Prêmio Montblanc de la Culture Arts Patronage
Mônica Nador, homenageada pelo Prêmio Montblanc de la Culture Arts Patronage Foto: Coil Lopes


Desde 2016, os curadores Sam Bardaouil e Till Fellrath foram colocados à frente da Fundação Cultural Montblanc com o objetivo de pesquisar e criar estratégias  junto à Fundação. Viajaram e nomearam curadores de várias partes
do mundo para auxiliá-los nessa tarefa. Formaram, assim, um conselho.

No Brasil, o curador responsável é Jochen Volz, diretor da Pinacoteca do Estado de São Paulo. A rede de curadores é denominada por eles como Curatorium e busca aumentar a escala de alcance da instituição.

Prêmio Montblanc de la Culture Arts Patronage chega à 3ª edição no Brasil
SAM BARDAOUIL, JOCHEN VOLZ E TILL FELLRATH DURANTE A CERIMÔNIA DE PREMIAÇÃO EM 2017 NA PINACOTECA DE SÃO PAULO

Em 6 de setembro, a Fundação Cultural Montblanc agraciará pela terceira vez, com o Prêmio Montblanc de la Culture Arts Patronage, um agente da arte no Brasil, pelo seu trabalho como patrono junto à sociedade. O Prêmio ocorre em 17 países em edições especiais. Os curadores acreditam que a arte brasileira tem um enorme potencial, daí a importância de terem escolhido um curador pelo Brasil para o Conselho.

Além de oferecer um prêmio a patronos, a Montblanc se dedica a investigar o surgimento de jovens artistas que estejam fazendo um trabalho interessante em seus países de atuação. Os selecionados são contemplados com uma bolsa de comissionamento para a produção de um projeto que, mais à frente, é incorporado a grandes eventos de arte ao redor do mundo, como Bienais.

Em 2016 e 2017, o Prêmio Montblanc de la Culture Arts Patronage homenageou, respectivamente, a dupla de cineastas Luiz Bolognesi e Laís Bodanzky, pelo projeto Cine Mambembe, e Solange Farkas, pela Associação Cultural Videobrasil.

JAMAC

Neste ano, a 27a edição global e 3a no Brasil irá conceder o prêmio para o JAMAC, Jardim Miriam Arte Clube. Este projeto começa quando a artista Mônica Nador decide, em 2003, que precisava sair do conforto de Higienópolis e desbravar os espaços periféricos da cidade de São Paulo. Levou consigo uma enorme vontade de fazer a diferença na vida de pessoas que não tinham acesso ao universo artístico do qual fazia parte. Foi assim que, naquele mesmo ano, juntou e organizou suas ideias para abrir um espaço na parte marginalizada da Zona Sul de São Paulo. Espaço esse no qual conseguisse compartilhar com aquela comunidade o que ela e outros colegas artistas aprenderam ao longo de sua formação. A decisão de se mudar para o Jardim Miriam veio de um questionamento que Nador, ou Conca – como foi apelidada por suas irmãs e é carinhosamente chamada pelos mais próximos –, tinha desde os anos de faculdade. Ela conta que, quando esteve no curso de Artes Visuais entre 1978 e 1982, a formação excluía as questões sociais. A inquietação em torno disso e de outros fatores em sua vida fez com que ela se ligasse à problemática da pobreza: “Também me interesso por outras questões sociais, mas para mim o grande entrave é a distribuição de renda”, comenta.

Mas o JAMAC não seria possível, ela aponta, se a comunidade não tivesse abraçado a iniciativa e se engajado em seu desenvolvimento. A primeira pessoa que procurou ao chegar no bairro, por indicação de um amigo, foi o professor de geografia Mauro de Castro. “Eu tinha uma preocupação muito grande que era de perguntar se interessava para as pessoas que eu levasse um equipamento do tipo que eu estava propondo”, explica. Mônica não queria se impor, queria se integrar ao local onde escolheu viver e trabalhar: “Eu sempre quis construir as práticas a partir das necessidades locais e junto com as pessoas.” Mauro integra desde aquela época um grupo ligado a movimentos sociais chamado Núcleo Aparecida Gerônimo e representa uma espécie de liderança comunitária no Jardim Miriam. Nos preparativos para a implementação do projeto, Mônica se deslocava todo domingo para o bairro, se reunindo com Mauro e o coletivo para discutir e construir a ideia. Assim, aquele projeto tão pensado ia saindo do mundo das ideias.

