e promover diálogos, independente
                          cepção de um centro cultural, então solitário   de se o que for realizado possa ser chamado
                          e silencioso, não podia imaginar quanto o   de arte, porque creio que essa questão hoje
                          contato com a História da Arte me permitiria   não é mais pertinente”, conclui.


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