Page 48 - ARTE!Brasileiros #39
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INTERNACIONAL PORTUGAL
mostras do MAAT, realçando a preocupação de interligar
arquitetura, arte e tecnologia não só no conceito, mas
também na prática expositiva. “Eu vinha de anos de
trabalho na curadoria do MoMA, que é o museu típico
da organização moderna da arte, dividida em várias
mídias. E lá já se falava dessa compartimentação e da
necessidade de romper com ela, mas isso era muito
difícil em um museu que havia sido criado sobre essa
base”, conta Gadanho. “Aqui se torna mais fácil fazer
esse tipo de ligação, porque é um museu que não tem
passado e não vive dessa formatação do mundo da arte.
Tínhamos uma grande liberdade e um grande interesse
em usá-la, não para misturar coisas de forma aleatória,
mas para ter os artistas olhando mais para outras áreas
e também colocar artista e arquiteto no mesmo nível
intelectual, ou seja, ambos como produtores culturais
com capacidade para falar sobre o que está acontecendo.
Isso permite diluir as fronteiras e não criar guetos.”
UMA BIENAL HÍBRIDA
Romper fronteiras e misturar áreas do conhecimento é
também o objetivo da BoCA, bienal que levou a variados
espaços de Lisboa e do Porto exposições, instalações,
performances, shows, festas, teatro e dança – e, por
vezes, obras híbridas entre todas elas. Para o diretor,
mais do que de uma vontade inovadora, a concepção do
projeto partiu da percepção de que a arte contemporâ- EDIFÍCIO DA CORDOARIA NACIONAL, QUE RECEBE
nea já é, em si mesma, diversa e múltipla. “Os artistas já ESTE ANO A SEGUNDA EDIÇÃO DA ARCO LISBOA
trabalham assim, operam de modo cada vez mais plural
nos formatos, mídias e territórios que utilizam”, afirma
Romão. “E o público está cada vez mais permeável a
essas novas experiências estéticas.” Nesse ponto, Romão reafirma uma busca por democrati-
Na programação, portanto, a BoCA abriu espaço para zar o acesso à arte contemporânea, tirando o “couro de
uma performance de João Pedro Vale e Nuno Alexan- incompreensão” que, por vezes, a cobre. Aproveitando o
dre Ferreira inspirada em palhaços de circo, uma ins- momento efervescente da vida urbana portuguesa, com
talação de Rodrigo Garcia criada especialmente para as ruas cheias de gente na capital e no Porto, o diretor
uma sala do Museu de Arte Antiga, um campeonato de considera que a propagação das atividades da BoCA
fingerboard (mais conhecido como skate de dedo) rea- por diferentes espaços ajuda também a aproximar os
lizado em obstáculos projetados por jovens designers “espectadores acidentais” – aqueles que, sem procurar,
portugueses, uma exposição realizada no palco de um se deparam com as obras e acabam por vivenciá-las.
teatro e uma grande festa com música eletrônica e per- “Enquanto as políticas globais de hoje tendem para
formances. “Interessava estabelecer relações entre ins- uma ideia de fechamento e de intolerância, com uma
tituições culturais diferentes e entre territórios artísticos ascensão da direita e com direitos e liberdades sendo
diversos, trabalhando de modo horizontal, transversal, ameaçados, a arte pode contrabalançar com a abertura,
não dando primazia a uma arte ou outra. Consideramos, com o diálogo, com ar fresco. Nesse sentido, os espaços
por exemplo, que uma festa é tão importante quanto para a arte são como bombas de oxigênio. Não são
uma conferência ou uma exposição de artes plásticas espaços de julgamento, não nos obrigam a tomar partido
e que em qualquer experiência dessas o público pode e a dar respostas exatas, mas são abertos à reflexão e
sair de algum modo transformado.” à sensibilidade. São necessários, urgentes, sagrados.”
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