Page 84 - ARTE!Brasileiros #39
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ARTISTA BÁRBARA WAGNER






             A CONSTRUÇÃO DE


             UM NOVO POPULAR





             BÁRBARA WAGNER CRIA OBRAS A PARTIR DA OBSERVAÇÃO DE CULTOS EVANGÉLICOS,
             DO UNIVERSO DO FUNK E DE OUTROS FENÔMENOS DE MASSA E EXPRESSÕES COLETIVAS


             POR MARIANA TESSITORE




             DE 2005 A 2007, Bárbara Wagner fotografou os banhis -  me atenho ao tema do popular, não no sentido da tra-
             tas de Brasília Teimosa, bairro popular na zona sul do   dição, mas sim a partir da ideia de uma classe que con -
             Recife. Em suas andanças pelo local, conheceu Charles,   some muito e tem compreensão da própria imagem.”
             um segurança que costumava frequentar a praia. O novo   A artista comenta que voltou seu olhar para as con-
             amigo começou a ajudá-la no trabalho, segurando o   quistas sociais do brasileiro e para o poder aquisitivo
             flash enquanto a artista fotografava. Quando as imagens   obtido pelos mais pobres antes da crise observada no
             finalmente foram exibidas em uma galeria, Charles foi o   governo Dilma (2011-2016). “Em 2005, por exemplo, as
             primeiro a ver a exposição. Com semblante sério, o segu-  câmeras digitais não eram tão populares. Já em 2012,
             rança andou pela mostra inteira e pronunciou-se para   havia claramente uma nova classe média estabelecida,
             a artista, já ansiosa: “Bárbara, que molduras bonitas”.  que se manifestava nas selfies, nas redes sociais e nos
             Rindo, ela relembra essa história para ilustrar o caráter   videoclipes”, afirma.
             de troca que caracteriza sua produção: “É engraçado.   Esse novo panorama aparece nas duas obras que a
             Para Charles, a moldura era a verdadeira manifestação   artista apresentou na última Bienal de São Paulo: o
             de arte e não as fotos. Diálogos como esse são essenciais   vídeo Estás Vendo Coisas e a série de fotos Mestres
             para o meu trabalho, é assim que vejo como tudo é rela-  de Cerimônias, ambos de 2016.  A primeira é uma his-
             tivo. Aquilo que muitas vezes consideramos excepcional,   tória de ficção de um cabeleireiro e de uma bombeira
             pode ser tomado como ordinário pelo outro”, diz. O olhar  que sonham em se tornar estrelas da cena musical do
             voltado para o “corpo popular”, como define a artista, é     Recife. O vídeo foi feito com Benjamin de Búrca, artista
             o ponto central de sua obra, que investiga estratégias   parceiro de Bárbara desde 2013, e concorreu ao prêmio
             de visibilidade adotadas pelas classes populares.  de melhor curta-metragem no Festival de Berlim deste
             Formada em Jornalismo pela Universidade Federal de   ano. E a última retrata a indústria dos videoclipes do
             Pernambuco, Bárbara começou a trabalhar como artista   brega, no Recife, e a do funk, em São Paulo.
             nos anos 2000, atuando na fronteira com o documental.   Os dois trabalhos foram concebidos paralelamente, em
             A brasiliense, que já expôs em mostras como a 32ª Bienal   um esforço da artista em entender o que a cerca. “Eu
             de São Paulo e o 33º Panorama de Arte Brasileira, no   tinha uma urgência de documentar o que acontecia nas
             Museu de Arte Moderna de São Paulo, foi selecionada   ruas do Recife. E, para mim, a cultura do brega repre-
             para a nova edição do Festival Sesc_Videobrasil, além   sentava essa visibilidade de uma nova classe, unindo
             de ter uma exposição individual programada para o   consumo, ostentação e a ideia de celebridade.”
             segundo semestre na galeria Fortes D’Aloia & Gabriel.  Nas duas obras citadas acima, a artista mostra como
             Paralelamente à produção na arte contemporânea,   DJs e MCs (mestres de cerimônia, como são chamados
             Bárbara também frequenta bailes funks, os salões de   os rappers) saem dos bailes da periferia e alcançam o
             beleza e igrejas da periferia. “Desde meu primeiro tra-  mainstream, apropriando-se dos símbolos historica-
             balho – que foi a série de fotos Brasília Teimosa – eu   mente pertencentes às classes dominantes. “Os códigos


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