"Atlântico" (2016), Arjan Martins. Foto: A Gentil Carioca.
"Atlântico" (2016), Arjan Martins. Foto: A Gentil Carioca.

Entre biografias de grandes nomes modernistas e teorias que questionam os olhares hegemônicos sobre a cultura, passando por dramaturgias, livros de fotografia, indagações sobre os fazeres contemporâneos e coletâneas de entrevistas, muitas publicações que envolvem o mundo das artes foram publicadas (e reeditadas) em 2021. A arte!brasileiros preparou uma lista com 12 livros lançados recentemente que nos provocam a repensar a arte no Brasil e no mundo. 

Arte contemporânea: modos de usar, de Paula Braga

Entre capítulos teóricos e crônicas, Paula Braga nos guia pelo universo da arte contemporânea. Ao analisar trabalhos de criadores consagrados como Hélio Oiticica, Cildo Meireles e Beatriz Milhazes, além de nomes menos conhecidos do grande público, a professora de Filosofia da UFABC se propõe a discutir as formas pelas quais a arte afeta e é afetada pela realidade. Cada capítulo tem dois momentos: primeiro uma crônica, na qual Paula Braga flerta com a autoficção; depois, e em diálogo com o texto que o antecede, um ensaio crítico, mais acadêmico – que em nada corresponde aos estereótipos sisudos da academia. “A combinação de estilos segura a mão da gente em um rolê aleatório pelo labirinto da arte contemporânea, sem fio condutor. A proposta é se deixar levar por uma autora que enxerga a arte como caminho para a investigação existencial, a produção de pensamento e a formação de subjetividades desviantes da norma, sem deixar de pontuar as mazelas do neoliberalismo e a desintegração do tecido social brasileiro nestes tempos distópicos”, como sugere o release. 

Arte e ativismo: antologia

Publicado pelo MASP, o livro reúne 84 textos sobre as relações entre prática artística e ativista nos campos político, social, institucional, ambiental, de gênero e de raça através dos tempos em todo o mundo. Entre manifestos, ensaios teóricos, declarações públicas de artistas e coletivos, encontramos palavras de Augusto Boal, Decolonize This Place, León Ferrari, Cildo Meireles, Guerrilla Art Action Group, Internacional Situacionista, entre tantos outros autores e grupos. Os textos abordam questões como os compromissos políticos das vanguardas modernistas e suas rejeições em favor do protesto, da crítica, do experimento social utópico ou da propaganda revolucionária. O volume é organizado cronologicamente, começando com escritos do final do século 19, como os do pintor francês Gustave Courbet, até as práticas de coletivos de ativismo artístico nos séculos 20 e 21. A Antologia é o resultado de uma parceria entre o MASP e o Afterall, centro de pesquisa da University of the Arts, Londres. 

Performances do tempo espiralar: poéticas do corpo-tela, de Leda Maria Martins

A ensaísta, poeta, dramaturga e professora Leda Maria Martins explora as inter-relações entre corpo, tempo, performance, memória e produção de saberes. Dialogando com pensadores como Alfredo Bosi e João Guimarães Rosa, a autora desconstrói a dicotomia entre oralidade e escrita enfatizada pelo Ocidente e, “assim, descoloniza o pensamento Ocidental e requalifica a África como continente pensante. A palavra também se inscreve no corpo, na memória, no tempo”, sugere a descrição do livro. Em um conjunto de ensaios, a autora consolida o conceito de tempo espiralar, que surge pela observação de práticas comunitárias e no fundamento de vários grupos étnicos africanos. No livro, a autora propõe que a experiência e a compreensão filosófica do tempo podem ser expressas por uma inscrição não necessariamente discursiva, mas não por isso menos significativa e eficaz: a linguagem constituída pelo corpo em performance, das liturgias do Reinado às artes cênicas.

Arte Contemporânea Brasileira: agentes, redes, ativações, rupturas

Publicada em dois livros, a coletânea da editora Circuito se debruça sobre a arte produzida no Brasil, reunindo ensaios de artistas, pesquisadores, críticos e curadores de arte contemporâneos. No primeiro volume foca no período de 1970 a 1999, reunindo 39 textos de importantes nomes como Guy Brett, Lisette Lagnado e Tunga (entre tantos outros). No segundo volume, encontramos as palavras de profissionais do mundo das artes como Aracy Amaral, Ayrson Heráclito, Cauê Alves, Tiago Sant’Ana e Tadeu Chiarelli, que buscam traçar um amplo panorama das duas primeiras décadas do século 21, abordando o ativismo nas artes, o papel da crítica e da curadoria no circuito artístico, as artes dos diferentes Brasis e sua relação com os projetos políticos em questão. 

O que vem depois da farsa?, de Hal Foster

“Como o mundo da arte participa dos dilemas de sua época? O que a política da pós-verdade e da pós-vergonha implica para artistas e críticos?” Essas são algumas das perguntas que guiam o novo livro de Hal Foster, no qual o autor traz uma análise do contexto social, político e cultural da atualidade, implicando artistas, curadores, museus e instituições e críticos. Os ensaios reunidos na publicação discorrem sobre mudanças na arte, na crítica e na ficção diante do “atual regime de terror e vigilância, desigualdade extrema, desastre climático e disrupção midiática”, conforme sugere a descrição do livro (Leia o texto de Fabio Cypriano sobre O que vem depois da farsa?).

