Page 104 - ARTE!Brasileiros #57
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LIVROS JACQUES RANCIÈRE
RANCIÈRE REVÊ
MODERNISMO Autor usa como
referências apenas
textos de homens
brancos da Europa
e Estados Unidos
se existe um loCal onDe inClusão, decoloniania-
lismo e debate antirracista são muito presentes é na por fabio CYpriano
cena da arte contemporânea. Por isso, não deixa de
ser estranho que o novo livro de Jacques Rancière,
Tempos modernos – arte, tempo, política, se dedique
a uma espécie de revisão do modernismo apenas com
referências de autores homens, brancos e europeus ou novo tecido sensível em que as atividades prosaicas
estadunidenses. recebam o valor poético que faz delas os elementos
Afinal, seu livro A partilha do sensível – estética e de um mundo comum”.
política, publicado no Brasil, em 2005, é uma referência Esse “tecido sensível” é visto também como um
importante sobre a compreensão de que uma obra de “regime da experiência” e torna-se parte do foco des-
arte deve ser vista sempre dentro do “tecido da expe- ta pesquisa: apontar que a noção de tempo linear da
riência”, como o próprio Rancière conceitua, portanto modernidade deve ser repensada, pois “o tempo não é
dentro de um contexto. simplesmente a linha que se estica entre um passado e
É verdade que a publicação que sai, agora em 2021, um futuro. Ele é também, e antes de mais nada, um meio
pela editora N-1, reúne quatro textos já um tanto datados, em que se vive”. Dos quatro textos da publicação, com
a maioria de 2015. Sim, seis anos no atual momento, uma um tanto óbvia homenagem ao filme de Charles
pós #metoo e #blacklivesmatter, é um período sufi- Chaplin, Tempos Modernos, dois deles são dedicados
cientemente largo, porque alterou paradigmas culturais a linguagens específicas da arte: a dança e o cinema.
e acadêmicos, que não toleram mais certas práticas Sobre a dança ele aponta o caráter libertário e livre,
ultrapassadas. especialmente dos anos 1920 e
No Brasil, essa questão 1930, abordando coreógrafas e
torna-se ainda mais perti- bailarinas de um amplo espectro:
nente pois já tiveram início da expressionista alemã Mary
as reflexões em torno dos Wigman (1886-1973), precursora
100 anos da Semana de Arte da dança-teatro, à norte-ameri-
Moderna de 1922, e muitos cana Lucinda Childs.
seminários e eventos busca- Já no ensaio sobre cinema, Ran-
ram rever a efeméride a partir cière trata de cenas específicas de
de óticas mais inclusivas e de três filmes: Um homem com uma
autoras e autores com distin- câmera (1929), de Dziga Vertov, As
tas representatividades. vinhas da ira (1940), de John Ford,
e Juventude em Marcha (2006), do
regime Da experiÊnCia português Pedro Costa. Ao menos
Apesar de tudo isso, o mar- aí, Costa representa uma certa
xista Rancière segue bus- marginalidade no pensamento tão
cando criar conceitos que eurocêntrico do autor.
possam olhar para formas
de emancipação, como ao
problematizar a noção de Tempos modernos – arte, tempo, FOTO: REPRODUÇÃO
moderno como “construir política, Jacques Rancière. N-1
um novo senso comum, um edições, 2021 (160 p.)
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