Trabalho do coletivo Contrafilé. Segundo Mônica, a ação só foi possível por causa dos programa Pontos de Cultura, do governo Lula.

Em 2006, quando o JAMAC foi convidado para participar da Bienal de São Paulo, com curadoria de Lisette Lagnado, Mônica conheceu outra pessoa que viria a ser uma grande parceira em manter aparelho. Sob o tema Como viver junto, aquela edição trazia um grande trabalho com as periferias, recrutando também educadores que tinham alguma ligação com arte e cultura nas regiões marginalizadas da cidade. Foi então que Mônica conheceu Thais Scabio. Na época, a hoje cineasta ainda era estudante: “O trabalho deles era exercitar algumas experiências de sensibilização das pessoas da comunidade”, explica a artista.

Apesar de engajada nos saberes da arte e cultura, mesmo morando no bairro, Thais ainda não conhecia o JAMAC. O encontro mútuo gerou, desde aquele ano, muitos bons frutos e novos projetos. Thais começou montando um cineclube para exibir aos frequentadores do espaço alguns grandes filmes aos quais nunca tinham se atentado. Um tempo depois, já tinha uma proposta didática para formação audiovisual.

Foi aí que o JAMAC começou a oferecer, além do grafite, da estampa e outras propostas das artes visuais, um mergulho no mundo do cinema. De lá pra cá, muitos jovens se formaram. Brinca Mônica que muitos fugiam da oficina de estamparia para a oficina de cinema, e vice-versa, mas nunca houve ciúme por isso.

Nesses 15 anos de atuação do clube de arte na região, Nador diz que o que mais a marcou são as experiências humanas que adquiriu nos anos que se passaram: “A gente fica enorme. A diversidade é muito rica. A situação é muito rica. Eu aprendi demais com as pessoas daqui”. Ela conta que houve uma grande modificação na forma em que ela via o bairro nos anos que ali está: “Nós, em nossa bolha da classe média, somos um bando de ignorantes”, afirma. “As pessoas na periferia são muito informadas, muito articuladas. É diferente do que a gente pensava, principalmente nos anos 80 e 90. Tanto que eu vim pra cá em 2003, com a ilusão de que viria trazer a informação e a cultura”, completa.

Se antes a artista tinha um olhar um tanto colonizador para o Jardim Miriam, hoje ela consegue enxergar que o espaço também a formou: “Apesar da minha compaixão, eu ainda sim era muito branca”. Seu deslocamento de um dos bairros mais elitistas da capital para um dos bairros mais afastados fez com que ela enxergasse muito do
que era maquiado no lugar de onde veio: “Quando vim parar aqui, pensei: não é que em São Paulo tem preto mesmo? E não é que não tenha no centro, é que eles são  invisibilizados”.

Hoje, o maior sonho de quem gere o JAMAC, é ter um espaço fixo no qual possa ter a segurança que irá ficar: “Queremos comprar uma sede”, diz Conca. O que mais preocupa é saber se irão dar conta de conseguir um prédio para abrigarem todas as atividades que oferecem, tendo em vista que o atual é alugado, mas está sendo reivindicado pelo proprietário. “Não dá pra nós sonharmos muito, mas o que eu quero é que todo mundo tenha um JAMAC na esquina de sua casa”, admite. Para finalizar, ela cita José Martí: “Um povo sem a cultura nunca será um povo livre”. É por isso que acredita que a cultura
é tão diminuída, para que os poderosos neguem a liberdade às pessoas.


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