Entrevistas brasileiras vol. 2, de Hans Ulrich Obrist

Reunindo 30 entrevistas do curador suíço Hans Ulrich Obrist com artistas, antropólogos, músicos, cineastas e outros pensadores brasileiros, a publicação busca formar um painel múltiplo do que é pensado e realizado hoje no país. O livro traz conversas que tratam desde questões intrínsecas à construção de um léxico artístico, como o processo de criação e o papel da arte da sociedade, a debates acerca de assuntos prementes, como a luta contra o racismo, a formação de um circuito decolonial de arte, a conquista de uma subjetividade. A publicação dá continuidade ao Hans Ulrich Obrist – Entrevistas brasileiras vol. 1, publicado em 2019, no qual o curador debatia ideias com mestres e pioneiros do século XX. 

Ubu Rei, de Alfred Jarry

A peça francesa, encenada pela primeira vez em 1888, ganha edição comemorativa. Com projeto gráfico de Elaine Ramos, o livro conta com lâminas interpostas no miolo com manuscritos e reproduções de artistas das vanguardas – como Dora Maar, Miró, Lina Bo Bardi, Max Ernst, Picasso e Raymond Savignac. A obra traz a história de Pai Ubu, que encarnou a alegoria do político grotesco, estúpido, intratável, que se torna rei trapaceando e governa na base de atrocidades contra o povo e os aliados. A dramaturgia é acompanhada de textos de Firmin Gémier (ator da primeira encenação da peça), Guillaume Apollinaire, Michel Foucault, Otto Maria Carpeaux, além de escritos do próprio Jarry.

Arjan Martins

Em edição bilíngue, o livro apresenta um extenso panorama da trajetória do pintor carioca, compilando um ensaio escrito pelo curador Paulo Miyada, outro pelo crítico e historiador de arte Michael Asbury, uma entrevista feita com Arjan Martins pela historiadora Raquel Barreto e imagens de 100 obras do repertório do artista. Arjan Martins dialoga com a tradição moderna da pintura ocidental, incorporando um repertório visual e uma narrativa afro-brasileiros. As imagens de imigrantes e descendentes africanos são parte fundamental do repertório do artista, mostrando-os em ações cotidianas, e as quais trazem questões eminentes a serem discutidas: herança colonial, identidade étnica, negritude, segregação, invisibilidade. Seus trabalhos percorrem também cartografias, que chegam como elementos significativos do período histórico das navegações. 

As metamorfoses: Madalena Schwartz 

Acompanhando a exposição individual de Madalena Schwartz, ocorrida no primeiro semestre de 2021 no Instituto Moreira Salles de São Paulo, foi lançado o catálogo As metamorfoses. A publicação testemunha a importante produção da fotógrafa, que retratou – em plena ditadura militar – o universo de travestis e transformistas. “Madalena Schwartz interessou-se em pé de igualdade pelas pessoas que fotografou, das figuras já célebres às estrelas quase anônimas, de brilho breve e intenso, que orbitavam pelo centro de São Paulo”, aponta o release. Completa este volume um panorama da produção latino-americana sobre o mesmo tema durante aqueles mesmos anos de chumbo em todo o continente, com obras de Paz Errázuriz, Estúdio Luisita, Leandro Katz, Hélio Oiticica, Sergio Zevallos, Vasco Szinetar, Adolfo Patiño, Armando Cristeto e imagens do Arquivo Quiwa e do Arquivo da Memória Trans Argentina.

Ruy Ohtake, arquiteto

Falecido em novembro de 2021, Ruy Ohtake foi um dos nomes mais influentes da arquitetura brasileira contemporânea. Autor de centenas de projetos, ele foi ganhador de 25 prêmios, conquistou o Colar de Ouro do Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB (2007), recebeu os títulos de Professor Emérito da Faculdade de Arquitetura de Santos e de Professor Honoris Causa da Universidade Braz Cubas. “Sua produção tem sido registrada em revistas e livros, mas até o presente momento não havia sido feita uma publicação contendo balanço crítico isento e aprofundado, que permita a inserção de sua obra em merecido lugar da história da arquitetura brasileira. A finalidade maior deste projeto cultural é cumprir esse objetivo”, escrevem Abilio Guerra e Silvana Romano Santos, organizadores da publicação. 

Conversas com Cézanne, de Michael Doran

Pesquisador do Courtauld Institute, de Londres, Michael Doran busca traçar um retrato vivo de Paul Cézanne, reunindo e comparando os principais testemunhos daqueles que conviveram com o pintor entre 1894 e 1906 – e registraram tanto o conteúdo de suas conversas e a originalidade das concepções do artista, bem como seu cotidiano, seus hábitos e idiossincrasias, “seus procedimentos diante do motivo pictórico e até a ordenação das cores em sua paleta”. Por meio de cartas, artigos de jornal, relatos de conversas e ensaios críticos e biográficos, “o Cézanne que emerge destas conversas e testemunhos”, escreve Paulo Pasta no posfácio. 

Guignard: Anjo Mutilado, de Marcelo Bortoloti

O livro retoma a obra e vida de Alberto da Veiga Guignard, pintor cujas obras – em especial suas paisagens de Minas, as reais e as imaginárias – foram marcantes no modernismo brasileiro. O “anjo mutilado” – como o chamou o poeta Manuel Bandeira –, recebeu essa alcunha por sofrer de caso severo de lábio leporino. A partir de uma pesquisa extensa, Marcelo Bortoloti faz não apenas uma reconstrução da biografia do pintor, mas também um retrato histórico da Europa entreguerras e do Brasil modernista.


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1 comentário

  1. Peço informar editora e organizador dos dois volumes de “Arte Contemporânea Brasileira”. O título é genérico demais pra dar certo uma pesquisa no Google. Obrigada

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