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HISTÓRIA DAS EXPOSIÇÕES INSITE’ 97
UMA EXPOSIÇÃO QUE
CRUZOU FRONTEIRAS
EXIBIDA HÁ 20 ANOS, MOSTRA DEDICOU-SE A PERFORMANCES
POLÍTICAS E TRABALHOS DE SITE SPECIFIC,
CRIADOS NA FRONTEIRA DOS EUA COM O MÉXICO
POR JUAN JOSÉ SANTOS
“ACHO QUE POSSO FALAR em nome de todos os
artistas quando digo que este é um alvo extrema -
mente importante. Especialmente agora, quando
aqui e por toda a América todos os aspectos da
esfera pública estão sob ataque, quando o setor
público está sendo enxugado, os serviços públicos
privatizados, os espaços públicos fechados, os dis-
cursos públicos controlados e os bens públicos de
todos os tipos trocados pela moeda dos interesses
privados, sejam eles prestígio, privilégio, poder ou
lucro. (...) Mas, no nosso zelo por sucesso global,
devemos também estar dispostos a descobrir e
apreciar a singularidade de cada mercado. É aí que
temos sido capazes de reproduzir a diversidade da
nossa força de trabalho, pessoas que entendem
outras culturas e que falam outras línguas.” os artistas residiram na região durante meses e propuseram
Este discurso não é atual. Foi realizado pela artista oficinas pensadas para interagir com a comunidade local. Em
Andrea Fraser, há 20 anos, por ocasião da expo- alguns casos, em localidades periféricas e marginais e propondo
sição InSite. A ironia e o sarcasmo dessa perfor- oficinas criativas, como a de teatro de rua, a Oficina de Arte
mance marcaram ademais uma linha ética envol- Fronteiriça, as ações do grupo Revolucionarte ou a documen-
vente nesse evento, que regularmente tem lugar tação de movimentos políticos em comunidades de imigrantes.
na fronteira entre o México e os Estados Unidos e Se fosse preciso ressaltar uma obra emblemática, seria Toy
que, na edição de 1997, enfatizou o espaço público an Horse, de Marcos Ramírez Erre, um enorme cavalo de Troia
e o trabalho com a comunidade local. de madeira situado no ponto fronteiriço de maior tráfego na
Os curadores da InSite’ 97 foram Jessica Bradley, região. Um jogo bicéfalo que satirizava a ideia da invasão oculta,
Olivier Debroise, Ivo Mesquita e Sally Yard. Em várias do ataque ao império, de forma metafórica e dual. Ramírez
sedes próximas à fronteira, espalhadas entre Tijuana quis provocar uma leitura política a partir de uma motivação
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e San Diego, os artistas convocados realizaram tra pessoal: ele, que tem dupla nacionalidade, queria homenagear
balhos site specific, cuja carga simbólica e política seu pai, que lhe contava as histórias da Ilíada, de Homero.
permitiram iniciar uma reflexão acerca do muro, Trinta e oito artistas da América do Norte e da América Latina
da imigração – ligado ao incremento da população mostraram seus trabalhos em diversas sedes, algumas em
de Tijuana como consequência do crescimento lugares tão estranhos como o porão de um museu infantil ou
industrial – e do pós-colonialismo. Quase todos de uma casa particular. Houve tempo e espaço para propostas
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